Destroços de nós dois.

Ele nunca deveria ter voltado. Disso, eu sabia. No momento em que partiu, sem dizer nada, sem beijar-me a testa ou os lábios, deveria ter caminhado adiante, sempre em frente. Eu gritaria por seu nome, sim, mas ele não olharia. Eu correria ao seu encontro, mas ele não me veria. E correria mais rápido, fugindo de um monstro invisível presente no abismo entre nós. E seria intocável, queimaria mais que o sol. Após alguns dias de luta, encontraria seu refúgio em algum lugar, exceto em mim. Esconderia-se, até eu descobrir que a ponte que eu estava tentando construir para unir-nos não tinha material suficiente para cobrir todo o espaço vazio, porque a outra metade viria dele.

Ele, porém, conseguiu me ouvir além do vácuo indestrutível que insistia em habitar nossa efêmera existência. Olhou para trás e correu ao meu encontro. Pegou os pedaços que o pertenciam e juntou aos meus. Completamos nossa adorável passagem. Tropeçamos em alguns pedaços soltos de madeira enquanto nos agarrávamos sobre aquela construção mal-feita, que foi se quebrando e se desmanchando conforme os dias passavam.

As madeiras soltaram-se debaixo de seus pés enquanto ainda estávamos ali. Observei-lhe caindo naquela escuridão infinita, mas o comprimento dos meus braços não eram suficientes para salvar-lhe. Desespero. Tentei gritar, mas ele não ouviu. Ao contrário da última vez, não houve força alguma para trazer-lhe de volta para mim. Eu pude ver seus contornos desaparecendo, enquanto tentava, de alguma forma, resgatar-lhe de volta. Já era tarde demais para tentar colocar em ordem tudo o que havíamos perdido em seu primeiro desaparecimento. Sua aparição repentina deixou-me estonteante, mas não o suficiente para suprir todo o espaço dentro de mim, todo o vazio entre nós. Eu o vi cair, e não tive coragem e força para resgatar-lhe.

Enquanto nosso laço desfazia-se, vi-me chorar de saudade dos momentos nos quais nada poderia nos separar. Desejei, por um instante, que as coisas voltassem a ser daquela forma. Que ele nunca tivesse partido. Que eu nunca tivesse permitido. Que nós nunca tivéssemos soltado as mãos. Era inútil. Nada voltaria a ser como antes. Não seria a mesma coisa. Desejei, portanto, que ele nunca tivesse regredido. Que nunca tivesse me ouvido, olhado para trás, ajudado-me a reconstruir o que nos unia. Ele nunca deveria ter voltado. E, disso, eu sabia muito bem.

Raíssa César
Enviado por Raíssa César em 15/06/2012
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