AMARELA

O riacho ficava próximo à pequena Vila das Lavadeiras, aonde os moradores mais modestos iam lavar as suas roupas, também perto do riacho se encontrava a estrada que ia para uma cidade, em relação à Vila, a cidade era grande e evoluída com seus vinte mil habitantes. Nesta vila morava Ethelvina, filha do coronel Leôncio, temido pelo gênio terrível, e tinha quatro irmãos. Seu pai queria que fosse para um convento, mas a mãe, senhora nobre e amorosa, sentia o desespero da filha, e a protegia dizendo que necessitava da ajuda da única filha mulher, nos afazeres domésticos.

A fuga dos constantes dissabores com o pai, Ethelvina encontrava no riacho lavando roupas, cantarolava enquanto tomava banho de rio, próxima a queda d’água.

Saindo de dentro do rio com o vestido colado ao corpo, era a visão mais tentadora que Danilo havia presenciado em toda a vida. De início não havia notado a presença da moça, foi o barulho das águas que o despertou atenção e a visão o deixou sem chão. Ele se dirigiu gentil à moça e se desculpou pela invasão, Ethelvina acenou que sim com a cabeça, pegou a trouxa de roupa e passou por ele sem dizer uma palavra.

Danilo retornou no dia seguinte no mesmo horário, e lá estava ela; linda, cabelos pretos levemente encaracolados, pele branquinha, olhos castanhos que denunciavam certa tristeza, lábios rosados e puros. Ele a contemplou o quanto pôde e arriscou outra aproximação, sendo menos embaraçador.

O terceiro encontro foi mais promissor, Danilo chegou primeiro e olhava para a queda d’água quando Ethelvina apareceu. Ela, menos receosa, se sentou na pedra ao lado dele e conversaram por horas despercebidas. Quando mencionou que iria embora, Danilo lhe pediu em namoro, ela formalizou que aceitaria com a condição que ele lhe trouxesse um presente, mas teria que adivinhar o que ela queria. Enquanto se afastava sorrindo, Danilo lhe pediu uma dica e ela de longe gritou a palavra: amarela.

Danilo passou a manhã toda eufórico, saiu cedo do hotel que estava hospedado e andou pelas ruas da pequena cidade, procurando algo para presenteá-la. Pensando na dica amarela, imaginou uma jóia, comprou um conjunto: pulseira, brinco, gargantilha e um anel. Não queria decepcioná-la.

De volta ao riacho, percebeu o olhar da moça triste e distante, mexendo com as mãos devagar, provocando pequenas ondas na água.

Ele com a pequena caixa de presente se dirigiu a ela e fez menção de entregá-la, mas ela não recebeu, se levantou, e comentou que ele devia se lembrar do presente que ela queria, e caminhou de volta à casa.

Danilo pensou em segui-la, mas entrou no carro e retornou ao hotel. Deitado na cama, não conseguia dormir, seus pensamentos estavam em Ethelvina. Aquela expressão não saía de sua lembrança, queria muito agradá-la, não queria comprá-la, só queria afastar aquele olhar triste e trazer alegria àquele rosto que lhe encantava e roubava-lhe o sono. Por mais que pensasse não imagina que presente amarelo lhe agradaria.

Danilo não era apegado a crendices, tampouco era um homem de orar, mas era seu último recurso, adormeceu, com o pensamento que se Deus existisse de fato, o ajudasse a tirar aquela tristeza que pairava sobre a mulher que amava.

Acordou atrasado para comparecer à empresa que estava prestando assessoria. Havia um engarrafamento em frente ao único semáforo da cidade e alguns motoristas batiam boca a respeito da culpa de uma pequena colisão entre dois veículos. Estacionou na praça e resolveu caminhar até a fábrica. No passeio largo que contornava a praça viu uma pequena floricultura e de relance um vaso que estava sendo preparado com flores amarelas. Sentiu seu coração gritar, parou, queria comprar o vaso, mas Gilda, uma senhora de setenta e três anos, não quis ceder, alegando que aquele vaso era encomenda de um cliente antigo. Consternado ia saindo da floricultura quando Gilda lhe chamou e o entregou uma rosa amarela, afirmando categórica que era o que ele precisava.

Desistindo de se apresentar ao trabalho, Danilo decide desesperado voltar ao riacho, era cedo para encontrar Ethelvina, mas não tinha condições de protelar, guiava o carro admirando a rosa de um amarelo intenso que quanto mais se aproximava do riacho, mais parecia irradiar luz.

Mesmo distante já podia vê-la, estava de pé numa postura confiante e um sorriso que irradiava a mesma luz que a rosa, a sensação que sentia era inexplicável, jamais havia presenciado tamanha beleza.

Parou o carro e enquanto caminhava em direção a queda d’água, ficou apreensivo, não a via mais, procurou por perto e sentia seu desespero crescendo a cada segundo.

Entrou no carro e foi até a Vila das Lavadeiras, avistou um pequeno mercado, foi atendido por um menino que lhe afirmou não conhecer Ethelvina.

Saiu do mercado seguido por um senhor que o chamou. Sentaram-se na praça e o Sr. Elthon, não lhe fez pergunta, apenas lhe contou a história de sua irmã Ethelvina. “Há muitos anos atrás, minha irmã sempre ia ao riacho, acompanhada das lavadeiras, e se apaixonou por um mascate que passava em direção à cidade. Meu pai descobrindo o romance, ficou enfurecido, seguiu-a e quando o mascate chegou, o pôs para correr, ameaçando-lhe com uma espingarda. Ele nunca mais retornou. Ethelvina não suportou a espera, entrou no riacho e se afogou. As lavadeiras contam que a ouviram confessar que esperaria pela rosa que ele lhe prometera”.

Danilo não acreditava ser esta história ligada com a sua Ethelvina, não se permitia acreditar. De acordo com a data do acontecido, ele não era ainda nascido.

Retornando ao riacho, Danilo ouviu o som leve da queda d’água, depositou a rosa amarela na pedra que Ethelvina sempre se sentava, entrou no carro e de longe contemplou mais uma vez a visão irradiante de Ethelvina, que lhe sorria e tinha nas mãos a bela rosa amarela.

Lilia Costa
Enviado por Lilia Costa em 30/09/2011
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