Infância

Ela passava naquela rua todos os dias. E eu estava sempre por lá. No primeiro dia eu estava lá a mando de meu pai. Tinha ido buscar uma caixa de tâmaras como pagamento por um serviço. E então ela passou, passou por mim sem nem me perceber. Mas eu a notei, a segui com os olhos, e notei as curvas que seu vestido fazia ao vento. Ela carregava uma cesta enorme no topo da cabeça e tinha apenas um braço levantado, apoiando a cesta.

No dia seguinte dei um jeito de escapar de meu pai e fui para a mesma rua para esperá-la. Era uma questão de acaso mas ela passou novamente pela mesma rua. E desta vez ela me olhou pelo canto dos olhos, para não derrubar a cesta enorme, e mostrou um leve sorriso de reconhecimento. Isso foi o suficiente para me instigar. Fui imediatamente falar com ela. Nunca fui tímido, então corri até ela e disse:

- Olá, meu nome...

Ela se assustou e deixou a cesta cair no chão, espalhando todos os pães que trazia no chão.

Ela olhou para os pães com desânimo e depois me olhou com um sorriso estranho, como se escondesse algo atrás dele.

- Que quer?

- Escute, eu te ajudo com os pães se você for comigo tomar um copo de leite. Eu tenho uma moeda.

- Uma moeda não dá para dois copos de leite.

- Nós damos um jeito – eu disse arrematando com o meu melhor sorriso.

- Caia fora, já tenho noivo – disse ela como se zombasse de mim. Depois recolheu os pães e se mandou em seu passo lento.

Que noivo que nada. Eu também não me importo. Vou agora jogar com meu irmão e dessa vez não vou deixá-lo ganhar. Hoje eu vou massacrá-lo, depois quem sabe consigo fazer ele comer terra.