Tudo Por Um Beijo Seu

"Você não pode amar" essas foram as últimas palavras de minha mãe.

Nossa linhagem é amaldiçoada, só porque minha tataravó que morreu a milênios de anos atrás se negou a amar um cara, ele se achou no direito de amaldiçoar minha família.

Somos banshees, e o que para muitos é apenas uma lenda, é realmente real, ainda existimos e habitamos entre os mortais.

Nosso trabalho consiste em emitir ruídos que quebram até vidros de tão finos que são.

Toda vez que alguém da aldeia está prestes a morrer, uma de nós dá "O Grito",que seria o aviso do último dia de vida daquela pessoa.

E o porque de não podermos amar?, porque toda vez que isso acontece, nos gritamos e nosso amado falece.

Por isso apenas nos relacionamos com o intuito da reprodução, e nas últimas gerações minha linhagem sobrevive assim, sem amor, apenas interesse.

Mas acontece que eu estou ferrada, simplesmente ferrada.

Pois me apaixonei por Enzo, o filho de Maxon, descendente de Bartolomeu que jogara a maldição sob minha família.

Ele não sabe que o amo, se desconfiasse e por algum milagre retribuisse o sentimento, ele também estaria ferrado, pois morreria, a maldição só vale se o sentimento for recíproco.

Se minha tia descobrisse o que sinto e ainda mais por quem sinto, mandaria uma bruxa apagar minha memória.

Vivíamos em uma aldeia, uma pequena cidade onde apenas seres com algum tipo de magia ou descendentes de conhedores de tal viviam.

A familia de Enzo era feiticeira, mas ele não, era humano mas por ser filho de um bruxo vivia entre nós.

A minha família e a dele simplesmente se odiavam.

Se minha mãe soubesse que me apaixonei por ele, levantaria do túmulo e me estrangularia.

Ao pôr do sol haveria uma pequena comemoração, onde eu poderia observar Enzo a distância e imaginar um futuro que nunca teríamos juntos.

- Alícia? - minha tia chama mais tarde aquele dia.

- sim?

- já está pronta?

Aceno em concordância e rodopio em meu vestido florido, ao sair de casa, os últimos raios de sol dão um ar mais radiante ao meu cabelo vermelho, o vento gelado bate em meu rosto e tudo parece perfeito.

Minha tia caminha ao meu lado e quando escuto um resmungar mal humorado, sei que lá vem má notícia.

Sigo seu olhar e vejo Enzo e seu pai, lado a lado.

O que para ela era algo horrível para mim era uma coisa linda, poderia observa-lo por todo o dia, seus cabelos negros e olhos verdes que chamavam atenção até da alma mais desatenta.

Seu olhar encontra o meu e instantaneamente sinto me corar.

Seu olhar não é rápido, mas avalia cada parte de meu corpo de forma minuciosa. Não deixo de encara-lo, retribuo aquilo que eu sabia ser imensamente perigoso.

Mas não era como se ele tivesse algum sentimento por mim, era apenas uma troca de olhares.

Minha tia logo encontra uma amiga e me deixa sozinha na festa, o pai de Enzo se encanta com as comidas.

E Enzo vem em minha direção.

- Alicia não é? - ele diz sorridente.

- isso! - sorrio também.

- hum... Por acaso você me odeia como o resto de sua família?

- Não, eu sei que você não tem culpa de nada.

- fico feliz - ele diz.

- e por acaso você tem medo de mim? - pergunto.

Ele parece pensar sobre minha pergunta, era comum alguns homens terem medo das mulheres de minha família, afinal somos amaldiçoadas.

- claro que não - ele responde convicto.

- fico feliz também.

- hum, você tem namorado...Aly? - ele diz hesitante e retorna a falar:

- posso te chamar assim?

- Claro!, E sobre ter namorado, não tenho não, sabe como é...

Ele acena em concordância e diz brincalhão:

- sei que não te conheço muito bem, mas estou a seu dispor para preencher esse cargo.

Sinto me corar outra vez, mas rio com a brincadeira.

- eu não estou brincando - ele diz sedutor.

E derrepente uma música começa a tocar, casais se dirigem ao meio da festa, ele me estende a mão, convidando me a ir com ele, seguro-a e rodopiamos em meio a outros casais, alheios aos olhares acusatórios de nossas famílias.

Tudo pareceu perfeito aquele momento, Enzo com as mãos em minha cintura, uma música envolvente, um olhar sedutor, ele aproxima seus lábios dos meus, e eu não me afasto, beija me ali em meio a todos.

Mas ao me soltar, senti um sentimento forte no peito, e não era o amor que eu sentia por ele, mas sim outra coisa, que eu sabia muito bem o que era.

Separo os lábios como em câmera lenta, um ruido vai subindo do fundo de minha garganta e então o grito, o grito de uma banshee ecoa de minhas cordas vocais, ali no meio da festa, em meio a várias pessoas a me encarar, inclusive Enzo, com medo, horror...pois sabiam exatamente que alguém morreria hoje.

Copos de vidro se estilhaçam por todas as direções, várias pessoas tapam seus ouvidos devido ao impacto de meu grito, e Enzo que estava ao meu lado, cai inerte no chão.

Meu Deus que não seja ele.

Caio de joelhos, e sinto sua pulsação, ele estava vivo, mas não exatamente bem.

- Se afaste de meu filho, maldição! - diz Maxon, seu pai.

Estanco em meu lugar, Maxon se aproxima e me empurra.

- Não a trate assim - Enzo diz, ao levantar- se meio zonzo.

- você vai morrer meu filho, e a culpa é dela!

- não vou pai, deve ser outra pessoa - Enzo comenta.

- não vai não, a maldição não poderia ter o atingido,ele não esta apaixonado por mim. - digo em minha defesa.

- oh droga - Enzo solta.

- o que foi? - pergunto, com todos a nos encarar.

Ele segura meu braço e me puxa para longe da multidão, ao darmos as costas a festa volta a funcionar.

- eu esperava que você dissesse que você não está, assim a maldição não funcionaria. - ele diz.

- o que quer dizer com isso? - digo assustada e com medo da resposta.

- eu estou apaixonado por você Aly.

Entro em desespero, isso não poderia está acontecendo.

- M-mas c-como... Você me conhece a pouco tempo.

- mas te observo a muito tempo Aly, você me fascina.

- Droga Enzo, você está ferrado, porque eu também te amo.

- vou morrer - ele comenta, ainda com um sorriso nos lábios.

- como pode está calmo com isso? - digo sem entender.

Ele se aproxima, e com as mãos pousadas em meu rosto, deposita um beijo em meus lábios. Ao se distanciar diz:

- tudo por um beijo seu.

Minha tia nos encontra e me puxa para longe de seus braços, estragando aquele lindo momento.

- eu vou resolver isso. - ela diz seria, mas claramente furiosa.

- como? - pergunto cheia de esperanças.

- Cassandra, ela vai resolver.

- não... Por favor... Isso não. - digo cheia de medo.

- quer que ele morra? - ela diz seca.

E mesmo sabendo o terrível resultado daquilo, vou com ela, era o único jeito.

Abaixo a cabeça e digo tristemente:

- vamos...

***

Cassandra... A bruxa especializada em mentes e tudo relacionadas a ela.

Ela iria apagar minha memória sobre Enzo, apagando assim o sentimento que eu sentia por ele, mas eu sabia que não era assim tão simples, era muito além disso.

Apagar uma pessoa, uma pessoa importante de sua memória era algo complicado, era um sentimento forte que só obteria sucesso, com a total limpeza do cérebro, ele iria reiniciar, eu não lembraria de nada, talvez nem mesmo de meu nome...eu não seria eu mesma.

"Esse é o preço por você inventar de amar, agora lide com as consequências!" essas foram as palavras de minha tia.

- ora, ora, ora...mas o que vocês fazem aqui? - dizia Cassandra, a temida bruxa da aldeia.

- quero te pedir um favor - minha tia Amélia diz.

- sabe que não faço favores... - a bruxa diz direta.

- quero um acordo - Amélia corrige.

- assim está melhor, e o que seria? - ela diz sorridente.

- preciso que apague a memória de minha sobrinha.

A bruxa parece ponderar sobre o pedido e responde:

- se eu me importasse, perguntaria o porque, mas eu não me importo, então o que vai me dar em troca? - ela vai direto ao ponto.

- dinheiro? - Amélia pergunta.

- não... Isso é muito simples para um trabalho como esse, quero algo significativo para moça.

- O garoto - tia diz sem hesitar.

- NÃO....d-deixe ele fora dessa história. - imploro.

- ele já está nessa história Alícia, sabia no que estava se metendo ao se interessar por você, então também vai ter que pagar o preço.

- e o que você vai fazer com ele? - pergunto a bruxa.

- não irei mata-lo, essa é a única coisa que você precisa saber.

Então antes do dia acabar, antes que o aviso de que Enzo iria morrer se concretizasse, Cassandra prepara-me uma mistura de terrível cheiro e provável horrível gosto.

Tampo minhas narinas e engulo tudo de uma vez.

Sem despedidas, fecho os olhos e apago.

***

Abro os olhos atordoada, dois rostos desconhecidos me encaram com expectativa.

- como você se sente? - uma delas pergunta.

- um pouco zonza...quem são vocês?

- eu sou quem apagou sua memória - uma delas responde.

- e eu sou sua tia.

- O QUE? como assim apagou minha memória? - exclamo.

- vou te contar uma história garotinha.

A mulher de aparência horripilante, ao qual descobrir se chamar Cassandra, conta-me uma longa história sobre uma garota de linhagem antiga, que era impossibilitada de amar por conta de uma maldição, me conta também que um dia ela amou e por conta disso teve que apagar sua memória para que o jovem não sofresse danos.

- nossa, pobre garota - é tudo o que consigo dizer.

- ela é você garotinha...

Processo suas palavras e derrepente elas faziam total sentido.

- qual o nome dele? - pergunto, pois foi a primeira coisa que me veio em mente.

- para sua segurança e a dele é melhor você não saber.

***

Eu e a mulher que se dizia minha tia saímos daquele lugar sombrio, a tenda da bruxa.

Não trocamos nenhuma palavra, a mulher parecia ter raiva de mim, por um motivo até então desconhecido.

O sol já nascia quando paramos em uma casinha pequena mas de bela aparência, que eu desconfiava ser nossa casa.

Em frente a ela, um jovem de lindos olhos verdes me encara ansioso.

- Vá embora! - minha tia ordena para ele.

- não! - é tudo o que ele diz, vem em minha direção, segura meu braço e me leva para longe, e por algum motivo vou correndo junto com o total desconhecido.

Paramos em um local rodeado por árvores, com os primeiros raios do sol a refletir, estava tudo muito lindo, tanto como o jovem a minha frente.

- quem é você? - pergunto.

Uma expressão de surpresa surge em seu rosto, ele solta meus braços e vai se afastando.

- não acredito... É por isso que estou vivo... Como pôde fazer isso Aly?

Vou juntando as pecinhas, as coisas começavam a fazer sentido.

- qual é seu nome? - pergunto, mediante sua expressão de horror.

- Enzo - ele responde confuso.

- então é por você que me apaixonei.

- você se lembra? - ele diz cheio de esperanças.

- não, mas conheço a história - respondo secamente.

- e sabe... É melhor assim, para sua segurança. - continuo.

Havia mais do que tristeza em seu rosto, havia desilusão.

- eu só iria machucar você Enzo, vá embora.

- Não...- ele sussurra, mas eu o escuto.

- como assim não? - pergunto.

- eu amo você Aly, eu vou fazer você lembrar.

Então ele se aproxima, coloca uma mão em meu rosto e outra em minha cintura, me encara fixamente e me beija, deixando me sem reação.

Ao se afastar, me encara em expectativa como se o que acabará de fazer fosse mudar em algo.

Uma sombra surge próximo a nós, que logo cria forma e revela ser Cassandra.

- você está achando que isso é um conto de fadas garotinho? - a bruxa diz com um sorriso maquiavélico.

Enzo fica em silêncio encarando a bruxa em um misto de adoração e descrença.

- achou que um beijo a faria se lembrar? Hahaha - ela rir histericamente.

Enzo se afasta de mim e vai indo em direção a bruxa como se estivesse enfeitiçado.

- o que faz aqui? - pergunto,  quando Enzo fica de joelho aos seus pés.

- vim buscar meu pagamento - ela diz calmamente.

Aponta um dedo em direção ao queixo de Enzo, enfiando sua unha na carne dele, ele levanta e

quando estão cara a cara, cola seus lábios aos dele, dando lhe um beijo nojento.

Ao se afastar, Enzo parecia nada mais, nada menos que uma marionete.

- eu roubei seu amor por ele, agora foi a vez de roubar o amor dele...Por você. -  ao dizer isso, some em meio as árvores com Enzo, o ex- amor de minha vida ao seu lado.

Cristinyy
Enviado por Cristinyy em 12/02/2017
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