De volta para casa

Havia, há um tempo, um homem sábio e veterano de guerra, um militar aposentado. Após terminar algumas “estadas” no campo de batalha, trouxe consigo algumas lembranças marcadas para todo sempre, em sua pele. O que manteve seu coração forte e prudente foram seus temores. Sua mulher, que estava grávida de gêmeos. Sua mente não se desconectava da visão dela sumindo aos poucos, em prantos, no horizonte e na larga poeira deixada para trás do carro camuflado, um véu do desespero.

Ao ser recrutado pelo exercito, este jovem rapaz, naquele tempo, tinha apenas vinte e cinco anos de idade, vívido, sorridente e com o brilho extraordinário nos olhos, adjetivos estes que foram tomados pelos quinze anos subsequentes a sua entrada, quinze aniversários perdidos, quinze comemorações do dia das crianças, quinze comemorações do dia dos namorados, aniversários de casamento, viradas de ano...

Moravam em uma fazenda no interior de Chicago. Sua partida foi algo assolador para sua mulher, que logo ficou desnorteada, não sabia por onde começar com uma fazenda particularmente grande. Os dois jovens ficaram sem sorte. Sentiam-se como um ser capaz de perder suas funções de uma só vez, o tato, paladar, olfato, visão, movimentos das mãos, dedos, braço, pescoço, a capacidade de movimentar as pernas e os pés.

Um precisava do outro como um recém-nascido precisa da mãe. No primeiro mês, apenas lágrimas silenciosas, na incerteza que reveria seu par. Todos os recrutas pareciam entender essa linguagem tão gritante na face de cada um. Alguns se mantêm nesse estado devido a família, outros por estudos, eram vários os motivos, cada qual tinha o seu.

Todos passavam acontecimentos desumanos e maldosos naqueles campos de confronto, alguns tiveram que dizer adeus antes do tempo, porém todos aprenderam muito com a carnificina que é a guerra, muitos aprenderam a dar valor a comida que tinha em casa, a casa em si, suas roupas sempre bem passadas e limpas, o chuveiro quente e a antiga vida que antecedeu a qual tinham agora. Lutando por algo que os países acham ser certos, finalizando vidas por algo que os países impõem ser certo.

Após o conflito, os sobreviventes, nomeados heróis de guerra - se realmente pode se chamar de herói aquele que fere por sua própria sobrevivência-, foram recebidos com celebrações e ceias fartas.

Sua mulher ouviu aflita o roncar do automóvel, por não receber cartas do marido por cinco anos, já esperava pelo pior. Mas quando avistou aquele homem com o rosto familiar que deixou a família ainda muito jovem, ali na sua frente, ela não conteve suas emoções e nem ele, choraram alto, abraçados e beijaram-se como se fosse a primeira vez, aos soluços ele disse que pensou que iria encontrar um outro homem na casa quando chegasse, ela por sua vez com lágrimas quentes em seu sorriso largo, rebateu “Como poderia deixa-lo se amo-te tanto?”.

As crianças ouvindo o choro de duas vozes e uma delas de sua mãe, desceram para averiguar o que estava acontecendo. O homem paralisou, sua mãe desfez o abraço, aproximando-se das crianças abaixou-se dizendo para conhecer o pai delas. Houve pranto de felicidades de todas as partes, alívio e de paz, até mesmo os outros soldados comoveram-se ao ver aquela cena e logo se despediram, pois a viagem para os outros ainda continuava. Ao anoitecer aquela família, estava reunida, foram extremamente animada, todos se divertiam muito.

Na manhã seguinte ainda na cama, sua mulher comentou que sua filha estava conhecendo um rapaz mais velho e que já estava falando em namoro, ambos ficaram pensativos sem saber como prosseguir o diálogo, por fim ele acalmou-a dizendo que conversaria com os dois depois do almoço. Permaneceram na cama por mais alguns instantes e levantaram.

Enquanto sua mulher estava fazendo o café matinal ele foi caminhar pela fazenda, para clarear a mente e respirar um pouco de ar puro. Passou pela plantação de banana, maça, do outro lado um vinhedo, observou atentamente as mudanças claras das plantas que um dia, foi destruído pelo exército.

Passou por uma ponte pequena acima de um riacho que podia se ver a fartura de peixes saltando em sua superfície. Andou por aproximadamente trinta minutos quando exclamou bem alto: “Perfeito! Aqui é o lugar perfeito”, ele estava em frente plantação de amendoim na qual pretendia levar seus filhos para uma breve palavra de conselhos. Apressou seus passos para voltar a casa, onde provavelmente, todos estavam a sua espera para o café do alvorecer.

Chegando a casa viu que todos o aguardavam, ele entrou desculpando-se e logo foi posicionando para sentar-se. Agradeceram uns os outros pelo alimento e também pela natureza e ao seu Superior. Todos comeram e pela reação, estava mesmo gostoso. Ao terminar o pai das crianças pediu para que elas fossem escovar os dentes que gostaria de mostrar um lugar especial na fazenda. Esboçando dúvidas, mas concordaram e subiram para o banheiro. Sua mulher não disse nada e nem questionou, tinha certeza do que se tratava, pois ela tinha certeza que seus filhos conhecem canto a canto da fazenda, pois foram - e ainda é - seus filhos que ajudam a manter em ordem os afazeres diários.

Com um sorriso de lado falou a sua esposa que não deveria se preocupar que dessa vez não pegaria pesado, ambos sorriram e os dois se beijam dizendo como em um coral “Eu amo-te, senti tanto sua falta”, e se abraçaram e ficaram assim até seus filhos interromperem dizendo que já estavam preparados para ir.

Ao levantar, olhando seus filhos por um momento jurava ver sua versão infantil masculina e feminina, sorriu ao pensar assim.

Fez sinal com a cabeça para que as crianças o seguissem e virou-se para a porta de saída. Não demoravam muito e já estavam em frente á aquela linda plantação de amendoins grande e farta.

Olhando em direção as crianças, disse que já haviam chegado e pediu para que se aproximassem e observassem aquele terreno.

Todos olhavam atentamente o local e perceberam variações na regularidade e na uniformidade das mudinhas que ali cresciam. Perceberam que havia plantinhas secas, espaço faltando, umas maiores outras menores, umas espalhadas outras agrupadas, algumas em um canto bonito com flores e outras exóticas, e algumas em um canto feio com plantas espinhosas misturadas. Falaram os filhos que naquele pedaço de chão o amendoinzeiro não estavam desenvolvendo bem, provavelmente devido ao solo.

Por sua vez o pai iniciou a explicação dizendo que a vida se comparava a aquele pedaço de terreno e que os amendoins se comparavam a uma mina terrestre.

“Cada mina representa perigo, mas também a vitória e o amor. Em algum momento da sua vida irá se aventurar nesse campo minado e ao fazer essa escolha deve-se estar ciente que ao pisar propositalmente em uma dessas minas os resultados serão óbvios, são três delas: a primeira é que te destrói. A segunda que deixa grave sequelas; e a terceira que pode não explodir. A porcentagem de a mina explodir é de setenta e sete por cento, que representa um número bem grande. Mas como se pode diferenciar uma mina da outra? Simplesmente não se pode. Para saber você deverá pisar em uma mina de cada vez, sem se esquecer das três possibilidades. Essas minas estão espalhadas nesse campo em lugares bonitos ou medonhos, nas flores ou nos espinhos, em lugares com muitas e em lugares com poucas, com as mais vistosas ou não. A ação correspondente ao fato após pisar na mina representa o amor e este existe as três consequências: a que te abala; a que deixa graves sequelas e a que não lhe transmite mal algum, apenas lhe transmite paz, aceitação, harmonia, sinceridade, alegria, companheirismo, mutualismo, cumplicismo...

Meus filhos, quero mostrar as possibilidades que existem no amor. Cedo ou tarde vocês passaram por isso, mas caberá a cada um contornar cada uma dessas situações.

E a você minha pequena menina, quero que traga este jovem rapaz que te interessa para eu poder conhece em um jantar amanhã. Mas antes de tudo peço a você que confie em mim, em seu pai, tudo o que estiver ao meu alcance eu farei, por vocês.”

Voltaram para casa, sentaram os quatro na sala e conversaram amigavelmente até o dia seguinte, no jantar especialmente preparado para aquele momento, onde tiveram uma longa conversa, por fim aquele velho soldado aceitou a proposta do rapaz em namorar sua filha.