AS LÁGRIMAS DOS LETREIROS DE NEON

A cidade representava as lágrimas dos letreiros de neon, se a fina chuva que a previsão do tempo disse que ia cair realmente caisse possívelmente seria a noite mais triste da humanidade. Elas passavam rindo um pouco bêbadas, era sábado e era domingo ao mesom tempo, todos tinham que expurgar a semana de trabalho pesado de alguma maneira mesmo que esta maneira fosse uma solidão mascarada, a persona da solidão. Os copos dourados da cerveja mais pura e as conversas acaloradas nas mesas de bar, fumaça de cigarro misturada ao oxigênio acendente, como dito na física, o ar quente sobe o ar frio desce.

Nas galerias escuras e nos dias que teimavam em dizer que estavam bem, nada estava bem e o câncer que crescia nos bueiros da cidade e na alma dos homens se tornavam cada vez mais apenas retalhos do notíciario local. Nas sombras mesquinhas do que era, nos passos tortos dos homens bêbados e nas risadas das mulheres sem classe que fumavam e bebiam olhando no salão buscando destruir o coração de mais um homem desavizado.

Catei cada resto de poesia que estava largada pelo chão junto as bitucas de cigarro. Catei cada olhar que no ar divindava-se em uma forma glacial, catei cada momento histórico do dia e transformem no esquecimento da noite. Me falaram “eu te amo”, tal palavra sempre quis ouvir e hoje nada mais me representa. Desce o álcool como um puro remédio.

Desce redondo.

Desce sereno.

Desce como chuva torrencial.

Desce poético.

E as lágrimas que fazem chorar cada ser humano nada representam quando são outros que nós veem chorar. Tapinhas nas costas e palavras vazias dizendo “está tudo bem” mas você não ama e mente dizendo que amou. Afogo-me nas vitrines e nos cacos do espelho, afogo-me no copo vazio em minha frente e enforco-me na gravata listrada que ganhei do patrão no amigo secreto. Na carta não haveria despedida melhor do que um breve adeus, nos versos não haveria rima melhor como um breve adeus que não teria coragem de dar mas ela o deu por mim e no fim, na história, no meio, um borrão no céu na camisa, na gravata, no sofá. Eram lágrimas de um homem desesperado.

E tentar fugir pela noite procurando um amor diferente, procurar nas outras mulheres aquela quem eu amei mas nunca fora amado, procurar nas vidas das pessoas um motivo para lamentar-me, procurar nos livros de auto-ajuda um otimismo falso e decorativo feito para best-sellers. Minha vida não era best-seller e eu nunca acreditei em psicólogos. Fiz meus passos, fiz minhas caminhadas, fiz minhas madrugadas. Cambaleei e cai no lixo da cidade, nas poças de lama, nos risos das meninas. “Mais um bêbado”, não eu não era, eu era apenas alguem que nunca fora amado. “Mais um bêbado”, não eu não eram, eu era apenas mais um ser vivente tentando mostrar do que eu não sou capaz. “Mais um bêbado, não eu não era, apenas não sei como provar-te isso.

Dormindo na sarjeta sentindo a dor, aquela dor no peito que quando jovem me disseram que era amor e eu disse que era mentira, dormindo no esgoto da humanidade sendo banhando pelas lágrimas dos letreiros de neon. Essa era a noite mais triste da humanidade, sim, a previsão do tempo acertou: Choveu.