Os novos sofrimentos do jovem Werther

I - Intro

A época não poderia ser mais recente do que esta em que é escrito. Filho único de um casal de literatos, Werther recebeu este nome em homenagem ao outro homônimo, criado pelo alemão Goethe. O pai do atual Werther adora a obra, então resolveu homenagear o filho dando-lhe tal nome.

II - Homenagem ou sina?

Fato é que esse novo Werther, por ironia ou não do destino, haveria de ter uma característica ou outra do original. Embora nunca antes tenha entrado em contato com a obra que o batizou, o nosso Werther do futuro sofria tal qual seu xará. Bom, até aí, que garoto de 17 anos não tem problemas com garotas? Tá certo, um ou outro se dá bem no assunto. Mas muitos outros não. Outros ainda são piores no assunto quanto esses que se dão mal. É o caso que aqui se apresenta.

III - Os fatos

O que acontece é que Werther está no terceiro colegial. A época por si só já é uma catástrofe, passar de ano, passar no vestibular, mais ainda, qual curso escolher e em qual instituição prestar. Talvez o leitor já tenha passado por isso, caso contrário, saiba que a situação é complicada. E como se ainda não fosse suficiente, nosso anti-herói, como já foi dito, tem um grande problema com garotas. Principalmente com as mais bonitas, ele teme esse tipo, se assusta, mas o mais engraçado é que é justamente nesse terreno que ele vai se aventurar... mentalmente, porque não tem coragem nem de trocar um "oi" com qualquer uma delas. Sonha que está sempre a passear com elas, de mãos dadas, por um campo onde o verde da grama contrasta com o vermelho, amarelo e branco das flores que ali estão plantadas. Depois dessa caminhada, eles assistem juntos ao pôr do sol detrás do mar que ambos contemplam, ouvindo o barulho do mar e vendo o vai e vem das ondas. E tudo terminaria, obviamente, com um beijo do casal, com o sol se pondo e as gaivotas voando de forma rasante dobre o mar. A cena era hipnotizadora/hipnotizante para Werther, e poderia durar pra sempre. Se é possível haver um campo de flores perto do mar, ele não sabe; mas também, talvez a graça esteja justamente em imaginar o impossível, assim como seria impossível ele fazer qualquer coisa dessas com qualquer garota. Oras, amigos e conhecidos dele de colégio estavam todos a perder a virgindade e ele ainda nem ao menos beijou qualquer garota na vida. Mais ainda, como já foi dito, mal conseguia conversar com elas.

IV - O dilema, pt. 1

Isso estava deixando o guri completamente angustiado. Ele subia pelas paredes ao saber que o mundo todo curtia pessoas do sexo oposto (ou do mesmo, se pá) e ele ali, sem ao menos conseguir qualquer coisa. Caso o leitor já tenha passado por isso, ou quem sabe ainda passa, sabe como é horrível a sensação de ser BV (Boca Virgem, se você tem mais de 30 anos de idade) e, a cada lugar que você olha tem alguém se beijando. Seja na TV, nos filmes, na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapê, enfim, sempre tem pessoas trocando salivas. Talvez ele não seja encanado por ser virgem porque se vê muito mais cenas de beijo do que de sexo. Mas por Deus, vamos por partes.

V - Resumindo

Werther nada mais é do que aquele tipo de cara tímido, que não consegue falar com garota alguma, que dirá chegar nela. É também um tolo sonhador. Apesar de ter o defeito da falta de comunicação, mesmo assim ele tem a mania de idealizar cenas e garotas, Mesmo que ela não seja perfeita, oras, ele nunca falou com ela, não sabe se ela presta mesmo ou não. Então, tem a mente livre pra pensar qualquer coisa que quiser. Mas não só de defeitos vive Werther. Ele tem lá seus amigos, que o apóiam nos seus delírios e lêem as cartas de amor que nunca foram entregues a qualquer destinatário. Ele tem sim amigas, até se dá bem com elas. Mas o que não é muito claro na cabeça dele (e talvez na sua também, espero que não) é a distinção entre "meninas amigas" e "meninas possíveis casos". Ele é um fraco, que tem uma atitude pra cada tipo de mulher-gênero citado. Praquelas que é afim, ele se comporta de maneira diferente, é mais agradável, gentil e não fala palavrão na frente dessas. Bom, qualquer guria que se depare com um cara assim contesta a sexualidade do mesmo e o descarta por isso. É bem ingrata a vida, essa é a verdade. Garotas querem garotos que, dentre outras coisas, tenham um quê de sensibilidade, mas isso não pode/deve ser demonstrado à primeira vista senão ela acha que o cara é gay. Dá pra entender?

VI - O dilema, pt. 2

Aconteceu que, lá pelas tantas, entrou uma aluna nova, a Charlotte. E ela, como Werther escreveu no MSN pro seu amigo de longe, é demais:

"Werther - procurando alguém que compreenda e abrigue meu (L)

Então, cara. Ela é linda *.* E fofa =] Tem um jeito assim de menina quieta e tal, o que faz com que ganhe pontos no meu score =P"

Como ele disse nesse trecho pro seu brother Guilherme, foi amor à primeira vista. Assim como tantas outras vezes. Só que com essa menina havia algo nela que a diferia das outras com quem ele já viajou mentalmente. Não sabia ao certo o que era, mas tinha a intuição de que alguma coisa haveria de ser diferente, para o bem ou para o mal.

VII - O Destino

Quisera o destino, esse grande sacana, que Werther e Charlote se trombassem. Uma amiga dele puxou conversa com a Lote (como ele já a chama em sonhos), e essa foi a ponte que ele usou pra cruzar as barreiras da timidez de chegar uma primeira vez numa guria. Ela era da cidade em questão, ao contrário de Werther que há um pouco tempo viera de outra, só que estudava em outro colégio. Devido a uma mudança de casas por parte da família, ficava mais cômodo mudar também o colégio da garota. Papo vai, papo vem, aula vai, aula vem e acaba o dia. Werther está muito animado com a nova musa inspiradora e comenta, como sempre, com o amigo:

"Werther - você veio pra me fazer feliz ;)

Ai ai, viu, eu consegui finalmente fazer uma das piores partes desse lance de pega-pega ô.o Vai, tá verto que não foi tudo graças a mim u.u Mas eu acho que fui bem e que tenho chances o.o"

Bom, de fato ele teria chances se não houvesse:

VIII - O Empecilho

Se o leitor é daqueles que espera pelo pior, sim, é isso mesmo que você pensou: ela tem namorado. Não só isso, eles namoram há um bom tempo e o relacionamento está solidificado. Claro que por ironia da vida isso poderia declinar e o namoro poderia acabar. Mas se você visse a paixão com que o beijo entre eles foi dado, logo no dia seguinte, no final da aula, do mesmo jeito que o Werther viu, você desconsideraria qualquer chance de término.

IX - Turbulência

Ele não acreditava no que via. Logo ela, que era tão linda, tão legal, tinha uma cabeça boa e tantos gostos em comum com o nosso protagonista. Vai ver era isso o que ele pensou como fator que demonstraria que dessa vez seria diferente. Dessa vez ele chegou a conhecer a menina e, além disso, ela já tinha par. Não podia ser verdade, ele se recusava a acreditar. Na cabeça doentia dele, pensou que ela estava mesmo era traindo o amor todo que ele havia depositado nela. Pensou que ela pegou o coração dele, jogou no chão, pisou e cuspiu em cima. Os antes pensamentos ternos que ele tinha por ela se transformaram em raiva, desespero, traição. A única garota que ele chegou a amar mais profundamente faz isso com o pobre coitado do Werther. Não, não poderia ser verdade.

X - A solução

É muito difícil suportar uma traição. Ainda mais com a nossa primeira garota. Mas Werther, apesar de tudo, era um desequilibrado. Aí que está, eu sei que você tá pensando: "duh, nada a ver, eles nem ficaram e nem nada, ela não era e nuca foi dele, po". Sim, com certeza, o pensamento está correto. Porém, Werther não pensava desse jeito. Pra ele, o pouco tempo de conversa durou como se fosse um relacionamento de anos. Não, ele não suportaria mais ver a cara deles, muito menos rever a cena no fim de aula, de Lote e do cara dela se pegando a porta do colégio. Dias passavam, e a situação piorava, ele não conseguia mais olhar nos olhos dela, aquela imagem da suposta traição pairava na cabeça na mente do romântico e ele não conseguia pensar em mais nada, a não ser em achar uma solução pra isso.

Bom, a maneira mais fácil de se livrar dos problemas da vida, sejam eles quais forem, é acabar justamente com essa, a vida. Suicide solution. Mas como, como fazer isso? Arranjar uma arma e dar um tiro na nuca? Sim, seria uma saída em outras épocas, mas ele não estava em condições de arranjar uma. Resolveu pegar outro caminho e apelou pra veneno. De rato. Desses que são comprados com facilidade em qualquer loja do ramo. Preparou na cozinha um leite com Toddy, deu boa noite aos pais e disse que tomaria no quarto e logo iria dormir. Mal sabiam eles que pra sempre. Estando em casa, de noite, na frente de seu notebook e do copo citado, ele despejou o conteúdo em pó na bebida. Vida ingrata, mulher ingrata... mente ingrata? Que o fez sofrer sem necessidade. Mas oras, este é o Werther. Tomou a bebida, de gosto amargo pelo veneno e doce pelo achocolatado. Deitou-se na cama. Tentou dormir, mas a reação de vômito veio antes. Permaneceu ali, deitado, de barriga pra cima, vomitando muito por cima de seu próprio corpo deitado, já esperando pelo óbito. Parecia que estava era vomitando o coração, que tanto o fizera sofrer e foi o causador desse fim. Dali umas poucas horas ele não aguentou e morreu.

No desktop de seu notebook havia apenas um ícone, do bloco de notas, intitulado: "Testamento e outras considerações.txt". Lá dizia que morrera porque seu coração e mente não aguentavam aquele mundo de desejos reprimidos e injustiças amorosas. Não citou nada a respeito de Charlote, afinal, não queria causar maiores problemas pro lado dela... embora ela merecia, pensou enquanto redigia suas últimas linhas. Desacreditado do mundo, desacreditado no amor, na felicidade com a mulher de seus sonhos, assim morre Werther, vítima de si mesmo, de seus pensamentos e de seus amores. FIM.

GaP
Enviado por GaP em 22/05/2009
Reeditado em 24/05/2009
Código do texto: T1609457
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