O jardim e a lua: únicas testemunhas

Quando na minha juventude, conheci uma mulher daquelas que se diz ser pra casar. O fato que faz toda a diferença, no entanto, era que ela já possuía matrimônio. E o fato que faz pesar ainda mais este fato, é que o marido de Joana era o André, meu melhor amigo desde a infância. Tudo, ou quase tudo, fazíamos juntos. De trabalhos escolares às mais terríveis peripécias.

Quando conheceu Joana, André estava em viagem a trabalho, por isso minha ausência neste momento. Lá mesmo André se fez casar, pois devia voltar à nossa cidade e não poderia ter consigo Joana, não fosse por contração de matrimônio. A conheci na festa de debutante da irmã do André. Ela estava ajudando na ornamentação... Joana se confundia com as próprias flores que arrumava nos arranjos. Linda como jamais se viu. Seus cabelos alcançavam as partes de seu rebolar natural. Com olhos amendoados e cilios negros de um rímel que marcava, ainda mais, o seu olhar e uma pele alva, porém rosada pelo sol sempre presente em nossa cidade, Joana encantava a todos. Minha vontade era, como a da maioria dos homens e meninos presentes, a de raptá-la e fazê-la minha.

Mas há, ainda, um outro fato que se faz pesar, eu não estava só. Acompanhava-me Maria, minha recente namorada. Maria era mulher recatada, não se dava a muitas intimidades. Amava-me, ou ao menos dizia amar-me. De boa e brava família, duramente fazia-me penar até que o casamento fosse oficializado. Eu em minha voraz fome juvenil, não resistia olhar e buscar quem pudesse aliviar minha tensão.

André apresentou-me Joana, e com um sorriso de canto boca, daqueles que dizem mais do qualquer palavra poderia expressar naquele momento, Joana deu-me seu rosto a beijar. Não fiz-me de rogado, beijei-a com o respeito que a esposa de um melhor amigo exige. Mas meu olhar a caminho do beijo não pode deixar de estar cheio de desejo e más intenções. Iniciamos uma conversa, indaguei sobre sua vida antes do casamento, como era em sua cidade natal... gentilmente respondido por Joana, aproveitando-me da ausência de meu amigo que fora buscar bebida, elogiei tamanha beleza. Quão surpreso fiquei ao receber de volto o elogio, tendo Joana complementado que eu parecia com um ex-noivo seu, a quem ela muito amara.

Joana tinha uma flor no cabelo. Não sei o nome. Nunca fui bom nesses detalhes e até hoje prefiro não saber. Comentei com Joana que em minha casa, que ficava vizinha a casa do André, havia um jardim cheio daquelas flores que lhe enfeitavam a cabeça e outras também. Disse ela ser apaixonada por flores, e pediu-me que a levasse para conhecer meu jardim. Disse eu que a levaria no momento mais oportuno, uma vez que estávamos numa festa e que André e Maria estavam por ali ao redor. Joana insistiu em que a levasse no instante, de maneira que não pude negar-lhe este desejo.

Saímos como que fugidos, sem satisfação dar a quem quer que seja. Nem sei se notaram. Quando deparou-se com meu jardim, Joana pareceu estar enfeitiçada pelo perfume das flores. Sentou-se em meio a elas, e abrindo suas voluptuosas pernas, convidou-me a deliciar-me em seus prazeres. Não tive tempo de fazer-me de desentendido; estava ali o que eu desejara desde o momento em que fitei meus olhos em Joana. Sem pesar as conseqüências que poderiam advir daquela insanidade momentânea, preferi dar ouvidos aos hormônios e mergulhar entre ela e o jardim.

Com seios tenros e um sabor carnal nunca antes experimentado por mim, Joana me apresentou movimentos até então desconhecidos. Posições que só tive ciência através de revistas. Vi naquele momento não ser grande a minha experiência, e a dela...sem comentários a altura.

Joana apresentou-me o novo. Acrescentou sabores a algo que já gostava, e muito. Seus beijos, tão carnais, alcançavam a alma. Ali ficamos não sei por quanto tempo: eu, ela, a lua e as flores. Desta noite, somente as flores poderiam reclamar alguma coisa, pois ficaram despetaladas. Mas ainda assim, duvido que fariam isso se pudessem, pois até mesmo elas devem ter sentido o prazer que emanava de nossos poros.

Ao sairmos dali, Joana parecia jamais ter sido aquela mulher que possui em meu jardim. Novamente recatada e pudica, fazia bem o papel de mulher exemplar. Voltamos à festa. Voltamos à vida.

Faz quinze anos desde aquela noite. Estou há treze, casado com Maria. Nunca mais notei qualquer insinuação por parte de Joana. Nem eu jamais ousei revirar o defunto. Vivemos como se jamais tivesse existido aquela fuga. Seja nossa sorte ou azar, importa saber que as flores e a lua não falam.

Marcos Sodré
Enviado por Marcos Sodré em 20/04/2009
Reeditado em 08/09/2011
Código do texto: T1549464
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