Santo Sepulcro

Sentimento já conhecido este que sinto. Cerimônia por vezes realizada. Ela disse não ser mais possível, não por minha culpa, mas por sua própria. E o adeus... Dias se passam, e o luto continua. Velo o amor por semanas trancado em meu quarto. Suas cinzas permanecem no ar, o vento que sinto não as leva embora, e meu luto parece ser eterno.

Já perdi as contas de quantos enterros fiz, e quantas vezes entrei de luto nesta vida. Todas as vezes que velo os amores a dor parece maior, tal qual quando vamos perdendo as pessoas à nossa volta e nos vendo sozinhos. As pessoas sorriem, o mundo continua. E o viúvo não sabe onde mais colocar rosas negras.

O amor me pesca e me abandona como um andarilho a vagar sem rumo, que chega, desarruma as malas, e as arruma para partir tão depressa quanto chegou. Passa por debaixo do arco-íris a me trazer cores belas, mas em pouco tempo, quando acordo em uma manhã, encontro a cama vazia, e a mesa já não posta. Os dias perdem sua rotina, fico perdido e passo a enveredar por outros caminhos sem uma direção, sem um destino.

Ao voltar pro retiro de meu canto, ouço canções que me lembram sua voz, vejo filmes com seus olhos, leio livros que descrevem seu sorriso. Acabo por fim a ser aquela a quem amo, por amar tanto nela me transformo.

Quando em outros amores, muitas vezes tive de me transformar também, para agradar, para convencer. Desta vez não precisei me transformar, fui eu mesmo, encontrara um corpo a refletir o meu interior, talvez por isso o sofrimento seja maior. A vida nos proibiu de permanecermos unidos, e também faltou-nos coragem para enfrentar todas as regras. Os ventos gelados levaram nossa única chance de sermos felizes, almas tão parecidas não se encontram todos os dias, dizem uma única vez.

O peito dói forte, as lágrimas ainda caem, como um rio inesgotável alimentado por um oceano subterrâneo de inconformismo. Acordo no meio da noite, e vejo um fantasma a me olhar. Suas aparições são constantes e me desesperam. Custo a dormir novamente, e quando acordo cedo, sinto o seu cheiro pela casa, ouço suas risadas, e seu andar. Quando param de me atormentar, fecho os olhos e vejo as estradas oblíquas e tortuosas dos olhos do meu amor falecido. Passo a andar por lugares onde ele passaria, lugares por ele conhecidos e freqüentados para sentir sua presença, e volto a sentir seu cheiro, e quase o vejo, ó alma que partiste para longe.

Volto e deposito mais uma rosa em seu túmulo, para me lembrar de como tive esperanças de ser feliz, e de como fui feliz eternamente em alguns meses. Resta agora ao tempo agir. Trar-me-á algo semelhante? Ou fadado estou ao eterno luto?

Luigi Ricciardi
Enviado por Luigi Ricciardi em 01/06/2009
Código do texto: T1625746
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.