Bom senso e liberdade

Conta-se que dois homens caminhavam lado a lado. Um era jovem, trazia consigo os sinais da inexperiência. Tinha olhos vivos e atentos a tudo, como quem quer aspirar a vida em um só fôlego.

Desejava modificar o mundo, revolucionar sua época, ensinar o muito que julgava saber.

O outro trazia no semblante as marcas do tempo e já não queria tomar o mundo, contentava-se em aprender um pouco, aqui e ali, analisando, sereno, as experiências que a vida lhe apresentava.

Tampouco desejava deixar suas marcas nos homens e nas coisas que o rodeavam. Não queria discípulos, nem seguidores, e não pretendia modificar ninguém, a não ser a si próprio.

Era cego de nascença. Porém, apesar de ter os olhos do corpo fechados, possuía abertos os da alma.

Vinham em silêncio quando o jovem, surpreso, exclamou: uma pipa! Uma pipa no céu!

Por que está tão alegre em vê-la, ainda que distante? Perguntou o cego.

É que toda vez que vemos uma pipa, uma só idéia nos assalta a alma: a idéia da liberdade e, qual de nós não valoriza a possibilidade de sentir-se livre? Disse o jovem.

Liberdade? Questionou o homem. Estranho, para mim a pipa tem outro significado.

Outro significado? Como? Sabe o que é uma pipa?

Sim, meu amigo, eu sei o que é uma pipa, papagaio, pandorga, como queira chamar.

Pois a imagem desse objeto me traz à mente a idéia de responsabilidade e bom senso.

Não entendo... disse o jovem.

E o homem falou com sabedoria: o exercício da liberdade é complexo e fundamental em nossas vidas.

Todavia, como você pode perceber, a pipa tem uma liberdade muito relativa, graças ao fio no qual está presa.

Poeta Dom Casmurro
Enviado por Poeta Dom Casmurro em 11/12/2011
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