O poder de Pedro
 
Pedro nunca soube explicar o fenômeno que lhe acontecera naquela manhã. Com apenas 17 anos, convive com este segredo e nunca procurou médicos. Só se recorda de que estava na praia e um intenso clarão vindo do sol lhe cegou temporariamente. Foi socorrido por banhistas e, sentado num quiosque, notou que voltara a enxergar, mas alguma coisa havia penetrado na sua mente através dos olhos. Sentia que não raciocinava direito e passou a experimentar, involuntariamente, sensações estranhas toda vez que se concentrava na fisionomia das pessoas. Isto se confirmou certo dia quando este solícito jovem, ao passar por uma idosa, pensou em ajudá-la com as pesadas sacolas que carregava. Todavia, ao fixá-la com o olhar, veio-lhe a visão de uma cena de atropelamento numa via há poucos metros dali. Voltou-se imediatamente e decidiu-se pela boa ação, oferecendo-se para ajudá-la. Nesse instante um veículo em alta velocidade, perseguido pela polícia, avançou o sinal. Pedro não teve dúvidas de que o momento era o mesmo em que a idosa estaria cruzando a faixa de pedestres. Pensou, no entanto, de ter sido uma mera coincidência.
Contudo, numa outra ocasião, ele estava no velório de um grande amigo, morto num acidente. A família se lamentava por não ter conseguido se comunicar com o irmão mais velho do falecido. Pedro o conhecia e, contemplando o amigo na urna, tentou colocar em ação o seu suposto “poder”, enviando uma espécie de sinal ao irmão ausente. Duas horas depois o irmão chegou ao velório, vindo de uma cidade vizinha, esclarecendo aos familiares que alguma coisa o induzira a vir, inclusive sem saber de que iria encontrar o velório do irmão caçula.
A partir de então, nosso sensitivo amigo foi se dando conta daquilo que tinha dentro de si e decidiu resolver uma pendência muito pessoal. Morava com a mãe e o padrasto e há anos não via o pai, pois existia muita mágoa entre eles. Mas, despojando-se de tais ressentimentos, imaginou que seria fácil atraí-lo para uma visita. Começou a concentrar-se na sua imagem, idealizando um encontro para um sábado à tarde.
E assim aconteceu. Naquela tarde, junto da mãe e do padrasto, Pedro e seu pai desfrutaram de momentos de boa conversa, alegria e perdão. Resolveram as mágoas  cultivadas há anos. Pedro era só felicidade, a ponto de esquecer, momentaneamente, de sua estranha capacidade.
Depois que o pai se foi, eles continuaram conversando, quando foi surpreendido por um comentário de sua mãe:
- Que bom que deu tudo certo! Eu e seu padrasto já vínhamos falando com seu pai há algumas semanas sobre a possibilidade de ele vir aqui. Decidimos fazer uma surpresa para você e por isso não lhe dissemos nada.
Pedro sentiu-se confuso, pois estava certo de que a visita tinha sido obra do seu estranho poder. Decepcionado, ficou a se perguntar:

- Será que meu poder acabou? Não foi ele que trouxe o meu pai aqui? Não pode ser! A boa ação com a idosa, o apreço pelo meu melhor amigo, e justamente com meu pai, não funcionou? Mas, sua mãe continuou:
- Hoje era para dar certo! Você acredita Pedro, que ele chegou a ligar dizendo que não viria mais? Felizmente, uma hora depois ele já estava em nossa porta e nos explicou que alguma coisa o impelira a vir de todo jeito. Ficamos sem entender, mas o recebemos com o mesmo carinho.
Pedro sorriu como nunca. Compreendera tudo e passou a usar cada vez mais de discernimento e zelo para com a sua percepção extra-sensorial. Aprendeu como tinha que ser,  que a mágoa não deixa espaço para a sensibilidade. A bondade e o amor, ao contrário, possibilitam tudo. Os fenômenos acontecidos com a idosa, com o amigo e com o pai foram a mais pura prova disso.
Luciano Abreu
Enviado por Luciano Abreu em 06/02/2018
Reeditado em 08/03/2018
Código do texto: T6246677
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2018. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.