Canção final.

Estava deitada sobre os seus livros, Pessoa entendia melhor o seu momento. Essa angústia no peito, esse passar do tempo que não passa só perpassa o dia.

O dia começa exatamente dessa maneira: abra os olhos, você precisa levantar e conceder o que o mundo pede. Toma café, escova os seus dentes e penteia o seu cabelo. Perfuma-se e fique do jeito que a revista exige e siga para o seu destino. O trabalho te espera, os seus alunos estão aguardando o giz riscar o quadro, o livro ser aberto e exercícios aos moldes para acesso à faculdade. Depois disso, vá estudar novamente, se atualizar é sempre bom para o crescimento profissional e intelectual. Temos fome de conhecimento e quanto mais fome, melhor para o mercado... E assim era o seu dia, suas obrigações ocupavam a mente e sua angústia. Nada percebia o parafuso fora do lugar. Tudo parecia andar normalmente. Ela fazia com que isso seja mostrado dessa maneira. Veja o que te mostro e nada mais. Porém, só ela e Deus sabia o seu verdadeiro estado de alma.

O histórico do Google incriminava os numerados acessos à mesma página, o álbum que via toda vez na madrugada. As poesias que simultaneamente a confortava e entristecia o seu órgão. Cada detalhe que ela pensava, cada ação que havia feito chegava a conclusão de que nada adiantaria, nenhum agir poderia mudar o que fora decidido a muito tempo.

Caro leitor, não queira pensar que essa moça não tenha nada de especial, ela está sofrendo pelo seu triste fim. O fim que não desejava. O fim não esperado. O fim do fim de algo que foi bom e feliz para ela. O fim do fim e do Fim. Ela teve vários fins, mas enfim, se sucedeu a canção final, que é o Fim dos fins. Aquele do qual não se tem mais condições de recorrer ou pedir que Deus faça alguma coisa, pois a bela moça foi aniquilada pela falta de esperança e por acreditar que sim, ele está certo, nada mais poderia voltar do que aconteceu outrora.

Certas palavras às vezes não devem ser ditas, devem ser guardadas nas profundezas do cérebro. Palavras são vidas, ao proferi-las, pode salvar ou desmoronar. Disse demais, pensou alto. Falou coisas de forma que atirou brutalmente o coração do seu pobre e belo amado. Ela não sabia bem o que estava fazendo. Não gostou do que foi dito por ele e falou, falou e falou. Sem pausas. Atirando-as no ar, onde ficaram. O mundo se desmoronou diante dos dois. Primeiro fim.

O tempo não curou. Afinal,o copo quebrado consegue voltar ao seu estado anterior? Suas feridas ainda estavam lá. Duas almas que se amam, porém não podiam ficar juntas devido as diferenças antes não vistas. Segundo fim.

Ele que voltou a falar com ela. Surpresa! Ficou a esperar por um bom tempo. Ela só mandou algumas mensagens em relação ao Enem, do qual ele iria prestar, mas nada de saber como ele estava ou pedir a volta para os seus braços. O orgulho venceu por um ano e isso foi guardado por ele. Terceiro fim.

A sua volta aproximou os dois corpos. Como era lindo ver dois corações puros juntos. Via o brilho daquele amor. No mundo em que vivemos raro ver dois pombinhos daquela forma. Todos querem apenas uma coisa, nada de longa data. Mas ali se via duas pessoas que se amavam, mas não juntas. Eles não voltaram, apenas ficaram recordando a chama daquela paixão que um dia e ainda incendiava aqueles que não iam mais voltar. Estava certo. O tchau não era um até logo para a volta, era sim... outro fim.

Era fina a esperança. Na verdade, ela já sabia como todo o acabado ia acabar. A intuição é um sentido forte das mulheres, elas precisam ouvir mais. Por mais que desejava, por mais que agisse, por mais que mudasse, de nada adiantaria. Ela estava só correndo atrás do vento e sabia disso. Por que então continuar a fazer isso? Por que buscar algo que não pode ser mais encontrado? Ela sabia, sim sabia de tudo, mas não aceitava. Até que enfim se declarou mais uma vez, acho que ali sim, foi a sua última esperança. Instigando um ponto final dos grandes. Demorou-se a resposta. Ela soube, se não respondesse logo, tudo que havia sentindo, tudo que estava a pensar se concretizava. Feito. Acabou-se. Por fim ele decidiu, disse o que já era para ter acontecido há muito tempo: acabou, não quero você como a minha companheira. Falou-se de defeitos, usou isso como justificativa para a sua prolongada e demorada decisão. Orgulho, o cerne do término do fim? E ali, naquele ponto, o relacionamento acabou-se, afinal, ela deixou-o ir. Aceitou que nada mais, nada poderá uni-los, uma vez que escolhemos o nosso destino.

O vazio inundou o seu ser. O coração aceitou de bom grado o espaço que jamais será preenchido. Pois ali é habitado por um ser não presente, nem da alma, nem física e, principalmente, daquele amor que ele sentia por ela. Agora, era só ela que ainda sentia isso. E, mais uma vez decidiu, será dele, nada pode ocupar um amor que foi dado por pura vontade. Ninguém se esquece do que foi de suma importância, que fez mexer com as suas estruturas. Mexer com que não se era acreditado. Receber um amor que jamais havia ganhado. O amor que só havia imaginado no conto de príncipes. Foi isso, esse amor dela. Um sonho acordado, que foi vencido pelo orgulho.

Agora ela está novamente a representar o seu papel na sociedade e fazer o que o mundo quer dela, ao gosto dela. Só que é um pouco diferente. Ela sabe, com toda certeza e letras lidas por ela, nada mais acontecerá com a gente, viramos dois, viramos sóis. Assim toca a canção final.

Angélica Lago
Enviado por Angélica Lago em 24/11/2013
Reeditado em 08/11/2016
Código do texto: T4584916
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