A Carta

A carta em suas mãos pesava como nenhuma outra no mundo seria capaz. Não era o peso físico em si, mas o peso da culpa entranhada, carregada, atravessada naquele pedaço de papel. Quantas desgraças, horrores e maquinações estariam trancafiadas ali? Ele conhecia o remetente, ou melhor, a rementente. Foram anos bons, anos felizes aqueles em que viveram lado a lado, antes que o mundo mudasse, eles mudassem e cada um seguisse seu rumo de maneira hostil. Agora, tantos anos depois lá estava aquela carta, a maldita carta.

Ele não iria abri-la. Era isso! Para o inferno com aquela carta! Ele não precisava dela! Sem pensar duas vezes ele a arremessou em meio a uma pilha de coisas velhas para apodrecer, sumir, ser esquecida.

O tempo passava. Dias, meses e anos, ainda assim a carta se recusava a sumir de seu pensamento. A todo momento de angústia ou medo ele se lembrava daquela carta, ao qual ele era incapaz de abrir. As areias corriam, corriam corriam...

Velho, descreditado pelos médicos, sabendo que sua morte não tardaria, ele resolvera tirar aquele peso das suas costas e abrir a carta. Não era difícil encontrá-la, nem mesmo para abri-la, porém assim que ele o fez seu coração por pouco não parou de bater. As lágrimas caíam de seus olhos e seu peito inflamava, enquanto por dentro seu superego xingava ego por tão idiota escolha. A carta, a maldita carta, continha apenas uma folha simples, onde era possível se ler ainda: Volte, eu te amo.