Tempo De Amar

No final da década de 1920 Ester era uma garota de dezessete anos. Era filha de um milionário, proprietário de indústria têxtil. Sempre teve uma vida de princesa, tinha tudo o que queria, estudou nas melhores escolas, frequentava o que tinha de melhor na sociedade. Sempre luxuosamente vestida e usando belas jóias.

Estava cursando o último ano do colégio. Logo no princípio do ano chegou um professor para substituir um outro que se aposentou.

Quando o olhar dele e o de Ester se cruzaram um encantamento tomou conta deles. Ele era um homem muito bonito e charmoso. Seus olhos castanhos bem claros e profundos se destacavam. Seu sorriso era perfeito.

Suas aulas eram interessantes e motivadoras. Ele parecia muito culto e sabia cativar os alunos. Parecia que com ele era mais fácil aprender. Ele tinha o dom de ensinar.

Quando ela conversou com ele ficou hipnotizada com sua educação e cultura. Parecia conhecer todos os assuntos.

Eles se apaixonaram. Uma noite ele foi levar Ester em casa e a beijou. Seu pai os pegou:

-Ester, já pra dentro. E você, desapareça daqui. Agora.

Ester entrou e seu pai estava furioso:

-Quem é este sujeito que estava com você? Perdeu o juízo e a vergonha?

-Ele é professor do colégio.

-O quê? Um professor seduzindo uma menor?

-Ele não me seduziu. Estou com ele porque quero.

-Cale-se. Você está pensando que é uma qualquer que pode sair e beijar qualquer um?

-Ele não é qualquer um. É um professor inteligente, educado e respeitador.

-Amanhã mesmo eu vou ao colégio exigir a demissão desse desavergonhado. Onde já se viu? Sair com uma aluna?

-Eu que o chamei pra sair comigo.

-Você não é uma qualquer.

-Pai, eu não estava fazendo nada de errado, nem ele.

-Ele estava lhe beijando. Ele não é homem pra você. Vou pedir a demissão dele.

-Se o senhor fizer isto eu juro que fujo com ele.

-Você enlouqueceu?

-Eu fujo com ele. O senhor não tem direito de prejudicá-lo.

-E ele não tem direito de seduzir você.

-Ele é o melhor professor que já tivemos no colégio.

-Minha filha, você é uma moça da mais alta sociedade. Dê-se ao respeito.

-Não quero discutir isto. Se o senhor o prejudicar eu fujo com ele.

-Você está proibida de se encontrar com ele.

Ela não respondeu e saiu para seu quarto.

Passou a encontrar com ele escondido.

Seu pai descobriu. Ameaçou denunciá-lo e acusá-lo de seduzir alunas menores e a chantageou para aceitar namorar Marcos, um homem de família rica.

Pressionada, com medo de César ser prejudicado e perseguido, aceitou namorar Marcos.

Mas continuava apaixonada pelo professor e ele por ela. Sabiam que era um amor proibido, que o pai dela jamais aceitaria. Ele era de família pobre, sem tradição, não tinha nada a oferecer a uma moça rica. Sabiam que não podiam lutar contra os poderosos.

Marcos era cheio de atenção, carinho e cuidados com Ester. Era um homem inteligente e educado. Era gentil e seus pensamentos e idéias se alinhavam com os dela. Gostavam das mesmas coisas e se interessavam por música e literatura. Era um homem maduro, tinha trinta anos e agradava seu pai pois era rico e da alta sociedade. Era apaixonado por ela. E ela pensou que seria, dos males o menor.

Ela se formou no colégio e seu pai tratou de apressar o seu noivado e casamento.

No ano seguinte ela se casou com Marcos.

Todos comentaram que foi a noiva mais linda e triste que viram. Ao ver César na Igreja, ela chorou e ele estava profundamente triste.

Marcos não sabia que estava casando com uma mulher que amava outro e estava feliz.

Ela se acostumou àquele casamento sem amor. Tinha muito respeito por ele que era um marido amoroso, carinhoso e atencioso. Eles se davam muito bem. Mas ela nunca esqueceu o seu verdadeiro amor. Em seu coração ela guardava o amor que não pode viver.

Nunca se sentiu infeliz pois tinha o melhor marido que alguém poderia querer. Mas também não podia dizer que era feliz. Não tinha filhos e pedia a Deus que lhe permitisse ser mãe. Achava que um filho alegraria sua vida, pois teria um ser amado com ela.

Quando estava para completar quatorze anos de casada seu marido adoeceu. Contraiu febre amarela e veio a falecer.

Ester lamentou a perda de seu companheiro. Era mais que um marido, era um grande amigo. Acostumou a viver a seu lado e mesmo sem amá-lo sentia profundo respeito e admiração por ele. Ela estava sozinha.

Tempos depois ela reencontrou César. Ele ainda estava sozinho. Começaram a se encontrar e namorar.

Logo o pai dela ficou sabendo. Foi conversar e tentar acabar com o relacionamento.

-Minha filha, soube que você está encontrando com aquele sujeitinho.

-Aquele sujeitinho tem nome. Ele se chama César.

-Você é uma viúva, tem que se dar ao respeito.

-Enquanto eu fui casada meu corpo sempre foi fiel ao meu marido. Mas meu coração e minha alma sempre foram fiéis ao meu amor. Ninguém manda em meus sentimentos porque meu coração e minha alma são livres. Agora que estou viúva eu não devo mais fidelidade ao Marcos. E não sou mais submissa ao senhor. Eu sou dona de minha vida.

-Isto é o que você pensa. Eu não vou deixar você dissipar a fortuna que seu marido lhe deixou com esse interesseiro. Você não vê que ele não é digno de você? E além do mais, uma viúva deve se dar ao respeito. Não pode ficar por ai namorando um joão-ninguém. Você sabe que tem muitos bons partidos que se casariam com você na hora que você quisesse.

-Eu não vou mais me submeter a um casamento sem amor. E o César não é um interesseiro e nem é um joão-ninguém. Ele é um professor, uma pessoa séria, inteligente, culto, bom caráter e honesto. Ele me ama, esperou por mim todo esse tempo, mesmo sabendo que eu estava casada com outro. E eu o amo.

-Não é homem pra você. Não tem um nome nem família tradicional. É um pobretão.

-Eu não me importo com isso. Não carrego em mim o preconceito que o senhor carrega.

-Imagina você, uma mulher linda, de classe, rica, elegante, de uma família nobre, casada com um reles professor de colégio.

-Professor é uma profissão digna e bela e ele se orgulha de ser um professor. Ele é um homem e eu uma mulher e nós nos amamos. Ele é um homem como o senhor, como o Marcos, como qualquer outro. E é o homem que eu amo.

-Não me compare a ele. Você me ofende.

-Tenho pena do senhor. Sua arrogância, preconceito e superioridade são dignos de pena.

-Tenha pena de você que não sabe se dar ao respeito.

-Eu não sou digna de pena. Digna de pena eu era quando fui casada com um homem e amava outro.

-Se você insistir nessa idéia de namorar e se casar com esse sujeito eu lhe deserdo e deixo de me considerar seu pai.

-Pois faça isso. Deserde-me. Eu sou sua única filha. Assim talvez você deixe toda a sua fortuna para quem necessita. Vai fazer pelo menos uma boa ação na vida e purgar um pouco dos seus pecados.

Ele deu uma bofetada nela.

-Você me deve respeito.

-Por quê? Não vai deixar de ser meu pai?

-Você é muito atrevida. É isto que aprende com este sujeito?

-Penso por mim mesma.

-Mulher não tem que pensar, tem que obedecer.

-Eu não lhe devo obediência. Sou viúva, sou livre. E não ouse mais encostar a mão em mim. Não sou mais aquela menina que o senhor dominava, batia e decidia a vida.

-Sendo tão abusada você só prova que aquele homem não serve pra você.

-O que ele tem a ver com quem sou? Já disse que penso por mim mesma.

Ela continuou seu namoro com César e batendo de frente com seu pai.

Eles finalmente se casaram. Os pais de Ester não foram ao casamento. E seu pai não falou mais com ela.

Ela teve dois filhos que seu pai não quis conhecer, mesmo sendo seus únicos netos.

Eles eram felizes. Viviam um pro outro e para os filhos. Esperaram muito pra viver aquele amor e valorizavam a sua união.

Tempos depois o pai de Ester adoeceu e em seu leito de morte pediu pra ver Ester, César e os filhos deles.

-Minha filha, eu quero conhecer seus filhos, meus netos. Quero pedir perdão pra vocês. Quero que saiba que eu nunca deixei de lhe amar, que você sempre foi minha filha adorada. Eu me arrependo de ter vivido todo esse tempo longe de você. Você me perdoa?

-Não tenho o que lhe perdoar, meu pai. Eu nunca deixei de amar o senhor ou de lhe considerar meu pai. Sempre ensinei aos meus filhos que o senhor é avô deles e que eles lhe devem respeito e amor.

Os filhos dela chegam perto e ele chora, os abraça e abençoa.

-Perdi tanto tempo em minha vida e agora não tenho mais tempo. Aprendi tarde demais que o amor, a tolerância e compreensão valem mais que o orgulho e a arrogância…

Nádia Gonçalves
Enviado por Nádia Gonçalves em 28/09/2022
Reeditado em 11/10/2022
Código do texto: T7616301
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