O ROUXINOL E O COLIBRI

No centro de uma grande cidade havia um horto conhecido por todos por sua beleza e pela paz que transmitia a todos que lá chegavam. Eram muitas as espécies de árvores, flores e animais. Era bonito ver a harmonia da natureza!

Dentre os animais do parque, os pássaros se destacavam. Seja por seu canto, seja pelas cores variadas, atraíam a atenção de todos que frequentavam aquele lugar. Eram todos nascidos ali e não conheciam outro lugar além do horto. Para eles, era muito bom estar ali.

Certo dia apareceu um colibri, que ninguém sabia ao certo de onde viera. Pequeno, delicado e tímido, não foi muito notado de início. Aos poucos, porém, foi se aproximando dos outros pássaros.

Percebera desde o início certa afinidade com um dos rouxinóis que viviam ali no horto. Com o passar do tempo, essa intuição foi se confirmando e tornaram-se muito próximos. Voavam juntos por entre as folhas das árvores, descansavam nos galhos do ipê florido e voltavam para junto dos demais.

Em um desses passeios, o colibri resolveu partilhar com o rouxinol algumas de suas experiências anteriores à sua chegada ao lugar onde viviam. Falou-lhe da beleza dos rios, da altura dos jequitibás, do perfume roseirais e de como era grandioso voar livremente por todos esses lugares. Disse-lhe também do quanto aprendera em cada lugar por onde passara e de como cada experiência havia feito dele um pássaro melhor.

O rouxinol revelou que não se sentia totalmente pleno onde sempre viveu, deparando-se sempre com os mesmos limites. Já pensara em sair para conhecer o novo que havia lá fora, mas todos diziam que longe dali era tudo muito perigoso. Foi nesse momento que compreenderam a afinidade que havia entre os dois e o que sentiram desde o primeiro encontro.

Os dois nunca tinham se sentido tão próximos como a partir daquele momento de mútua confidência. Os dois – o colibri com sua experiência e o rouxinol com seu desejo – sabiam que poderiam ser muito felizes voando por jardins ainda por descobrir, sentindo aromas inebriantes e enchendo os olhos de beleza. O colibri queria muito mostrar para seu novo amigo tudo o que havia encontrado em suas andanças e encontraria muito prazer nessa tarefa. O rouxinol encantava-se com a possibilidade de ir além.

No entanto, o rouxinol tinha medo. Medo de se decepcionar, de nunca mais voltar para seu lugar de origem, de ser desprezado por seus companheiros e terminar ficando perdido, sem um lugar de referência. Por isso não se entregou de imediato aos sonhos do colibri.

O tempo foi passando e o colibri sentiu que era o momento de partir. Seu tempo ali já havia se esgotado. Eis que chegara o momento de conhecer novos lugares e outros amigos. Sabia, contudo, que não era mais o mesmo. Sua amizade com aquele rouxinol havia transformado-o.

Dirigiu-se até onde estava o rouxinol brincando com seu canto exuberante e disse-lhe:

_ Tenho que partir! Se queres, podes vir comigo. Sei que no início será difícil para ti. Mas vamos no teu ritmo. Não teremos pressa. O sentimento que nos une fará com encontremos alegria mesmo em meio à dor. Seremos felizes se nos preocuparmos sempre com o bem do outro. Tens muito que conhecer. Vamos!

O rouxinol sentiu-se violentamente dividido. Estava diante dele a oportunidade de partir rumo à novidade, de viver aquilo que nunca conseguira viver e – quem sabe? – ser plenamente feliz. Mas era também uma escolha difícil. Havia gasto todos os seus dias naquele lugar. Não podia simplesmente abandonar tudo. O que os outros pássaros, seus companheiros, pensariam?

Foi movido por essa contradição que falou ao colibri:

_ Vês em que situação estás me colocando? Desejo muito aventurar-me contigo, mas não posso simplesmente pôr em risco tudo o que fiz até hoje. É muito difícil, para mim, escolher.

_ Meu amigo querido, viver é escolher! Essa situação não é exclusividade tua. Cabe a ti ter a coragem de escolher aquilo que teu coração pede, mesmo que pareça absurdo. Pensa na nossa amizade, no quanto seremos felizes...

O rouxinol sentia-se ainda mais confuso. O colibri haveria de partir no dia seguinte, ao nascer do sol. Os dois combinaram de se encontrar no local determinado para a sua partida.

Ainda havia esperança no coração do colibri. Sonhava com seu amigo chegando na manhã seguinte, pronto para iniciar a aventura.

No horário marcado, sob os primeiros raios de sol, lá estava o colibri. O rouxinol, esse não aparecera. Ele esperaria ainda algum tempo por seu amigo, até que um sabiá amigo disse-lhe que havia visto todos os rouxinóis voando para o outro extremo horto. Essa notícia foi a confirmação da escolha que o rouxinol havia feito. Era doído, mas era a realidade. Não havia mais o que fazer.

Partiu! Com o coração em pedaços, mas partiu! Do alto ainda pôde ouvir o canto dos rouxinóis e pensou: “Não irás comigo, certamente não irás. Mas cada vez que recordar teu canto, estarás em meu coração”. Lembrou então de uma canção que escutava quando filhote: “Amor de verdade é um apenas. Se a ele não nos entregamos , choremos nossas penas”.

Manoel Gomes Filho
Enviado por Manoel Gomes Filho em 31/12/2016
Reeditado em 31/12/2016
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