Onda de Crime

Nessa arte assumo o desespero. Grito. Esperneio. Quebro coisas. Sou apresentado ao ódio e a angústia. Nada além de mentiras. Digo que não tem o que ser perdoado. Mas você insiste em me perdoar. Está perdoado, você diz. Não quero perdão, digo. Não há o que perdoar. Você acrescenta o ódio. Não me deixa esclarecer as coisas. Errei em não contar, em tentar não me importar. Você diz que não pertencemos as pessoas. Concordo. Tento dizer muitas coisas, mas não sei por onde começar. Estou confuso. Coleto memórias antigas para te fazer entender. Sinto o cheiro da terra, do sol quente queimando o asfalto. E ainda sim, sinto o frio dessa cidade gelada.

Há um ano você me convidou para uma festa. Encontramos alguém que você se relacionou. Você deixou algo no ar. Meus olhos queimaram. E nesse momento comecei a ser um completo idiota. Eu não consigo tratar do ciume da forma que as pessoas normalmente tratam. Te ignorei. Bebi demais. Conheci 'vinte mil' pessoas, e outras vinte mil me conheceram. Estive fora de mim por cinco horas. Todo o tempo eu não quis demonstrar meu ódio. Tudo o que passava na minha cabeça era que você encontrou alguém que tinha o mesmo nome de alguém que você amou. Não conhecia ninguém nessa cidade. Todos sempre ficariam do seu lado. E eu, eu ficaria no sofá assistindo os programas de domingo, até que meu ônibus pudesse partir para sempre. Bebi mais um pouco. Engoli dois cachorros-quente. Fugi de mim. Desisti de comer carne há quinze anos atrás. Mas o ódio me fez aprender. Descemos a rua. Queria que você sumisse para nunca mais voltar. Queria sentar na praça das noivas e esperar o sol me machucar. Queria nunca mais pisar nessa cidade de três horas.

Voltamos ao hotel. Estava fechado, e tivemos que aguardar por quase meia hora. Lembro que roubei alguns pedaços de bolo. Corri pelas escadas, porque não aguentava esperar o elevador. Dividimos a cama. Dormi.

Quando acordei me senti um selvagem. Tomei banho. Você me convidou para conhecer sua casa, e eu recusei. Não podia conhecer sua família ainda. Pedi que fosse, e aguardaria você voltar. Eu estava perdido nessa cidade. Sentei um pouco na praça da prefeitura. Tomei um pouco de café.Sentia a carne queimando no meu estômago. Ele não conhecia mais a carne. Queria arrancá-la de mim. Uma, duas, três horas e você não voltou. Voltei para o hotel. Pensei em coisas que deveria pensar. Tomei outro banho, mas nada me tirava o cheiro de carne. Você voltou. Senti que você não poderia ir embora novamente. Queria pedir desculpas, mas você iria me perguntar o por que da do pedido, e eu teria que admitir meu ataque infantil. Você me deixaria como me deixou. Mas mesmo assim, eu não poderia me prestar ao papel que as pessoas me imputam de ser mais um frustrado.

Já está ficando tarde. você me leva para outro bar. Encontro seu primo, seu amigo. Bebemos mais um pouco, e então comemos carne novamente. Odeio essa experiência carnívora. Mas sou estranho demais para admitir que sou vegetariano. O mundo não entenderia. E você me deixaria de novo. Você me levou para rodoviária. Meu ônibus chegará em uma hora. Conversamos um pouco. Você está feliz. Estou angustiado, porque não trato bem do ciume. Você me beija. Aceito seu beijo, mas estou com raiva. Nada que eu pudesse te contar. Entro no ônibus. Durmo. Desapareço.

Yuri Santos
Enviado por Yuri Santos em 03/09/2013
Reeditado em 05/09/2013
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