A Roseira de Rosa

O velho Ernesto acordou cedo e como sempre foi aguar seu lindo jardim. Naquele dia em especial, o dia dos namorados, sentiu profundamente a falta de sua esposa que jaz a muito no cemitério da cidade. Cuidou de cada planta sentindo a presença da saudosa amada, que falecerá a cinco anos. Os dois eram companheiros inseparáveis, cuidavam um do outro com dedicação e carinho. Não tiveram filhos, ambos eram professores de vocação e decidiram quando jovens dedicar a vida a nobre função de educadores. Receberam a comenda de ilustres cidadãos das mãos do próprio prefeito um ano antes do falecimento da Professora Rosinha, como era conhecida carinhosamente por seus alunos. Juntos tinham sido responsáveis pela educação de muitas gerações da pequena cidade de Vila Bela. Eram nascidos e criados naquela região e por tanto muito conhecidos e respeitados por todos. Mesmo hoje em dia, se alguma criança precisa de ajuda na escola, os pais procuram logo o velho professor Ernesto para aulas de reforço. O professor vive sozinho em uma modesta casa construída com o esforço dos dois. Todo o dia passa horas cuidando do jardim e esperando o momento em que reencontrará sua esposa Rosa na eternidade. No belo jardim há uma roseira batizada por Ernesto com o nome da falecida. Roseira da Rosa. Para comemorar o dia dos namorados pegou uma cadeira, um bule de café, seu jornal e sentou-se ao lado da roseira. Suspirou uma saudade imensa e bebeu um gole de café. Ao abrir o jornal Ernesto percebeu um balançar de folhas na roseira, pensou ser apenas um vento súbito e não deu muita importância. Começou uma conversa com a planta como se estivesse proseando com a própria esposa. Leu algumas matérias do jornal local em voz alta, falou do quanto sentia falta da companheira e de como estava conseguindo manter tudo em ordem. Novamente deu mais um gole no café e mais uma vez a roseira balançou de maneira estranha. Desta vez assustou-se e seu idoso coração bateu mais forte. Preferiu achar que era coisa de sua imaginação, desconfiou, mas prosseguiu com prosa. Contou os últimos fatos, do afilhado que havia se casado com a filha do padeiro e outras novidades da cidade. Pegou o bule de café e despejou um pouco mais do liquido em sua caneca, antes que pudesse dizer que sentia falta do café que só ela sabia fazer, percebeu que a roseira estava balançando, tremula. Espantado não queria acreditar no que estava vendo. Um vento não faria tal movimento. Chegou mais perto e ouviu um sussurro. Não pode entender, parecia que a roseira estava tentando comunicar-se. No susto Ernesto pegou a tesoura de poda e ameaçou a pobre roseira. O movimento cessou. Um silêncio instaurou-se no jardim. Nem os pássaros cantavam. A cigarra interrompeu seu canto de cortejo subitamente. Ernesto olhou, pensou e sem acreditar no que havia feito sorriu. Guardou a cadeira e foi cuidar de seus afazeres. A roseira ficou lá, paradinha. Ernesto antes de entrar ainda arriscou uma olhadela e nada, devia ser coisa da mente de um velho solitário. Pensou ele.

Ernesto preparou o almoço e como de costume jogou as cascas de legumes na terra para adubar as plantas. Um pouco ao pé de cada uma como aprendeu com sua esposa. Chegou perto da roseira da rosa, abaixo-se para por as cascas e ouviu baixinho um sussurro em seu ouvido:

- Ernesto.

Com o susto suas pernas ficaram fracas e ele caiu de bunda no chão. A roseira pareceu rir como fazia Rosa no tempo que viviam juntos. Toda vez que ele caia, ou esbarrava em algo por desastrado, Rosa ria sem parar. Nessa hora Ernesto não resistiu e confuso perguntou em voz baixa:

- Rosa? É você Rosa?

Desconfiado da própria loucura riu de si mesmo. Chorou quando percebeu o tamanho da falta que Rosa fazia em sua vida. Essa loucura toda só podia ser saudade. Acreditou o solitário Ernesto. De cabeça baixa, chorando, sentiu uma rosa lhe fazer carinho no rosto, como que enxugando suas lagrimas. Ernesto sem pensar fechou os olhos, pois naquele toque sentiu a pele de sua amada. Para ele não havia mais duvida, era Rosa na roseira:

Será tudo isso um sonho?

Perguntou a si sussurrando, ao que ouviu uma resposta clara:

- Ernesto. Não é sonho. Sou eu mesma meu amor, sempre estive aqui ao seu lado. Senti cada carinho que tu me dedicava e se você não sofreu mais por minha partida foi pelo conforto que aqui da roseira emanei a ti.

Ernesto de tanta felicidade não mais se importava com a loucura do fato. O melhor era que ouvia e sentia sua amada no dia dos namorados. Empolgado e emocionado pegou sua cadeira e sentou-se ao lado de Rosa no jardim. Para ele não importava como era possível sua esposa Rosa viver dentro da roseira, o importante é que ela havia voltado. Conversaram bastante mesmo para tentar por os assuntos em dia. Recordaram dos momentos felizes que passaram juntos. Era o dia mais feliz da vida de Ernesto.

Rosa esperou o momento certo para dizer que a ela tinha sido dada a missão de viver na roseira, onde ficaria ao lado do marido até que chegasse o momento do reencontro. Somente agora, na hora da morte de Ernesto é que ela poderia revelar-se. Ernesto neste momento sentiu um pouco de medo. Calou-se por um instante. Ficou pensando um tempo e perguntou:

- Então chegou minha hora de partir?

Rosa o confortou dizendo que não havia o que temer. Que a morte de fato não era o fim e que tudo ficaria bem. Ernesto, um tanto confuso, pediu a Rosa para aguardar um pouco, que ele precisava tomar um banho, trocar de roupas e trancar a casa. Levantou-se bem devagar, um pouco tonto. Sentiu o corpo gelar e as pernas enfraquecerem. Tornou a sentar e olhou para a Roseira e o que viu desta vez alegrou ainda mais seu coração, era Rosa em pé, sorrindo e de braços abertos. Uma nuvem espessa cobriu todo o jardim. Seu corpo continuou sentado, mesmo assim, Ernesto conseguiu levantar-se, leve e jovial, e deu um abraço apertado em Rosa. O jardim parecia ainda mais colorido. Os dois sorriram, beijaram-se e foram desaparecendo envoltos pela nuvem que logo se desfez. Duas horas depois meu corpo foi encontrado morto, sentado em meu jardim, com um sorriso estampado no rosto de frente para a roseira da Rosa.

Ernesto Ferreira Lima.

Macaco Pelado
Enviado por Macaco Pelado em 15/06/2009
Reeditado em 17/06/2009
Código do texto: T1650153