DESENCONTRO

Uma breve e triste história de amor...

Camille aguardava ansiosa o encontro com Rodrigo.

Ele a conheceu numa época pós Segunda Guerra.

Ela viera refugiada para Lisboa. Uma zona neutra da Europa, naqueles dias de conflito mundial.

Camille embora francesa, falava muito bem o português, porque seus avós eram portugueses e foi criada usando os dois idiomas.

Rodrigo era de Cascais. Mas vivia em Lisboa desde que se entendia por gente.

Ele a seguiu certo dia, achando-a muito bonita.

Camille acabava de sair de um pequeno café, onde se dividia espaço com uma livraria. Um lugar bem acolhedor.

Como Rodrigo era um conquistador de primeira, logo se aproximou da bela moça.

Ofereceu-lhe um cigarro. Um hábito muito comum naqueles tempos, entre anos 40 e 60.

O cigarro era como um símbolo de poder, sensualidade e até mesmo liberdade. Os anúncios contribuíam muito para essa imagem, criada para vender e encher os pulmões das pessoas de nicotina e alcatrão.

Ela recusou, mas agradeceu. Disse que tinha cigarrilhas e sacou uma de sua bolsa. Chovia muito. Ela esperava um carro de aluguel ( termo usado para os táxis ) para voltar ao quartinho com banheiro e pequena cozinha que alugara há poucos dias.

Ele continuava a puxar conversa mas em dado momento, Camille virou-se e disse:

_ O senhor ainda não entendeu que estou interessada em sair dessa chuva o mais rápido possível e voltar para casa? Não sou dada à conversas com estranhos.

_ Desculpe-me senhorita. Estou sendo inconveniente? Pode pelo menos dizer o nome de tão impetuosa moça, para que guarde em minha mente, o sabor de repeti-lo?

Ela riu meio sem jeito. Era um homem insistente mesmo... e reparando melhor: atraente!

Pensou Camille.

_ Bem acho que saber meu nome, não vai fazer mal: Sou Camille Tissou.

Apertaram as mãos ao mesmo tempo que ele se apresentava:

_ Sou Rodrigo Fernandes Magalhães, aos seu dispor, senhorita Tissou.

_ Os portugueses gostam mesmo de abordar moças pela rua?

_ Nem sempre... Gostei de você, se me permite dizer. Mas fala bem minha língua, aprendeu aqui mesmo?

_ Oh, não. Meus avós maternos me ensinaram, viveram na França muito tempo.

_ Ah, sim, que ótimo para mim.

_ Para o senhor?

Camille fingiu não entender o que havia naquilo.

_ Mas claro! Facilita nossa comunicação...

Eles riram juntos. O táxi finalmente chegou, ela entrou e Rodrigo ficou olhando a moça partir. Ela olhava pelo vidro do carro, molhado de chuva, reparando no olhar que ele deixava...

Dois dias depois se reencontraram por acaso. Uma semana depois, também. Camille começou a achar que o destino os aproximara.

Ele já não achava: Tinha certeza!

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Camille e Rodrigo em um mês começaram a se encontrar regularmente e como não poderia deixar de ser, mostraram-se apaixonados.

Ele a levou do quitinete recém alugado, para seu apartamento. Um romance que parecia escrito nas estrelas, era esse o pensamento de ambos, então...

Uma fatalidade veio a destruir a forte ligação que eles tinham, um ano depois:

Certa tarde, quando estavam passeando, um vagabundo esbarrou no casal que vinha distraído. Uma lâmina afiada, cortou o abdômen de Rodrigo. Camille o segurou instintivamente em seus braços, enquanto o homem sujo e degenerado, levava sua bolsa e puxava seus brincos de esmeralda, que apenas dois dias atrás, ganhara de presente do seu companheiro.

Ele caía e Camille não conseguia sustentar seu peso. Gritou por socorro desesperada...

Algumas pessoas chamaram uma ambulância para socorrê-lo e a polícia para encontrar o vagabundo.

Mas o bandido, já se ia bem longe dali, tal qual havia chegado sem ninguém perceber.

As coisas do mal são geralmente assim: encobertas pelo nevoeiro que as deixam escondidas.

Um dia entretanto, que pode até demorar, mas o Bem prevalecerá e esses párias da sociedade terão seu castigo.

A faca estava contaminada com alguma bactéria que o vagabundo por não lavá-la, vivendo na sujeira, deixou ficar. Quatro dias depois do acontecido, a hemorragia que antes era a prioridade dos médicos para salvar a vida de Rodrigo, passou a ser nada, perante a tal bactéria que instalou-se em seu organismo, numa época que apenas a penicilina recém descoberta em fevereiro de 1941, era o único antibiótico existente. Infelizmente, não se aplicava ao caso dele...

Durante esses dias em que Rodrigo agonizava no hospital, Camille sempre ao lado de seu leito, definhava a olhos vistos. As olheiras profundas das noites em claro, davam um tom fúnebre ao seu rosto, já tão pálido...

Uma semana, foi o prazo que os médicos deram para ela, em relação à expectativa de vida para Rodrigo.

Ela se recolheu em oração na esperança de que um milagre acontecesse... Mas as coisas da vida e da morte só ao Criador pertence! Antes desse prazo terminar, ele faleceu.

Camille, tomada de profunda angústia ao ouvir do médico que ele estava morto, tirou os sapatos dos pés e correu desenfreada do hospital, ganhando as ruas.

Corria... A chuva subitamente surgiu, da mesma forma que no dia em que tinham se conhecido, um ano antes.

Ela continuava a correr chorando, como se isso a levasse a um refúgio dentro de si mesma.

Até que um carro, dirigido por um motorista embriagado, também a levou desse mundo.

Foi apenas um momento, para que o veículo a jogasse longe, batendo com a cabeça no meio fio e destroçando seu crânio.

Esse foi o fim de um linda e breve história de amor, em Lisboa.

Entretanto, agora, duas almas de mãos dadas, estão em algum lugar, bem distante do orbe terrestre...

Fátima Abreu Fatuquinha

Fátima Abreu Fatuquinha
Enviado por Fátima Abreu Fatuquinha em 30/06/2015
Reeditado em 30/06/2015
Código do texto: T5295286
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