Insensatez: Amor Obsessivo

Naquele dia eu estava trabalhando no serviço braçal em uma fundição. Quando olhei pra frente, no escritório que tinha ali, vi a garota mais linda que já existiu neste mundo. Ela conversava com as colegas e sorria aquele sorriso que iluminava tudo e iluminou também meu coração.

Eu me senti mal e revoltado por estar naquela condição de trabalhador braçal, sem nada para oferecer para uma princesa. Ela nem notou minha presença e meu olhar.

Dia após dia eu a olhava e ficava encantado. Eu pensava e fazer alguma coisa pra mudar de vida. Precisava de um emprego melhor, de ter um carro. Quem sabe assim ela pudesse me notar. E eu fui à luta para mudar minha vida.

Sabia que ela era de uma família tradicional naquela pequena cidade. Sabia também que por certo muitos rapazes ricos queriam namorar uma garota tão linda e delicada.

Estávamos no final da década de 1970. A cidade em que morávamos era tradicional e muito conservadora. Eu era filho de uma mãe solteira. Isto na época era um tabu e as pessoas viravam a cara para uma mulher que mesmo por amor tenha como diziam “se perdido” e ficado com um filho nos braços. Eu amava muito minha mãe que me criou com muito sacrifício e engolindo muitos sapos por sua condição. Eu era considerado por muitos um bastardo por meu pai ter outra família e ter abandonado minha mãe. Mesmo sem conhecer meu pai eu o odiava.

Eu nunca fui um homem bonito, de boa aparência. Era baixo para os padrões masculinos, não tinha um rosto bonito, era franzino e não tinha os modos finos e elegantes que ela tinha.

Com muito sacrifício consegui fazer um curso profissionalizante e por fim consegui um emprego em uma grande empresa que há pouco tempo se instalara na cidade vizinha.

Eu continuava alimentando aquele amor e era ele que me dava força pra continuar lutando. Ela nem sabia da minha existência mas um dia eu iria me apresentar a ela.

Com muito esforço, depois de dois anos eu consegui comprar meu primeiro carro. Tinha um emprego estável e que me dava uma condição de vida bem melhor do que a que sempre tive. Já podia comprar roupas pra me apresentar decentemente diante da minha princesa.

E assim foi. Através de uma conhecida, que era amiga dela, eu me aproximei.

Ela foi muito atenciosa e educada, muito gentil e eu soube que ela era exatamente tudo o que eu sonhei. E que aquele amor que eu sentia era pra valer. Ao conversar com ela meu coração pulava no peito e quando ela sorria pra mim eu me encantava ainda mais, se é que isto era possível. Ela era realmente uma princesa, uma lady, um encanto.

No entanto ela não se mostrou entusiasmada. Parecia que só estava sendo educada ao me dar atenção.

Eu comecei a tentar conquistá-la com flores, mimos e mostrando o quanto eu a amava.

Ela era sempre arredia. Aceitou um ou outro convite pra sair, mas demonstrava não querer nada comigo.

Eu me enchi de coragem e pedi pra ela namorar comigo. Abri meu coração, contei tudo desde o dia que a vi pela primeira vez. Disse que lutei pra melhorar de vida para merecê-la e ela só disse que um carro não a impressionava e que jamais namoraria alguém pelo que ele tenha. Delicadamente disse que não queria assumir namoro com ninguém naquele momento. Era um modo educado de dizer que não queria namorar comigo.

Mas eu segui marcando de perto. Eu tentava me convencer que ela apenas ficava indecisa por causa da minha condição de vida.

Sempre que podia conversava com ela. Sempre tentava agradá-la. E ela sempre sendo gentil e educada mas sem tomar uma decisão.

No inicio do próximo ano eu tive duas decepções, ela passou no vestibular e ingressou na faculdade, era mais um patamar que ela ficaria acima de mim e começou a namorar um cara bem mais apropriado a ela que eu.

Mas mesmo assim eu não desisti de tentar conquistá-la. Ela como pessoa bacana que sempre foi nunca teve coragem de me dar um fora. Talvez soubesse o quanto eu a amava e o quanto eu sofreria se ela me dispensasse de vez.

Aos poucos eu fui caindo na real e percebendo que ela nunca iria assumir um namoro comigo. Mas mesmo assim eu não conseguia esquecê-la e sempre tentava estar presente em sua vida

E o tempo foi passando. E eu sonhando com o dia que ficaria com ela. E ela, sutilmente, me desprezando.

Ela se formou, seguiu seu caminho, tinha uma boa profissão e um bom emprego. Sempre melhor que eu.

Quando ela assumiu um namoro sério com um cara que era tudo que eu nunca fui eu me desiludi de vez. Comecei a beber com frequência, fui ficando triste e deprimido.

Comecei a namorar uma garota pra fazer ciúmes nela. E ela nem tomou conhecimento.

Por fim ela se casou e o meu mundo desabou. Bebia cada vez mais como se a bebida conseguisse tirar aquele amor do meu coração.

Um tempo depois minha namorada ficou grávida e eu que jamais faria o que o canalha do meu pai fez, me casei com ela. Mas nunca fui feliz.

Por fim, mergulhei de vez na bebida, acabei perdendo meu emprego e me separando de minha esposa.

A minha amada está cada vez mais exuberante e linda. Tem sucesso profissional e um casamento, aparentemente, estável.

E eu cada vez mais mergulhado no limbo da vida.

Agora ela anda em carrões, tem uma casa linda, continua se vestindo com elegância e charme, continua linda. E eu aqui me acabando.

Ela nem olha pra mim quando me vê pela rua, como se nem lembrasse de minha existência. Eu, pelo contrário, toda vez que a vejo meu coração pula no peito e amor renasce com mais força.

Eu vivo meus dias como quem já não tem mais vida. Minha vida é beber, como se isto me fizesse esquecer minha desilusão, meu desamor e infelicidade.

E ela sempre exuberante, linda, senhora de si e cheia de vida.

Muitos me julgam um fraco, um fracassado e perdedor. Ninguém entende que um amor não correspondido pode acabar com uma pessoa. Eu sou a prova disto. Não consigo superar, esquecer, me libertar.

E vou existindo como um trapo humano, bêbado e inebriado de um amor descabido.

(Baseado em um história de vida)

Nádia Gonçalves
Enviado por Nádia Gonçalves em 27/01/2022
Código do texto: T7438621
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