Heterocromia

Eu nunca pude olhá-la nos olhos por mais de cinco segundos. Aqueles olhos tão frios e quentes, nunca soube diferenciar quando me congelavam de quando me queimavam. Ela sabia que tinha esta incrível habilidade de congelar e derreter qualquer um com o seu olhar.

O esquerdo era como o inferno. Seu olho esquerdo era acaju, da cor do pecado. Da cor do fogo que tanto me queimava sem que eu percebesse, que me atraía para o calor. Eu podia ver em seus olhos o fogo que ardia dentro de seu corpo, me atraindo e destruindo aos poucos. Esse olho sabia de todas as emoções que se passavam, e podia sentir todas elas. Ele podia fazer com que o ser mais racional e frio do universo se derretesse e sentisse o melhor e o pior tipo de emoção. O fogo das infinitas noites de prazer que ela me proporcionou, que talvez tenham existido apenas nos meus pensamentos.

O direito era frio. Tão frio e dolorido quanto mergulhar totalmente nu na água quase congelada. Seu olho direito era azul, mas não era um azul vivo... Era um azul congelado, fosco. Esse olho não tinha emoções e sabia como perfurar alguém. Ele sabia de todos os mistérios do universo e podia calcular qualquer movimento, qualquer ação ou consequência. Esse olho não errava nunca. Poderia servir pra cálculos construtivos, mas era muito melhor para os destrutivos. Ele não tinha emoção e era quase impossível permanecer admirando-o por mais de dois segundos.

- "Por que você nunca me olha nos olhos? Acha feio que sejam de cores diferentes?"

- "Não... - respondi sem graça - Na verdade eles são lindos. São especiais. Seus olhos são os mais lindos que já vi..."

- "Então me olhe nos olhos".

- "Não posso... - eu estava receoso e com medo - Eu ainda não aprendi a decifrá-los..."

- "Vamos, me olhe agora!"

Virei a cabeça lentamente e nossos olhos se encontraram. Novamente tive a estranha sensação de que meus pés não tocavam mais o chão. Estariam me queimando ou me congelando?

Seus olhos são os mais lindos que já vi em toda a minha vida... Ou seriam os mais estranhos? Talvez os mais diabólicos... A única certeza que tenho é a de que nunca conseguirei decifrá-los.