Os olhos tristes de Judite

Ela era linda, feito uma boneca de porcelana em tamanho real, seu corpo era esguio e sua pele branca como as porcelanas de bonecas chinesas e sempre estava com um batom vermelho que lhe realçavam os lábios e a cor da pele. Mais o que mais me chamava atenção eram os seus olhos que eram redondos e pretos e o que me intrigava era que eles não brilhavam eram turvos e sempre tristes. Em uma ocasião eu lhe disse que seu olhar era triste e que isso me intrigava, tentando saber o que lhe causava tamanha tristeza. Mas foi em vão minha observação, quanto eu mais lhe perguntava mais em formato de concha ela se fechava. Não se abria, não discutia, não questionava mais eu também não entendia nada. Olhava atentamente como os outros lhe dominavam, e como ela sem nenhum esforço contrário permitia isso. O tempo passou para ela e ela nem notou, os olhos negros com olheiras se encontravam e a pele tão branca tinha agora rugas, marcas de expressão, ou melhor, dizendo de opressão. Os lábios carnudos pintando de vermelho agora eram escassos, não lhe caia bem na sua idade eram o que diziam. Mais havia uma coisa que não havia mudado, a tristeza em seus olhos continuava e o preto opaco também. Uma vez lhe perguntei ousadamente se já havia amado alguém, ela ergueu suas grossas sobrancelhas e sorrio com olhar, sem nada dizer. Eu entendi que era um sim, e não me contive perguntei se esse homem que ela havia amado a havia amado também. O seu olhar ficou turvo e ela chorou, foi a primeira vez que a havia visto chorar.

Meu coração partiu naquele momento e não pude mais ficar em paz, eu estava envolvida demais com ela e com o seu olhar e com o seu silêncio e com as suas lágrimas, ela havia entrado em mim e não conseguia mais retira-la. Apenas chorei como ela, dessa vez sozinha, me sentia mais a vontade para chorar assim. No dia seguinte corri ao seu encontro e voltei a lhe falar de amor, ela em um gesto rápido me deu um pequeno caderno com folhas amareladas, e com letras tão bonitas que pareciam ter sido desenhadas uma a uma com a paciência de alguém que ama. Abrir em um trecho que se remetia à muito tempo atrás e encontrei um verso de amor doce e radiante e tinha o seu nome no final da folha. Não compreendi então o que acontecia, como podia alguém que fazia versos tão doces ter os olhos tão tristes? Não contive e comecei a devorar as páginas daquele caderno em busca de repostas, notei que estava cheia de sentimentos e ala aquela manhã um pouco mais melancólica do que o normal. Descobrir o seu amor e a sua vida, descobrir todas as dúvidas e todas as novas esperas pelas cartas de amor, ele tinha nome estrangeiro, e morava em terra estrangeira também, mais sabia muito bem o português e escrevia lindos poemas de amor. Ele estava perdidamente apaixonado por ela e não havia nada que ele não fizesse para tê-la em seus braços. Em determinado trecho de uma carta sua implorava que ela aceitasse a sua visita, e que sua ausência o machucava e o enlouquecia. Ela apenas respondeu que não podia que não tinha permissão.

Em uma de suas poesias ela tenta justificar a sua fraqueza, dizendo que ele nunca entenderia que por ama-lo, ela se afastava e preferia que ele fizesse o mesmo. Que a guardasse na lembrança que nunca a esquecesse. Como não tinha permissão? Nesse momento eu me perguntava. Lá se permite amar ou ser amada? Mais o fato que alguém a havia lhe tirado esse direito o direito, o direito de amar. Em outro trecho do caderno, encontro uma carta, pela data acho que foi a ultima que ele escreveu, e ele dizia com voz embargada. A seguinte frase que me fez entender: “Como pode Deus ser o culpado, amor é o que te ofereço e nada menos que isso, exigindo em troca apenas o mesmo amor, esse que arde em seu coração, se és capaz de enfrentar a situação me vou para bem longe, onde não possa mais ver o teu rosto e nem ler teus doces poemas. Era esse o fim ele se foi para nunca mais voltar.

Ele não sabe mais levou com ele tudo o que ela tinha, o brilho dos olhos que ele descrevera em poemas anteriores o sorriso tímido sempre presente. E eu havia entendido o peso do mundo que Judite carregava, pela primeira vez havia entendido, não a condenava, ela havia sido covarde e por isso penava. Eu nunca mais lhe fiz pergunta alguma sobre o ocorrido, como poderia essa tragédia ter acontecido, agora tudo se encaixava como em um quebra cabeça, agora eu entendia seus olhos tão tristes, eu entendia o seu tédio e melancolia, eu entendia as suas dores, eu entendia, eu apenas entendia.

Josy Souza
Enviado por Josy Souza em 24/01/2014
Código do texto: T4663552
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