APENAS UMA ESTRELA

Ele, homem maduro, experiente, vivido mas carente. A vida o levou a isto. Foram várias passagens pelos inícios e términos do amor. Mas nunca deixou de ser romântico e atento ao que ao seu redor se expunha. Homem de áries, signo forte segundo as especificações do zodíaco.
Suas habilidades na vida eram muitas. Mas o que mais o completava era a música. Ah! As canções de amor, como o tiravam do centro! Era emotivo com qualquer frase cantada bem construida. Não suportava o mal gosto, a coisa feita por obrigação ou encomenda. A inspiração era o principal que o motivava a cada vez mais se aproximar dos bons e talentosos artistas fossem de quais áreas da arte. Para alguns parecia arrogante pela sinceridade ao dizer com veemência sua opinião sobre as coisas ruins que lhe afrontavam no dia a dia.
Seguiu seu caminho por muitos anos, pela estrada da arte. Ele criava canções, escrevia textos, poesias e se arriscava em artes plásticas, pouca coisa. Por não se considerar talentoso o suficiente para isto, escondia-se em seu próprio ego, para não mostrar ou sequer deixar transparecer, a quem quer que fosse, esse seu sub talento plástico. Mas tentava, pelo menos. Atitude de ariano obstinado.
Ele nunca desistiu de sua sorte. Sempre acreditava nela como possibilidade única de mudança de vida. Ainda que com idade mais avançada sentindo-se menino.
Sempre atualizado em relação a tudo o que viesse de novo em tecnologia, informática e modernidade em qualquer modalidade.
Consideráva-se um sortudo por ter conseguido atingir tantas pessoas com o sucesso de suas obras, algumas de grande êxito de mídia.
Ele seguia já um pouco cansado pelo tempo que passára fisicamente apesar de sua energia espiritual e criativa sempre ativa e com uma eterna pitada de adolescência.
Não se identificava muito com trabalhos, músicas, qualquer tipo de manifestação que fosse focada para os mais idosos. A vida pra ele já tinha passado sim, mas no seu intimo sentia-se uma pessoa jovem como qualquer no seu tempo atual de existência.
Então inesperadamente apaixonou-se! Inacreditável! Mas já com idade avançada apaixonou-se por alguém 20 anos mais nova! Ah! Como ela era perfeita! Ora! Diriam, qualquer mulher 20 anos mais nova é perfeita para um homem de 50 anos!
Mas não! Esta era perfeita pra ele e para todos os que a ladeavam. Ela brilhava como a mais bela das estrelas!
Ela era uma estrela! Cantora louvadora de Deus, que com seu talento a todos encantava. E mais a ele, que a tinha empiricamente apenas. Mas como criador a criava dentro de si feito a mais completa companheira para iluminar seus dias de solidão. Sim, ele vivia em solidão. Tinha filhos, neto, amigos, mas vivia em solidão. Por isso fez de sua estrela a mais brilhante pra seguir. Ele a queria como alimento de vida interior. Mas sofria por não tê-la fisicamente, apesar de serem vizinhos, tão próximos. Mas o seu amor por ela o afastou da felicidade e esperança unilateral e paixão. Ele escreveu muitas poesias, canções, textos , mas nada a comoveu a ponto de sentir a mesma admiração recebida. Mas ele não desistia de seu sonho de amor.
Certo dia deparou-se com a realidade cruel. Sua amada chegara acompanhada do companheiro.
Para aquele homem apaixonado isso foi como uma punhalada em seu coração! Jamais imaginava vê-la nos braços de outro. Tinha criado dentro de si, intimamente, um destino à felicidade, que certamente nele, sua paixão estava.
Mas não teve jeito! Foram dias, meses e meses e nada se transformara. Ela mantinha-se inatingível, preservando-se da volúpia de seu admirador nº 1.
O tempo foi passando e ele resolveu se afastar. Não fez também mais canções nem poesias. Seu coração já não tinha forças nem resistência para criar qualquer história nova que fosse, tendo sua amada como protagonista.
Ele sentira por tantas vezes o sal da lágrima nos lábios, a cada silêncio de noite inacabada. Não dormia, não conseguia. Extenuava-se num silêncio intimo que o cortava por dentro como se ali passasse a lâmina mais afiada do desprezo e desdém, sangrando suas vísceras. Sentia-se talhado na carne do coração, sem sua amada, agora sequer nos sonhos. Quando sonhava com ela como que realidade, vivia momentos inesqueciveis de amor.
Mas agora não. Já mais velho, deixado de lado pelos olhos da maioria dos que o viam pelas ruas da cidade, estabelecimentos públicos e jardins, ruas, avenidas, etc, era mais um no meio da multidão. A cada alvorecer agradecia a Deus por mais uma chance de estar vivo.
Abandonou todos os seus míseros sonhos de amor com sua amada estrela e distanciou-se da possibilidade de ser feliz novamente. Pois todos o viam com a idade que tinha e nunca com a energia que o mantinha lúcido, jovem e forte ainda, intimamente. Ele não acreditava mais que a felicidade voltaria a bater à sua porta.
Mudou-se de onde conhecera sua amada. E seguiu seu destino sem qualquer esperança alimentada.
Em sua nova casa, depois de algum tempo, em certa manhã, toca o interfone. Ele escuta de longe, como se fosse um simples tilintar nos ouvidos. Estava começando a acordar. Insistentemente o interfone continua a tocar. Ele acorda irritadiço com aquela insistência do zelador. Mas por fim resolve atender, entre bocêjos e esprequiçadas. Era um dia de sol. Lindo! Radiante! Eis que ao atender o interfone escuta:
— Olá! Lembra da minha voz? Sou eu, aquela que viajou pelos seus sonhos! Ele, estaticamente surpreso, tem uma breve reação de impaciência, mas se contém. — Ah! Oi! E ela diz: — Sabe, eu percebi que meu céu acinzentou e minha vida perdeu alegria quando não tive mais você próximo a mim. Não estou mais com aquele homem.Por isso vim procurá-lo. Você ainda me quer? Me perdoa?
Ele, mais que depressa pediu pra que ela subisse ao apartamento onde morava.
Ao ve-la chegar, novamente renasceu seu amor e paixão, num toque de mágica! Abraçaram-se, beijaram-se e se amaram como nunca, para um e para outro. Mas havia uma distância enorme entre seus destinos.
Mesmo juntos, ele tinha a consciência de que havia chegado atrasado na vida de sua amada estrela.
E o tempo passou. E a felicidade os envolveu. Tiveram uma filha. Era a família por ele tão sonhada completa.
Certo dia sua filha, com sua simplicidade de criança pergunta à mãe, com os olhos lacrimejantes:
— Mamãe! Estou vendo uma estrela diferente brilhar no céu! Ela anda e forma como que notas musicais no escuro infinito! A mulher vai ver o que sua filha diz. Então sente no fundo do seu coração que uma linda canção de amor se desenhava no espaço negro da noite. E ela cantou, como nunca antes cantara. Leu todas as notas, com sua voz incomparável e cristalina, sem titubear. E uma letra a acompanhou. Ela se emocionou juntamente com a filha inocente e pura. Sentou-se no chão da varanda e ali ficou observando toda a música se dissipar na noite. Levantou-se, colocou a filha para dormir. Ao chegar no quarto ali não estava seu homem. Apenas uma carta com os dizeres:
— "A música é a alma da vida". Que minha música alimente sua alma até a eternidade, meu amor. E nada mais escrito. Seu olhar lacrimejou-se.
Ele não suportaria ve-la com tanta distância, com idade tão avançada. Então preferiu deixá-la voar. Como a gaivota mais linda e livre, rasgando o vento e a vida que pela frente a esperava.
Os dias foram passando, passando, passando. E não mais se encontraram. Mas todas as noites estelares ali, no céu límpido, a mesma canção se repetia, se desenhava, entre flocos de nuvens ou caminhantes no vento.
E assim, para sempre ela o guardou no coração e na alma como lembrança plena de felicidade, juntamente com sua filha, pedacinho do céu. E ele, a música revelada no céu também, como lembrança de um tempo que nunca mais a ela seria permitido viver. Ela casou-se novamente. E foi feliz.
Às vezes seu marido perguntava: — O que você está olhando aí mulher? Toda noite, no céu? E ela respondia:
— Nada, amor! Apenas uma estrela... 
Uma estrela que nasceu pra iluminar nossas vidas.
Acalme-se que eu já vou.


Paulinho Camargo
SP110220141057TR