Nuvens estrangeiras

Devia ser outono, porque é sempre quando alguém reencontra alguém, assim como eu reencontrei Paula, uma menina ideal. Ela costumava guardar segredos, como quando dizia que algo nunca pode pertencer a algo por puro egoísmo próprio. Ou que o amor parte sempre mais forte de um único lado. Da última vez que nos encontramos eu vestido batia nas coxas e seu sorriso escondia a magreza do sofrimento. Nos despedimos naquele momento irreal, enquanto todo o resto do tempo era marcado por sofrimento, solidão e dor. Ou algo mais profundo que isso. Uma canção bonita limitava nossa divindade, quando eu disse que a precisava deixar. Na verdade não disse, mas foi como se dissesse. Ela me esperava só. O apartamento cheirava a camomila. Todas as roupas cheiravam a camomila. Ela me abraçou tão forte que senti meus ossos estalarem. Não sabia se era real. Ela precisava de mim tão desesperadamente que senti como se fosse meu instinto protetor predominando. Ela não se imaginaria um segundo se quer sem saber que posso entrar pela porta da frente a qualquer hora. Então ela se importa. E talvez eu me importe também.

Paula era uma pérola branca sem a qual eu nunca pude ter. Eu nunca poderia mostrá-la o fundo do mar. Desenhar um sorriso leve e carinhoso em seu rosto, ou que pudesse se passar por importante nesse instante.

Ela ainda me abraça da mesma forma. Não pode viver como um satélite. Mas não pode me culpar. Ela sabe que se eu ficar novamente, seria por tristeza, por ajuda... Ela sabe que eu não posso ficar, que não posso citar caridade. Essa palavra se enche de poeira. Frágil, se torna incomum dentro de mim. Sua pele branca se estende ao meu lado. Mas sabe que eu posso ir quando quiser.

Paula. A mulher que eu amei. Um dia estive só por tanto tempo. Que vivi vagando por ai tempo demais para me preocupar com o futuro. Que as coisas eram frágeis demais. Se tornam regras. Não continuam. Quando ela se vai, tudo fica cinza. Todas as memórias se esticam ao meu alcance. E eu sinto sua falta quando você se vai. Ela me pergunta nesse meio tempo se algo é real. Quando vou descobrir a verdade disso? - ela diz. Acho que perdi tempo demais construindo histórias sobre jardins podres. Por um tempo eu pensei ser oco, ser vazio. Alguém disse que eu devo viver o meu tempo. Dou de ombro. Só tenho encontrado respostas tácitas. Me vingo. Sou vingativo. Ela se tranca num mundo próprio. Ninguém sabe a nossa história. Ela diz que me ama.Não sinto amor. Sinto sua falta. E é isso que eu sinto. Estou vazio. Algumas pessoas que isso pode ser a síndrome do botão. Deixo de procurar por perguntas. Ou por respostas... Tanto faz.

Descanso nos seus olhos secos. Algo reside lá. Quando eu a conheci seus olhos verdes tinham rajadas de amarelo. Você se alimentou do meu amor como um pássaro. Comeu furtivamente meu espírito jovem. Ela, ainda mais jovem se sentia completa, enquanto eu enganava a mim mesmo. Agora sou uma nuvem estrangeira de Baudelaire. Não conheço nada. Sou por onde passo.

Yuri Santos
Enviado por Yuri Santos em 02/04/2014
Reeditado em 12/04/2014
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