Chuva de fogo

Boa parte da minha adolescência passei pela Rua Maria Quitéria, em Ipanema. Parte dessas passagens eu pensava na existência de dois bares, e do motivo de eu só ter frequentado um, o Empório.

Lembro de uma noite uma amiga me ver atravessando a rua e vir correndo na minha direção, me puxar pelo braço e me apresentar a algumas pessoas.

Em outras oportunidades, a Rua Maria Quitéria presenciou momentos de felicidade, tristezas, emoções inerentes da consciência humana.

Encosto a bicicleta em um poste de luz, na Praça Nossa Senhora da Paz. Bebo um pouco de água. Respiro retomando o fôlego. Hoje está um dia quente no Rio de Janeiro, apesar de ser outono. Minha avó costuma dizer que a roda não para, ela gira, é tempo de casamento verde. Gosto das histórias da minha anciã, muito embora eu tenha deixado de lado minhas crenças.

Penso em como o tempo passa rápido, mas que me fez bem, pois eu observei toda a transação dele. As pessoas costumam me dizer que sou forte. Não entendo o sentido da palavra em que aplicam, mas formalizo da maneira que me convém.

Uma voz me chama, uma amiga me reconheceu enquanto entrava na Rua Maria Quitéria. ela atravessa a rua, me abraça, parece não se importar com o meu corpo lavado de suor. Ela diz que aparentemente estou bem, mais corado, menos magrelo. Digo que o tempo passa, e a gente aprende a colocar as coisas no lugar. Ela diz que minha mãe esteve conversando com ela, que estava um pouco preocupada comigo. Digo que estou bem.

Ela diz que quer conversar, me convida para sentar na Lagoa, digo que ainda não comi nada, depois do café da manhã, e que seria interessante se comecemos algo rápido. Ela aceita.

encontramos, já na Epitácio Pessoa, uma barraca de açaí. Ela me explica com entusiamos sobre como é difícil conseguir comidas típicas do Brasil, na França.

No sentamos no gramado da Lagoa, e nos ajeitamos, enquanto ela continuava empolgada falando sobre seu tempo fora do país. Penso que não haveria outro lugar que eu gostaria de morar, que não fosse meu país nativo. Quando eu penso na beleza natural do país, apesar do caos político, eu me sinto corado, e normalmente essa é minha referência de alegria... conforto.

Ela me pergunta como estou. digo que estou bem. Ela torce a boca. Afirmo que estou bem, que as coisas estão encontrando os os lugares de encaixe. Ela me pergunta se eu o esqueci. Digo que não, que parece ser impossível, tendo em vista o sentimento que tenho por ele, e que o fato de estar bem, e amá-lo são coisas que não se devem confundir. Ela dá de ombros. Ela diz que talvez eu devesse com mais força matá-lo. Eu digo que estou seguindo. Ela diz que se ele me amasse também, como as pessoas insistem em dizer, ele estaria como. Explico a ela que aprendi uma coisa nesse tempo, que um relacionamento tem como base alguns pilares, e que quando eu quebrei alguns deles, que restando o pilar do amor por si só não sustenta a relação. Ela diz que discorda. Eu digo que também discordava. Ela insiste em dizer que não quero ser ajudado, pois eu nutro expectativas. Eu digo que ela está errada, que estou bem. Digo que não estou nutrindo expectativas, que vai ser o que o universo quiser que seja, ou Deus (ainda estou me acertando dentro do que acredito), de forma geral, algo maior. Ela ri.

Digo que estou seguindo, mudando o que acredito que deva ser mudado em mim, e que me sinto mais leve, tenho feito coisas que me fazer me sentir bem. Ela pergunta se eu sinto saudades. Digo que sim, grande parte dos meus dias. Mas que entendo a saudade, que tudo vai dar certo de uma maneira geral, pois estou me entendo melhor, entendo o quadro da nossa história, da minha, da dele, e que precisávamos disso. Ela diz que sou louco, que não estou bem. Digo que ela não precisa se preocupar. Estou cuidando de mim, me acertando.

Levanto. Digo que preciso de um mergulho. Ela pergunta se quero deixá-la no Leblon, de carona. Digo que sem problemas, seria um prazer.

Deixo-a na Delfim Moreira. Peço para deixar minha bicicleta na garagem enquanto dou um mergulho, ela diz que tudo bem, que pretende sentir o mar, e me perguntar como é amar.

Yuri Santos
Enviado por Yuri Santos em 13/04/2018
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