Reinventando pessoas

“Aquele, pois, que sabe fazer o bem e não o faz, comete pecado.”

Tiago 4:17

O amor precisa ser vivido com intensidade máxima. Uns o vêem como indispensável à própria sobrevivência, outros, - cépticos -, preferem ignorá-lo. Embora estes sejam dignos de respeito, àqueles são porta-vozes da maioria. O amor é essencial à vida; quem não o enaltece tem dificuldades para viver. O amor é genérico, havendo, pois, várias espécies de amor; seja qual for, faz bem para a alma, colore os dias, enxuga as lágrimas e, melhor de tudo, une pessoas.

Detendo a faculdade de unir pessoas, o amor transforma o mundo, eleva a auto-estima das pessoas; não o suficiente para que sejam banidas de vez as guerras em certas regiões do planeta. O conflito irresoluto por meios práticos denota o quanto há desamor, ainda, entre as pessoas. E haveria mundo sem pessoas? - obviamente que não.

Senhor Sebastião, 68 anos, lúcido. Viu e participou de inúmeros conflitos em que as pessoas foram mortas; às vezes pelas armas, noutras pela escassez de alimentos - o básico que necessita um ser humano para sobreviver... - Incansável, obstinado, trabalha em prol de uma sociedade menos hostil.

Recebia pessoas e as acolhia como podia; não possuía ganhos exorbitantes, mas como coronel reformado era possível dividir. Saia todas as manhãs em direção à Casa de Acolhimento Santa Inês – um vício –, e lá permanecia até a hora do almoço; por vezes estendia até à tarde.

Numa manhã de inverno intenso, aparece uma senhora arrastando duas crianças – mais ou menos 5 e 8 anos – em manga de camisa; duras de tanto frio. Sebastião com paciência acolheu-os, providenciando agasalhos, alimentos e como fazia com todos, indagou de onde vinham; históricos de vidas. As crianças alimentadas e sentindo menos frio, juntaram-se às outras em brincadeiras.

- Senhor Sebastião! Sou verdadeiramente grata a sua acolhida – disse a mulher com os olhos marejados, a voz trêmula...

- Senhora – disse Sebastião – tenho 68 anos e tudo que faço para minorar as dificuldades das pessoas, faço-o com imensa satisfação. Não entendo senhora, como há pessoas que nem se tocam ao sofrimento alheio; o mundo poderia estar melhor não fosse o egoísmo – o egocentrismo. Contudo, enquanto estiver firme estarei estendendo a mão a todos que necessitarem.

A senhora pôs-se a olhar Sebastião como se buscasse nele uma explicação plausível para toda aquela disposição e, claro: bondade. Conversaram pouco, afinal, a senhora evitava falar; era mais observadora. Mas Sebastião insistiu:

- Como se chama senhora? Perguntou Sebastião pigarreando.

- Chamo-me Fátima senhor.

- De onde vem senhora Fátima? Indagou Sebastião.

- Venho de muito distante senhor e preciso o quanto antes seguir minha viagem – Fátima expôs com ponderação.

- Sugiro senhora Fátima que espere um pouco até as crianças recuperarem; estão magras e desnutridas. Sebastião aconselhou-a.

- Não senhor, perdoe-me! Não posso levar as crianças; tenho outras tantas à frente.

Sebastião assustou-se.

- Mas não são seus filhos, senhora Fátima?

- Biologicamente não senhor! Achei-os jogados a um canto; famintos e com muito frio. Meu dever era socorrê-los e o fiz...

- Já sabia desta Casa, senhora Fátima? Inquiriu Sebastião, pigarreando novamente.

- Sim, senhor, eu sempre soube!

No terceiro dia Sebastião chega à casa pela manhã e vai de encontro à senhora Fátima; não a encontra. Saiu sem que fosse observada. Apenas se foi.

Meses após, as dificuldades enfrentadas pela Casa foram minguando; pessoas se oferecendo para ajudar, empresas efetuando doações.

E Sebastião, obstinado e devotado, anseia que um dia aquela senhora volte a visitar a casa – mas que não demore muito...