O perigo num olhar

Era uma manhã comum de quinta-feira que se tornou palco de algo totalmente inesperado. Eu e amigos de classe andávamos entre um bloco e outro da universidade. Em frente ao prédio da nossa próxima aula, por um momento, percebi um par de olhos a me fitarem fixamente nos meus. Era ele!

Vestia rosa, bermuda e mochila nas costas assim como eu. Não reparei nos sapatos. O conjunto do look tinha a discrição costumeira. O semblante era o de alguém cansado, mas justamente esse sempre foi o seu charme.

Minha reação involutária foi um imenso sorriso. Talvez o mais natural em um longo espaço de tempo. A visão dele ali, perceber que me olhava, tudo isso atropelou com um rolo compressor a lembrança sobre como foi difícil seguir em frente depois que terminamos nossa relação. Um abraço que durou uma eternidade selou esse reencontro.

Tive medo. Tive muito medo. Quis largá-lo pela metade mas, pra minha surpresa, ele não me soltou. Logo ele que raramente demonstra carinho em público agora fazia questão de me segurar para matar uma possível saudade que, imagino (ou desejo) eu, estava sentindo naquele momento.

Foram cinco minutos de amenidades, atualizações necessárias sobre as nossas vidas. O mestrado que terminou, a irmã que se separou, o sobrinho que cresceu, o uber que vai chegar em minutos. Nossa despedida teve mais um abraço e um beijo no rosto.

E depois daquele meteoro, o restante da minha manhã seguiu com a energia, digamos assim, bagunçada por inteiro. Meu fim de semana acaba de terminar e eu finalmente me dou conta de como aquela quinta-feira me desorientou.

São seis anos desde o fim e ainda tenho efeitos colaterais abobalhantes a cada vez que o vejo. Desisti de marcar uma data no calendário para que isso pudesse deixar de acontecer. Agora simplesmente vivo e peito as consequências quando a situação acontece. E olha que já aconteceram algumas vezes.

Quando duas pessoas se amam e mesmo assim decidem terminar um relacionamento, sabe para onde vai o amor? Pra canto nenhum. Ele continua ali na sua psiquê. Dá só uma mudadinha de lugar. Sai de uma zona ciumenta e vai para um canto mais liberal do seu cérebro.

Você quer a felicidade do seu ex, se importa com ele, até se permite lembrar com saudade. Mas há desapego, afinal, ele não é mais seu. Reencontros assim são riscos que valem a pena de serem corridos.

Porque o sorriso de duas almas afins sempre ilumina o mais sombrio dos dias. Você só não pode esquecer que o passado é passado. É por lá que ele deve ficar: na sua lembrança, na sua história, no álbum de recordações. E se ele te dá frio na barriga, isso é bom.

Aprenda com esse frio que o presente pode e deve ser mais quente.

;)

Assis Junior
Enviado por Assis Junior em 10/10/2016
Reeditado em 17/10/2016
Código do texto: T5786737
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