Azul Perfeito - Chuva a Tarde

Talvez tivesse sido o cheiro do moletom que emanava o perfume de Alessandra, ou quem sabe, o frio aconchegante após uma chuva tão rigorosa, porém William ficou dormindo até às 19 da noite sem levantar.

Quando acordou, se assustou pelo céu escuro na sua janela, mas ainda assim procrastinou uns minutos na cama, estava se lembrando dos sonhos que tivera com Alesssndra.

Mesmo de olhos abertos, a imagem de cada sonho lhe eram muito nítidas pelas retinas. Em um sonho, os dois roubavam os moletons um do outro, já no próximo sonho, Alessandra conversava com ele por horas e horas a fio e debatia sobre diversos assuntos, o preferido era sem dúvidas a melhor bebida quente.

"Café" afirmava William, já Alessandra preferia Cappuccino e assim o sonho prosseguiu com calorosos debates. Quando ele finalmente acordou, sensações diversas enchiam seu peito, amor, nostalgia, deslocamento, um misto de encanto e medo. Mas nenhuma sensação se comparava com a alegria e a satisfação de ter passado tempo perto de Alessandra, de ter conseguido conversar com ela e ter visto ela rir (mesmo no sonho), era como se ela fosse todo o motivo da felicidade dele nesse planeta e que estar perto dela fosse o único sentido possível da vida dele naquele momento.

Nisso, tentou até dormir de novo para ver se conseguia sonhar com ela novamente, mas o sono não vinha. Levantou um tanto nauseado pelo horário, tomou um banho e preparou algo para comer.

Passou a noite procurando por ela no Facebook, vendo fotos e os comentários das fotos, tentou ver tudo que tinha disponível sobre Sam nas redes sociais, simplesmente para poder ter assunto quando se encontrassem pessoalmente no dia seguinte, ou até mesmo quem sabe, num próximo sonho. Mal podia esperar até a manhã quando iria poder vê-la, ficava pensando se ela o abraçaria novamente como fez quando estavam sob aquele desnecessário grande guarda-chuva, ou se ela talvez teria desistido de ser simpática, ai ele já tinha até um plano para tentar se reaproximar dela. Ele ensaiava infinitos diálogos sobre os assuntos que aprendera, fazia caminhos com a conversa, tentava prever o que ela falaria e preparava respostas para as respostas dela. Passou a noite nessa atividade até dormir novamente as 2 da manhã, deitou com a esperança de sonhar novamente com ela e por pensar demais seu desejo se realizou.

Neste sonho, Alessandra se apresentara em um distinto vestido branco, cabelos soltos e de rosto angelical. Ela caminhava por entre as cadeiras da sala tendo a todos os alunos e professores como ávida platéia. Ao chegar perto de William, o olhava com sincero afeto, e em resposta, o corpo dele se liquefazia em água, transbordando pelo chão e molhando a ponta do vestido dela. Alessandra saia então pisando o poço de água, indo em direção a uma direção obscura que o sonho não tomara parte em sonhar, antes, o líquido se misturava a imagem de um chão turbulento e um degradê de cores esvaziava a cena como no fim de uma peça e logo o sonho terminara.

William acordou sem entender este sonho, afinal, acreditava profundamente que seus sonhos representavam seus sentimentos mais escondidos, e embora tivesse tentado evitar se apaixonar por ela (por causa do seu medo de ser rejeitado ou do seu medo de assusta-la ao se declarar), ainda assim cedeu aos sentimentos devido a carga emocional dos seus próprios sonhos. Então ver-se desmanchando em água não lhe foi bem aos olhos, acabou indo para a escola desconfiado, pensando que estivesse endeusando Alessandra e que pudesse pisar em falso por causa daquilo.

Chegou muito cedo e ficou sozinho na sala, tinha a esperança que coincidentemente ela chegasse também mais cedo, esperou e esperou e nada de Sam aparecer. A turma se encheu e a aula já havia começado e ele ainda olhava para a porta esperando a silhueta dela entrar timidamente se desculpando pelo atraso. Não aconteceu.

Só depois da segunda aula, totalmente desesperançado em poder ver ela aquele dia, que finalmente ela entra pela porta com um pouco de pressa, um tanto desajeitada tentando arranjar um lugar vago e diz:

- Professora, desculpas pelo atraso, meu gato fugiu de casa!

A professora a olha surpresa, mas simplesmente comenta com toda a leveza de alguém que há 27 anos dava aula.

- Bom dia Alessandra, que chato isso acontecer, mas você já encontrou ele?

- Não o encontrei, acho que deve ter fugido para poder cruzar, ele já tem 6 meses de idade.

- Pode ser isso, mas senta aí e fica tranquila, gato é bicho solto, as vezes fica 3 dias na gandaia e volta com a cara mais lavada do mundo.

Alessandra disse um áspero "Ok", para encerrar assunto e não mais interromper a aula. Caminhou próximo a William (ela sentava no banco a frente dele), o cumprimentou com um sorriso curto porém alegre, daqueles sorrisos matutinos que damos aos nossos colegas de trabalhou ou escola.

Ele apenas sorriu de volta sem demonstrar outras coisas, mas, no fundo seu coração disparava de alegria pelo simples fato de vê-la de novo e saber que estava bem.

Era fatal e não havia volta, William estava perdidamente apaixonado pela menina e não conseguiria mais controlar isso. Agora o que restava era apenas deixar o rio seguir seu curso enquanto ele se afogava em cachoeiras de sentimentos inigualáveis.

Ele sabia o quão tóxico podia se apaixonar, e o quão doloroso era viver de ilusão, mas nesse momento, todos os riscos de possível sofrimento pareciam valer a pena, pela simples possibilidade de passar mais um momento perto de sua nova amada.