Para Sempre - A Escolha (Capítulo 4 - HORA DE PARTIR)

– MEU NÃO TÃO QUERIDO DIÁRIO –

Terça, 01/01/13, 08:42 A.M.

Olá, diário. Faz muito tempo que não escrevo nada, mas decidi escrever hoje, só para descontrair! Não tenho nenhuma queixa a fazer, exceto que ultimamente o tempo tem passado depressa demais, tão depressa que às vezes me perco, e eu não gosto nada disso!

Estamos no Ano Novo, minha época favorita do ano. A noite passada foi incrível. A ceia estava deliciosa. Além do tradicional peru assado, vovó fez arroz com lentilhas, salada de folhas e verduras variadas, lasanha à bolonhesa e mais um prato que eu não consegui identificar o que era, mas que também não dei muita atenção por ter me empanturrado com os outros três.

Esperamos dar meia-noite para colocarmos sete uvas na boca e comê-las pulando sete ondas de costas para o mar. E para começar um ano cheio de prosperidade, pegamos sete caroços de uma romã madura, deixamos secar e colocamos dentro da carteira ou bolsa para atraírem dinheiro durante todo o novo ano que virá.

O que eu não sabia é que, assim que chegássemos em casa, teria uma surpresa nada agradável. Depois de vários meses acreditando que Érica tinha esquecido aquela história de nos mudarmos para São Paulo e de me mandar para um internato, ela voltou a me assombrar como um fantasma que volta do além só para puxar o nosso pé.

“Não, eu não me esqueci,” disse ela. Estávamos no meu quarto. Eram quase duas da manhã e ainda estávamos um pouco zonzos por causa do rebuliço da noite. “Eu só dei um tempo. Um tempo para nós.”

“Eu não acredito no que estou ouvindo, Érica Lindenberg!”

“Filho, escuta...”

“Estamos ‘bem’ aqui, não estamos? Somos felizes, não somos? Por que precisamos mudar de casa, deixar a vovó? Como vamos dizer isso a ela?”

“Você vai me deixar falar ou não?”

“ Vou,” disse, fazendo um muxoxo.

“Em primeiro lugar, quero deixar claro que eu sempre penso muito bem antes de tomar qualquer decisão. E esta não foi uma decisão que tomei de forma impensada. Em segundo lugar, já conversei com a sua avó, e ela está plenamente de acordo que tentemos a vida em outro lugar. No início, eu achei que ela fosse ficar desapontada, mas foi o contrário. Ela ficou feliz por nós e desejou boa sorte.”

“Você falou com ela e ela concordou. Ótimo. Muito bem. Mas a senhora não acha que deveria... sei lá... ter falado comigo antes?”

“Acho.”

“A senhora não pensou nisso, não foi?”

“Claro que pensei. Mas tive minhas razões para não te incomodar com esse assunto. Primeiro, teve a doença da sua avó. Não podíamos deixá-la sozinha. Mas Deus, em sua infinita bondade, ouviu nossas suplicas e a curou, e agora ela goza de uma saúde perfeita outra vez. E você vai ficar surpreso quando eu disser que foi ela mesma que me aconselhou a ir em busca de novas oportunidades, conhecer novos lugares, mudar a direção do caminho que nos trouxe até aqui. Eu estava decidida a fazer isso naquele mesmo dia, sete meses atrás. Mas vi que você precisava de uma injeção de autoestima, se desvencilhar do passado, voltar a ser o que era antes do seu pai nos deixar. Por isso decidi passar uma longa temporada aqui. Dei um tempo para você pensar no que pretendia fazer assim que o ano acabasse. Você fez isso?”

Ela esperou que eu dissesse algo, e quando viu que eu não tinha nada para dizer, prosseguiu:

“Certo, eu não te culpo. Afinal, é para isso que serve um ano sabático. Esfriar a cabeça. Relaxar. Se divertir... Deus nos deu a oportunidade de fazer isso. Mas agora, é hora de tomarmos um novo rumo. E você precisa voltar a estudar.”

“Mas por que São Paulo? Por que justo lá?”

“Vou explicar. Dentre os bens que seu pai nos deixou, tem uma casa na capital, e um carro.”

“Ele nos deixou uma casa? E um carro?”

“Sim. Uma casa escriturada e registrada em meu nome,” diz ela, com uma empolgação visível. “Vamos ter uma casa só nossa. Vou arrumar um emprego e você vai voltar a estudar. Vamos fazer do jeito que seu pai sempre sonhou. Tenho certeza de que ele ficaria feliz. Não tenho a menor dúvida disso.”

De certa forma, fiquei feliz com a notícia, mas não totalmente. Por dois motivos: A) Para sair dali, eu tinha que deixar minha amada vovó para trás. Um fato sobre mim: eu me apego muito fácil às pessoas e demoro para esquecê-las. Vivo me perguntando: Por que essa memória tão boa? Eu não podia ter um pouco de amnésia? Um pouco de amnésia não me faria mal, não mesmo... B) Por uma razão que ainda desconheço, vou para um colégio interno. A sensação de ficar “sozinho” num lugar desconhecido faz os meus pelos eriçarem. Não sei se vou me adaptar.

“Espero que compreenda, Adrian. A partir de amanhã, uma nova etapa da sua vida vai começar. Talvez agora não seja uma boa hora. Mas se não for a hora, dane-se! Faça com que seja!”

Infelizmente, fiquei sem reação. Apenas disse:

“Está bem.”

“É assim que eu gosto. Amo você.”

“Também te amo.”

Com um suspiro, ela se levantou e saiu. A porta se fechou e eu me virei, procurando a melhor posição para dormir. Fechei os olhos, imaginando uma porta que estava fechada havia anos. Estava empolgado. Finalmente, ela iria se abrir. E eu mal podia esperar para descobrir o que havia do outro lado.

CONTINUA>>>

Alan Rodrigo
Enviado por Alan Rodrigo em 21/01/2018
Código do texto: T6232375
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