AMIGO É PRA ESSAS COISAS

- Salve! / - Como é que vai? / - Amigo, há quanto tempo! / - Um ano ou mais... / - Posso sentar um pouco? / - Faça o favor / - A vida é um dilema / - Nem sempre vale a pena... / - Ah!... / - O que é que há? (Amigo é pra essas coisas / Sílvio Silva Jr. e Adir Blanc)

- Entra, fique à vontade, tem café na garrafa e cerveja na geladeira.

- Onde deixo minhas coisas?

- Deixa aí num cantinho, depois a gente vê.

- Não queria incomodar...

- Relaxa.

Silêncio. Mudança profunda de planos. Uma vida arrumada, a outra desconstruída. As duas no mesmo espaço por um tempo indeterminado.

- Você disse que sua casa era grande...

- É grande quando se vive só.

- Solidão... Não me acostumo.

- Precisamos terminar nosso projeto – desconversa.

- Não tenho cabeça para isso.

- Superamos dores trabalhando.

- Preciso de um tempo.

- Vou pegar o computador.

Na sala um olhar perdido entre os objetos e um embaraço inevitável, quase uma invasão. Vê suas malas ocupando o espaço antes acomodado numa amizade próxima, mas não íntima, cotidiana.

- Custa a passar?

- O quê?

- Essa vontade de não fazer nada...

- Demora um pouco. É bom ocupar o tempo.

- Quando você diz parece fácil.

- Mas não é – diz com um riso no canto da boca.

Trabalharam noite adentro. As mentes ocupadas com traços, cores, palavras e pensamentos desordenados. Momentos de silêncio e discussões internas. Um reclamando abrigo, outro vivendo uma rotina equilibrada, quase resignada.

- Às vezes, do nada, vem uma falta... um medo de estar perdendo ou ter perdido algo muito importante.

- Afinal, do que você sente tanta falta?

- Do meu sonho.

- Nada impede que você adormeça novamente e volte a sonhar.

Lá pelas tantas observam, exaustos, o resultado do trabalho de horas na madrugada de sábado. Os olhares são diferentes. Um vê o projeto acabado pronto para impressão. O outro, a beleza do que aconteceu.