AO AMANHECER...

Ao despertar naquela manhã de primaveril clima de inverno,não teve coragem por assim dizer,de se levantar como rotineiramente. Algo a prendia as cobertas e ao mundo particular que criara para si entre áquelas paredes.

Não sabia se era um misto de solidão com saudades,cansaço ou apenas vontade de se deixar ficar em silenciosa recordação do que ela própria havia sido e já nem se lembrava bem.

Revirou cada canto, os mais remotos de sua alma/mente e tentou algumas vezes debalde se encontrar por inteiro.

Pode encontrar em muitas vielas do passado cacos que se perderam ao se desprender de uma alma que talvez,na verdade nunca tenha sido inteira.

Sentiu cheiro de mar,ouviu estrelas,brincou na amplidão dos sonhos que acreditaram que poderiam ser realidade.

Chorou de tanto rir, sorriu inúmeras vezes para não transbordar o choro.

De olhos e porta fechados,parecia que com a luz apagada a noite poderia jamais amanhecer e quiçá dessa forma,não amanhecendo não sofreria...

... Mas o sol nasce todos os dias,ainda que encoberto por nuvens finas ou borrascas e sofrer se tornou uma coisa banal quando o mote era saudade.

Relembrava cada acorde de canção entoada,revivia cada sonora gargalhada,sentia o gosto de cada beijo,o aperto de cada abraço,o amor em cada amor (re)feito .

Reinventava a silueta encontrada em cada luz de velas,em cada taça de vinho,nas pétalas de rosas espalhadas pelo chão e pelo leito/eito onde o amor se tornava físicamente químico e biológico.

Na penumbra do quarto e da alma, dançava sobre os pés que teimavam carinhosamente em ensinar a dança. Fosse qualquer melodia,apenas se desejava estar colada no corpo do outro.

A manhã prosseguia em seu apertado acerto do relógio com o tempo e ela apenas se deixava ficar...

... Permanecia calada tamanha gritaria silenciosa havia em sua alma,se mantinha imóvel de tanta agitação em seu íntimo.

Mas era dia, a porta havia sido aberta e a noite fugiu furtivamente para dar lugar ao sol, ainda que tímido.

Tomou enfim coragem,se levantou,arrumou a cama ,pois a vida parecia sem possibilidades de arrumação... caminhou até o jardim e se deixou fugir rumo ao futuro do pretérito que o presente encenava.

Foi vista pela última vez sentada na beira de uma nuvem de chuva que iria indubitávelmente regar os canteiros de estrelas pelos jardins do firmamento com suas lágrimas de saudosas recordações.

Era preciso ter coragem de amanhecer...

... Seguiu apenas amanhecendo.

MÁRCIA BARCELOS.

21/10/2011.

Márcia Barcelos
Enviado por Márcia Barcelos em 21/10/2011
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