MIRELA

Sabe, até hoje lembro do sorriso e daqueles olhos castanhos mel de Mirela, que combinavam tão bem com a cor do seu cabelo. Não era um padrão de beleza, mas se destacava por sua diferença de ser, parecia que a natureza havia feito perfeita propositadamente. Ela gostava de coisas repetitivas, músicas, programas de tv, as cores das roupas, sapatos, o mesmo penteado e nunca trocava o brinco de cor preta que havia ganhado no seu aniversário de dezessete anos, Mirela era inconfundível e eu achava graça em tudo aquilo.

Apesar de sermos vizinhos a quase três anos, mantínhamos poucas palavras, não por causa dela, mas po eu ser sempre um sujeito calado. Eu sempre à via pela janela do meu quarto, molhando as flores do jardim, retirando as cartas que chegavam, muitas delas eram do seu irmão que foi chamado para a guerra. Mas a melhor parte do meu dia era quando eu a ouvia cantar e tocar piano. Era simplesmente perfeito, a voz dela era minha maior inspiração para pintar.

O seu aniversário de dezoito anos estava chegando e então tomei coragem para pintar um retrato dela e dar-lhe de presente. Rabisquei um bloco de papel, depois tentando encontrar na mistura das cores o tom mais próximo ao que era ela.

Passei várias noites acordado, mas cada pincelada deveria ser perfeita assim como Mirela. Me esforcei, pois, deveria ser o melhor presente de toda a sua vida e consequentemente o meu melhor quadro, ela se tornou a minha musa e eu? Eu já sabia que a amava. Havia chegado o seu aniversário, e então logo cedo levei o presente embrulhado naqueles papéis marrom e amarrado com barbante.

Coloquei em frente à sua porta com um cartão dizendo "Feliz aniversário, minha musa, tu és inspiração para os meus olhos" Esse cartão sempre esteve guardado junto a sua caixa de pequenas recordações. Então sai às pressas com o coração a mil e fiquei na minha janela observando - a

Pouco depois Mirela abriu a porta e com ar de surpresa pegou o embrulho, leu o cartão, em seguida retirou o papel logo ali. Foi um momento indescritível aquele, o céu azul, o frio na barriga, o quadro em suas mãos, o seu rosto iluminado.

Logo após o almoço, minha mãe havia batido em meu quarto dizendo que tínhamos visitas, eu estava ainda tentando absorver tudo que aconteceu, nem passou pela minha cabeça que seria Mirela. E lá estava ela, na sala sentada no canto do sofá, eu poderia passar o resto da minha vida com aquela imagem. Tanta coisa se passava pela minha cabeça, que eu nem sentia os degraus da escada, parecia que minhas pernas estavam flutuando.

Ela se virou, sorriu olhando para mim, eu claro, sorri como resposta. Nos cumprimentamos e minha mão estava trêmula, ela sorriu novamente enquanto eu estava tentando esconder o meu nervosismo. Minha mãe então comentou que ela estava ali nos convidando para o seu jantar de aniversário e saiu em direção a cozinha para pegar biscoitos e chá para servir.

Estávamos literalmente sozinhos e então ela me deu um pequeno caderno que guardo aqui nesta gaveta. Dizendo que eu também era a sua inspiração, nele há vários poemas, poemas sobre mim, sobre o "tal moço misterioso". Então ela agradeceu pelo presente e me deu um beijo. Eu não esperava, mas lhe retribui com paixão.

Dois anos depois nos casamos e vivemos dias felizes com nossos filhos. Esse quadro que está vendo agora é de sua avó e foi pintado a quase oitenta anos e aquele piano na sala foi tocado por ela até no dia de sua morte.

Mirela foi a mulher da minha vida, a maior inspiração, em cada trabalho meu vive um pedaço dela e um pedaço dela ainda existe dentro de mim, sem dúvidas fui o homem mais feliz que já existiu.