Esboço

Amelia-Rose estava sentada na cafeteria, uma xícara de capuccino e uma revista de moda à sua frente sobre a mesa, quando o rapaz aproximou-se. Ele teria mais ou menos a idade dela, e parecia hesitante na abordagem.

- Oi... desculpe interromper, mas posso lhe mostrar uns desenhos?

Amelia-Rose ergueu os olhos da revista e encarou o rapaz, ligeiramente aborrecida.

- Você vende desenhos? - Inquiriu.

- Não, não é isso... - o rapaz puxou um velho caderno de desenhos da mochila que trazia às costas, e o exibiu para ela. - Desenhar é um hobby, não vim lhe vender nada.

- E o que quer me mostrar? - Indagou a jovem desconfiada.

O rapaz abriu o caderno e exibiu o desenho de um rosto feito com grafite macio. Amelia-Rose reconheceu-se na imagem, inclusive o corte de cabelo que usara seis meses atrás, e o brinco na orelha visível. Encarou o rapaz com suspeição.

- Onde me viu, para fazer algo tão perfeito?

O rosto do rapaz iluminou-se.

- Você gostou? - Indagou.

- Você não respondeu à minha pergunta - replicou Amelia-Rose.

- Eu nunca havia visto você antes, - afirmou o rapaz - exceto na minha cabeça. Desde uns dez anos que essa imagem me aparece, e eu venho tentando colocar no papel.

E com uma risadinha encabulada:

- Claro, as primeiras tentativas foram muito ruins...

Sem saber o que pensar, Amelia-Rose indicou a cadeira vaga à frente dela.

- Sente-se e me diga que história louca é essa.

O rapaz sentou-se, muito satisfeito com o convite. Abriu o caderno nas primeiras folhas.

- Esses foram meus primeiros desenhos do que seria você... nada parecido, né?

Um círculo, dois pontos por olhos, uma boca que era uma linha fina; apenas os cabelos lembravam vagamente algo que ela havia usado algum dia.

- Você melhorou extraordinariamente - admitiu a jovem. E sem receber autorização, puxou o caderno e começou a folheá-lo. Havia outros desenhos, de animais, plantas e paisagens, mas o rosto que um dia seria o dela aparecia de quando em quando, cada vez mais realista. Sim, aquele desconhecido realmente tinha algum tipo de vínculo com ela, concluiu Amelia-Rose.

- Onde você mora? - Perguntou.

- Do outro lado da cidade - disse o rapaz. - Vim atender o chamado de um cliente... sou programador... e resolvi entrar aqui para tomar um café antes de voltar para o escritório. Foi então que lhe vi.

Amelia-Rose ergueu os olhos dos desenhos para o rapaz. Ele parecia incrédulo, como se estivesse diante de um milagre que acabasse de se realizar contra todos os prognósticos. A jovem virou ligeiramente a cabeça de lado, para ficar no ângulo em que surgia nos desenhos dele.

- Assim? - Indagou ela.

- Assim - confirmou ele, olhos brilhando.

- [31-08-2022]