Jogue-me suas tranças

Francisca ligou para a irmã e pediu, formalmente, que a recebesse, pois tinham assuntos de mútuo interesse a tratar. Juliana sequer perguntou que assuntos seriam esses, pois, naqueles dias, entre elas só havia um único tema para discorrer: Jeremias.

- Venha para o chá hoje à tarde - respondeu Juliana. - Tem com quem deixar Alice?

Por um átimo, Francisca imaginou que ela estivesse preocupada com a sobrinha... mas depois, mais realisticamente, concluiu que a irmã caçula não queria ver a filha que seu marido gerara por imposição do Grande Conselho. Desde que Alice nascera, Juliana não manifestara qualquer interesse em conhecer a criança, o que era doloroso, mas compreensível.

- Não se preocupe, irmã - disse Francisca, suavemente. - Vou deixar Alice com uma das servas... não terá que vê-la, se não o deseja.

- Eu verei Alice quando for o momento apropriado - retrucou Juliana secamente. - Por ora, creio que podemos deixá-la de fora das nossas conversas; não é sobre ela que quer falar, correto?

Francisca deu-se por vencida.

- Está bem, não vou insistir... fico grata que queira me receber.

- Estou apenas retribuindo a cortesia... você me recebeu em sua casa, depois da morte de Arthur.

"Então era isso", pensou Francisca, desolada. E desligou o telefone.

* * *

Jeremias ficara apreensivo quando Francisca lhe dissera que iria à casa de Juliana.

- Mas... por quê? O que vai fazer lá?

- Coisa de mulher - respondera ela, com um sorriso misterioso.

Desceu do táxi em frente à casa da irmã, subiu os degraus que conduziam à porta da frente e tocou a campainha sem hesitar. Precisava resolver aquela situação logo, e para isso, urgia saber em que terreno estava pisando.

A primeira indicação lhe foi dada quando Juliana abriu a porta e a encarou, muito séria, mas serena. Estava usando um vestido de tafetá azul, elegante demais para ser uma roupa casual de ficar em casa. Aquele encontro iria ser ainda mais protocolar do que Francisca gostaria, mas ela não se intimidou.

- Você está mais magra - disse, à guisa de saudação.

- A gravidez lhe fez bem - retrucou Juliana, sem se mover.

Francisca tomou a decisão de quebrar o gelo: deu um passo e envolveu a irmã caçula nos braços, cabeça colada com a dela... e aspirou longamente o perfume que a outra usava. Patchouli, anotou mentalmente.

- Senti tanto a sua falta... - murmurou ao ouvido de Juliana. E era uma observação sincera.

A irmã caçula devolveu o abraço de forma canhestra.

- Estou toda destruída por dentro, Francisca... e você, foi a mão que empurrou a faca - retrucou Juliana.

- Você nunca irá me perdoar? - Sussurrou Francisca.

- Não sei se sou tão boa assim... - admitiu Juliana, desvencilhando-se gentilmente da irmã. - Venha, vamos conversar e tomar chá... como antigamente.

Os tempos, contudo, haviam mudado, pensou Francisca com amargura.

* * *

- Sou toda ouvidos - disse Juliana quando ambas sentaram-se à mesa de chá.

- Vim para lhe fazer um apelo... em nome do sangue que corre em nossas veias... e nas de Alice.

Juliana lançou-lhe um olhar curioso, e depois falou, gelidamente:

- Sei que não deveria dizer isso... afinal, você é minha irmã mais velha... mas esse sangue talvez seja a única coisa que me impede de matá-la.

Francisca empalideceu e Juliana pareceu ficar satisfeita com o efeito causado.

- Oh, não se preocupe, Francisca; não vou fazer isso, até porque seria a forma mais rápida de perder Jeremias de vez. Faça, então, o seu apelo.

- Eu... - Francisca respirou fundo para recuperar o autocontrole - vim lhe pedir para que aceite a minha parceria com Jeremias. Ele me disse que você havia recusado-se até mesmo a discutir essa possibilidade.

Juliana concedeu-lhe um sorriso pálido, e Francisca antecipou que ela iria lhe pisar onde doesse mais. Não se enganou.

- Eu estou disposta a dar minha permissão à sua parceria com o meu consórcio, querida irmã... com uma condição.

Juliana parou de falar, enquanto enchia sua xícara de chá. Tomou um gole, e só aí, declarou:

- Eu quero criar Alice.

- [15-07-2018]