O Presente da Poetisa

Eu havia trabalhado duro nele, durante vários dias. Queria que tudo estivesse perfeito. Segundo meus cálculos atrapalhados, hoje seria o aniversário dele. E, só porque sempre fui muito ruim com datas, não significava que não estava me esforçando ao máximo para que fosse um dia especial. De preferência, o mais especial de todos, já que era o primeiro aniversário dele que passávamos juntos. (Ou, pelo menos, espero sinceramente não ter deixado passar nenhum).

Então, peguei o papel na mão, implorando a todos os deuses de que me lembrava para que não deixassem que o suor em minhas mãos o manchasse, e caminhei pelo corredor até o quarto dele. (Nosso quarto! A ideia ainda parecia tão maravilhosamente estranha que eu precisava me acostumar a ela). Abri a porta com o máximo de discrição que pude reunir - o que, convenhamos, não era muita - e sorri ao constatar que ele ainda estava lá, abotoando sua camisa social, com uma significativa porção de pele bronzeada visível. Quando ouviu o barulho da porta, virou-se e deu de cara comigo, lançando-me um olhar estranho, já que eu não havia dormido em nosso quarto.

- Onde você estava? - perguntou, com certo grau de desconfiança preenchendo seus belos olhos escuros.

- Desculpe por não ter avisado. Queria fazer uma surpresa. Acabei passando a noite debruçada sobre a mesa da sala, trabalhando nisso. - assolada pelo nervosismo e incapaz de prolongar aquele momento, estendi o papel levemente suado na direção dele, desejando mais uma vez não ter errado a data. - Escrevi para você. Feliz Aniversário!

Curioso, ele pegou o papel que lhe ofereci e se pôs a percorrer com os olhos as linhas escritas à mão. Meu estômago dançava em algum ritmo frenético enquanto ele lia, e o tempo distorcido fazia parecer que estava lendo uma interminável enciclopédia médica ao invés das seis estrofes românticas de quatro versos cada que eu riscara e rabiscara infinitas vezes ao longo da última semana. Por fim, ele concluiu a leitura e ergueu os olhos com uma expressão que eu nunca vira antes. Uma expressão que minha insegurança logo interpretou como constrangimento.

- E então? - indaguei com a garganta seca - O que achou?

- Eu... - ele hesitou, como se não conseguisse encontrar as palavras certas - É maravilhoso! Eu adorei. Ninguém... - ele hesitou outra vez e eu finalmente consegui identificar corretamente a expressão em seu rosto: era emoção, emoção genuína. - Ninguém jamais escreveu um poema para mim antes.

Meu coração deu um salto desvairado e tentou pular para fora do peito. Meus olhos estavam lacrimejando, e minha mente só conseguia pensar em uma coisa. "Eu consegui! Consegui dar a ele alguma coisa que ninguém jamais fora capaz de dar antes de mim".

Antes que eu comece a soar maníaca, deixe-me explicar. Eu sou uma poetisa. Não por profissão, não por escolha, simplesmente porque eu nasci assim. Do mesmo jeito que nasci com olhos verde-azulados e cabelos loiros meio ondulados, e ninguém pode tirar isso de mim, nasci poetisa. Isso significa que enxergo o mundo de forma diferente. Onde outras pessoas veem um mísero grão de areia, eu vejo um sentimento especial, enorme e prestes a explodir em cores para todo mundo ver. Não sorrio pela metade, não choro pela metade e, certamente, não amo pela metade. O amor que sinto é algo tão intenso e envolvente, que sinto que vou explodir em milhares de pedacinhos se não for capaz de demonstrar a ele a imensidão desse amor.

Ele. O amor da minha vida. Não estamos juntos há tanto tempo, mas é o suficiente para saber que nunca antes senti e nunca mais sentirei algo como o que sinto por ele. É difícil pôr em palavras, por isso passei tanto tempo trabalhando naquele poema. Para que ele saiba que, independente da intensidade ou da forma como ele me ama, os sentimentos descritos naqueles versos são dedicados a ele, e só a ele.

Meu amado é um homem bonito, experiente, bem-sucedido e gentil acima da média. Sei que muitas mulheres já o amaram, o beijaram, o abraçaram com carinho e sussurraram palavras de desejo em seu ouvido. Não pude ser a primeira em nenhuma dessas coisas, não era a hora de nossos caminhos se cruzarem ainda. Mas pude ser a primeira (a única, seria pedir demais?) a imortalizar nosso amor em forma de versos.

- Você já escreveu poemas para outras pessoas? - minhas divagações foram interrompidas por uma complicada pergunta. Eu tinha quase certeza de que ele já sabia a resposta, mas isso não tornava a situação nem um pouco mais fácil.

- Meu amor, você sabe que sim. Eu escrevi sobre todas as pessoas que já foram importantes na minha vida. É como um instinto, não posso evitar. - apesar da relutância em seu rosto, dei um passo para a frente e segurei sua mão. - Mas ninguém jamais me inspirou tanto quanto você.

Ele não me afastou. Pelo contrário, puxou-me para mais perto de si, num daqueles abraços indescritíveis que fazem aquela velha frase "você é o meu mundo" parecer muito mais com uma verdade e muito menos com um clichê.

- Eu te amo. - ele disse, sua mão passeando gentilmente sobre meu rosto. - Não saberia colocar isso em um poema, mas eu te amo. E vou reler o poema que você me deu até decorá-lo, até adormecer toda noite pensando naqueles versos. - aproximando seu rosto do meu e sussurrando docemente em meu ouvido, acrescentou - Obrigado. Esse foi o melhor aniversário de todos.

- Também te amo. - foi tudo o que consegui dizer antes que seus lábios tocassem os meus, primeiro devagar, num agradecimento, depois mais rápido, com desejo. Ele me puxou para a cama, amassando completamente a camisa que pretendia usar para trabalhar. Não que ele fosse precisar dela nos próximos minutos, de qualquer forma.

O papel que dei a ele se perdeu em meio aos lençóis e peças de roupa enquanto trocávamos beijos e carícias. Não importava. O encontraríamos novamente mais tarde. Naquele momento, éramos poesia viva. Amor é poesia, independente de estar ou não em versos.

E nunca mais esqueci o dia do seu aniversário.