Estranho pássaro verde

Depois de cinco dias sem me comunicar com Lucas, já não via mais motivos para uma revolução. Estou sentado no café do edifício Candido Mendez, no Centro desta cidade. Aqui se sente o cheio de todo o cardápio, e os jovens já não se sentem mais sozinho. Faz quase vinte e quatro minutos que sinto a respiração de alguém me tocar a nuca. Me viro. No balcão tem um homem loiro, e que provavelmente tem a altura menor que a minha. Seus olhos azuis parecem perfeitas pedras de gelo. Ele sorri. Devolvo o sorrido e me viro para continuar pensando que Lucas desistiu de vir aqui me procurar.

Sinto as vibrações dos passos que se aproximam. O homem loiro se aproxima, pergunta se podemos dividir a mesa, em seguida pergunta se estou em dúvida no que pedir ou se estou esperando alguém. Sorrio. Olho a forma como ele dobra as mangas da camisa, e penso como é engraçado o modo como ele fala, porque a boca se mexe como se quisesse mostrar seus dentes excessivamente brancos. Penso também, que não deve fumar, ou beber café com tanta frequência. Penso em trezentas coisas por segundo, e todas elas é como o homem loiro é. Finalmente ele se apresenta, Fábio, ele diz. Digo o meu nome.

Nesses dias perigosos eu preciso chegar um pouco mais perto, sentir a faísca, eu preciso sentir algum tipo de conexão com as coisas, matar as coisas que amamos dentro de nós. Mas nada queima como o vento. E mesmo que ainda estejamos confusos, ainda sentimos a dor pela manhã. O peso do mundo, algo real. E sozinho nós estávamos.

Não quero ser enfraquecido à extinção, ele diz. Não entendo o que veio antes disso, ou não estou dando a devida atenção. Mas ele ainda está aqui, como o gestor de finanças públicas que ele. Agora comenta sobre o curso de teatro que faz, tem trinta e um anos, um homem muito bonito, penso. Ele toca a minha mão. Sorri. Pede outro café e continua com a conversa. Diz como foi difícil terminar o curso de arquivologia na UNIRIO morando em Guaratiba, mas que agora, no Leme, a vida não deixou de ser agitada. Ainda tenho sonhos, ele disse. Eu sorria e comentava sobre pequenos pontos da minha vida.

Você joga vôlei no Leme, certo? Já te vi algumas vezes enquanto passava pela praia - ele disse. Confirmei dizendo que jogos quarta pela manhã, já que tenho esse período vago. Ele dizo quanto é engraçado me encontrar naquele café, já que todas as vezes que me via pensaca ser a última, mas que hoje, aqui, decidiu iniciar um encontro.

Já era final de tarde quando me precisei voltar ao trabalho. Ele pediu meu número, passei. Vamos tomar outro café qualquer dia com mais calma, ele disse. Claro! - eu disse - nos abraçamos, nos olhamos, o perfume dele tem um aroma tranquilo. Disse que estou cheiroso, apesar da minha blusa faltar um botão. Ri. Nós nos olhamos. Acho que estou nervoso.

Duas horas se passaram desde quando encontrei aquele homem loiro de olhos cor de gelo. Seu abraço forte ainda está quente em no meu corpo. Pego minhas coisas, tranco a porta do escritório, desço no elevador, e ao chegar na Avenida Rio Branco o encontro novamente. Ele sorri, diz que seria bom se o motorista atrasasse o ônibus, já que provavelmente iríamos pegar o mesmo, mas que o período de tempo de viagem é curto. No meio de uma frase comento sobre o abraço que ele me ofertou mais cedo, me enrolo com as palavras, ele percebe. Provavelmente depois disso deixamos passar alguns ônibus. Não me importo. Estamos aqui, como dois pássaros estranhos.

Yuri Santos
Enviado por Yuri Santos em 14/09/2016
Reeditado em 15/09/2016
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