Efêmero engano.

Observo, ao longe, uma casa branca, de telhado gasto e jardim florido. Uma mulher e um homem conversam, sem darem conta da minha existência. Ela veste uma jaqueta clara, combinando com a cor da casa, enquanto ele pega uma mecha solta de seu cabelo ruivo e recoloca-a no lugar, atrás do ouvido, olhando para ela de maneira doce. Ele usa uma blusa marrom, da cor de seus olhos, e senta num sofá-quase-rede, que balança de trás para frente à medida que eles conversam. O que estariam fazendo ali, aqueles dois, às 12h24? Horário de almoço, talvez. Eles, provavelmente, trabalham pela redondeza. Conforto, obviamente. Como os donos de uma casa imponente como aquela poderiam viver sem conforto?

Ela pega sua cinza bolsa aveludada, ele pega sua preta mochila de couro. Preparam-se para sair, ambos em um só carro. Preto, fora de qualquer ameaça de proporcionar insegurança. A casa é apenas minha agora.

Imagino-me ali, sentada naquele grande sofá da entrada numa noite fria e estrelada. Nas mãos, um chá de hortelã quente o suficiente para que o frio torne-se confortável. No corpo, um cobertor aconchegante. No colo, você. Do lado de fora, ninguém para incomodar-nos. A árvore ao nosso lado balança lentamente devido à brisa calmante, e meus lábios encontram os seus. Permaneço assim por um tempo indeterminado, sentindo o sabor da sua boca misturando-se ao meu. Morango e coco. Nunca me pareceu uma mistura agradável, até você chegar.

As luzes da vizinhança apagam-se, e estamos, oficialmente, a sós. Afundo-me em você. Afundamo-nos debaixo da coberta, e trocamos o calor proveniente do chá para compartilhar o calor presente em nossos corpos. Abraços que antecedem beijos que antecedem suspiros que antecedem nossa doação de corpo e alma. Amamo-nos intensa e inteiramente. Verdadeira e irrevogavelmente.

Meu sonho é interrompido por um incessante apito, parecido com um alarme. Flagro-me adentrando a casa branca sem ter o controle de meus próprios membros. Meu rosto ruboriza-se de tal forma, que meus pés desabam abaixo de meu próprio corpo. Ouço o portão sendo aberto. Corro na direção contrária ao barulho das chaves adentrando as fechaduras, enquanto as maçanetas rodam e abrem o espaço vazio posterior a elas. Saio pela entrada dos fundos como uma fugitiva.

Se aquela casa fosse nossa, viveríamos em paz. Viveríamos a sós. Mas “casa”, nem sempre, é um lugar. E, depois de muito procurar, encontrei-me em você. Meu lar é seu coração.

Raíssa César
Enviado por Raíssa César em 15/06/2012
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