Casas comigo?

Tudo muito rápido! Ajoelhou-se à minha frente e com um sorriso maroto, naquele rosto iluminado, soltou uma frase inesperada... “Casas comigo?” Nada portava na mão, mas aquele sobretudo estava um pouco fora de cena para as temperaturas de final da primavera.

Resolvi arriscar! “Aceito com condicionantes”. Perguntou-me quais seriam... “Nosso relacionamento tem que ter prazo de validade definido. E tudo que está nesse sobretudo terá que surpreender-me!” Deixei-o pensativo...

Logo aquele sorriso voltou a iluminar seu rosto e propôs: a cada mudança de estação sentamos em local apropriado e avaliamos o tempo decorrido. Decidindo o desenrolar se concluirmos pelo término ou o desenho proposto para o próximo período estendido. Apoiado na minha anuência colocou a mão num dos bolsos internos do sobretudo e retirou uma caixinha... “posso abrir?”. A caixinha era interessante, gosto de anéis, mas a ideia de ser obrigada a usar um fez-me apenas franzir o olho esquerdo. Abriu! E fui obrigada a deliciar-me com aquele singelo Ferrero Rocher. “Dizem que vindo nestas caixinhas torna-se um potente afrodisíaco”. Deu uma piscadinha de olho. Safado!

Num átimo um envelope grande saiu magicamente do sobretudo. Os estudos para compra e transformação dos contentores ficaram prontos. O projeto de uma casa transportável adquiria formas. “Precisamos fazer contas...” Agora foi um envelope pequeno que surgiu... contentores, transporte e a base da transformação devidamente pagos. O sorriso dele fazia-me lembrar que a etapa seguinte seria por minha conta: decoração bem como a escolha e legalização num dos terrenos que havíamos estudado. Agora entendia a razão deste assunto ter ficado um pouco à deriva.

Colocou a mão novamente dentro do sobretudo... uma caixa quadrada foi-me oferecida em silêncio. Não foi difícil retirar de seu interior uma base de vidro onde pousava em declive um globo terrestre igualmente em vidro. Objetos simples, delicados... procurei captar a mensagem, mas meu olhar revelava um ponto de interrogação. “Não precisas de nada e nada tenho de verdadeiramente valioso para te dar... que não seja o meu mundo! Agora simbolicamente o tens com toda a sua transparência”. Naquele momento tive a certeza que aquilo ia durar pouco tempo... demasiado lamechas para meu gosto!

Não sei quantos anos passaram, mas sempre que ele aparece com aquele sobretudo, sei que vou deliciar-me com um Ferrero e rir das surpresas lamechas ou de algo bem picante. Mas nunca deixou de surpreender-me! Vingo-me sempre que digo que hoje é dia de vendar seus olhos! O começo das estações é propício para esses eventos, principalmente o verão!