UMA NOVA CHANCE

Amélia tinha 62 anos, e muitos fantasmas para afugentar. Ela se casara, tivera quatro filhos, seus filhos lhe deram netos. Ela teve uma vida estável, não plenamente feliz, mas estável. Amélia amava seu marido, mas sabia, em seu íntimo, que nunca foi apaixonada por ele.

Agora, com 62 anos, sua vida mudou. Seu marido falecera em um acidente, havia um pouco mais de um ano que ele foi enterrado. No começo foi difícil aceitar a nova realidade, mas conforme os meses foram se passando, ela acabou se acostumando.

Com a morte do seu marido, várias questões começaram a surgir, várias perguntas das quais ela não tinha respostas. Durante sua vida de casada, ela jamais precisou pensar a respeito daquele por qual ela sempre alimentou uma paixão interna. Uma paixão bem escondida, mas que nunca deixou de existir.

Esses fantasmas estavam atormentando-a com mais força, porque sua antiga paixão havia voltado para a cidade.

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Após 40 anos longe, viajando de cidade em cidade devido a sua profissão, Hiroshi estava de volta a sua cidade natal. Ele sabia bem os motivos que o fizeram retornar. Hiroshi ainda amava Amélia, seu amor da juventude. Ele tinha parentes na cidade que sua amada morava, sua terra natal. Certo dia, seu primo lhe informou que o marido de Amélia havia morrido. Hiroshi não quis ser indecente, esperou um ano para reaparecer na vida da mulher que ele tanto amou.

Hiroshi teve a certeza de que Amélia ainda o amava quando, em uma tarde de bastante calor, eles se encontraram no centro da cidade. Eles se reconheceram instantaneamente, o coração dele parecia querer saltar-lhe do peito e ir de encontro com a mulher da sua vida.

— Olá, Amélia. Quanto tempo! — ele disse, tentando controlar a respiração.

— Como vai, Hiroshi? — ela respondeu, sem conseguir fixar o seu olhar no dele.

— Vou bem. Meus pêsames pela sua perda. — Ele foi sincero em suas palavras.

— Obrigada! Como soube?

— Meu primo me contou.

Ela não falou mais nada. Uma adolescente tocou em Amélia e disse:

— Vovó, vamos embora!

— Vamos, querida. — Amélia disse, com gentileza.

Hiroshi observou-a partir. Ele a reconquistaria.

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Amélia ficou por dias refletindo sobre o reencontro que teve com Hiroshi. Ela ficara com os pensamentos embaralhados na ocasião. Ela sabia que já não era mais moça e tinha receio do que seus filhos lhe falariam. “Que pensamento absurdo!”, repreendeu-se. Ela não iria, de fato, tentar engatar um novo romance, nesse caso reviver um antigo romance. Ou iria? Ela não sabia, tudo era obscuro, o horizonte do seu futuro estava nublado.

Os dias continuaram se passando, e a cada novo amanhecer, Amélia permitia que a chama daquela antiga paixão a consumisse. Há dois dias, Hiroshi mandou um bonsai para ela, junto com o presente veio um cartãozinho escrito: “Permita-se se apaixonar outra vez”. Amélia achou encantador aquele presente.

Ela esperou mais alguns dias, iria conversar com os filhos. Ela não conseguiria seguir adiante com alguém, se isso fosse, de alguma forma, afetá-la no relacionamento com seus filhos.

Antes de ter a conversa definitiva, ela aceitou o convite de Hiroshi para um jantar. A noite ao lado do seu antigo amor foi agradável. Ela se sentiu uma moça de 22 anos novamente. Hiroshi sempre lhe fez bem. A vida de Amélia não havia sido dela, o pai lhe obrigara a casar com seu falecido marido. No primeiro ano de casamento, ela teve medo. Mas seu falecido marido foi bom para ela. Amélia aprendeu a respeitá-lo.

Porém, ela estava livre para permitir que seu verdadeiro amor voltasse para sua vida. E ela sentia-se feliz com esse pensamento.

Quando chegou o dia de conversar com seus filhos, ela estava nervosa. Ficou com medo do que eles diriam.

Ela sentou-com eles, após um divertido almoço e sem preâmbulos foi direto ao ponto:

— Antes de me casar com o pai de vocês, eu tinha um namorado. Nós nos amávamos, mas o avô de vocês obrigou-me a casar com o pai de vocês. Fui fiel ao meu marido, fiz meu papel. Fiz o que se esperava de mim. Fui feliz em certos momentos e o pai de vocês me tratou com muito amor e respeito. Mas ele nunca foi o amor da minha vida. Hiroshi, meu antigo namorado, ele que foi. E ele está voltando para minha vida.

Amélia esperou alguma reação. Sua filha mais velha que se manifestou primeiro:

— Foi com ele que você saiu para jantar?

— Sim.

— A senhora se sentiu bem? — perguntou seu caçula.

— Senti-me jovem outra vez.

— Então não seremos nós que vamos impedi-la de ser feliz. — Falou a filha mais velha.

— A opinião de vocês é importante para mim. — Disse Amélia.

— E a sua felicidade é importante para nós. — Falou o segundo filho mais velho.

Após essa conversa, o restante da tarde transcorreu alegre, muito melhor do que Amélia imaginou que seria. Agora Amélia estava pronta para receber Hiroshi mais uma vez e fazer arder novamente esse fogo que reduziu com os anos, mas que nunca se extinguiu.

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Hiroshi não cabia em si de tanta alegria. Ele havia ligado para Amélia no dia anterior, e ela lhe disse que precisava conversar com ele, e que ainda tinha fortes sentimentos por ele. Eles marcaram um outro jantar.

Quando eles estavam jantando, Hiroshi parecia uma criança. Ele admirou Amélia, ela tinha o mesmo sorriso da juventude, o mesmo olhar. Ele a amava e admirava sua beleza.

Jogaram um pouco de conversa fora, até que ele tomou coragem e disse:

— Existe alguma chance de recuperarmos o que perdemos?

— Bem remota, eu diria. — Amélia sorriu, estava zombando de Hiroshi. Ela achou fofa a cara de decepção que ele fez.

— Entendo! — disse ele, obviamente frustrado.

— Estou brincando, seu velho rabugento! Eu adoraria recomeçar de onde paramos.

A expressão de Hiroshi foi de frustrado à alegre em questões de segundos.

Eles aproveitaram o restante da noite, aproveitaram como amigos, como amantes, como dois velhos que voltavam à juventude.

Quando Hiroshi a deixou em casa e a beijou, era como se o tempo nunca tivesse passado para eles. Eles nasceram um para o outro.

— Eu te amo, Amélia. — Ele falou, com extremo amor e sinceridade.

— Eu te amo, Hiroshi. — Ela respondeu sorridente.

A partir daquela noite, eles nunca mais se separariam.

Felipe Pereira dos Santos
Enviado por Felipe Pereira dos Santos em 07/10/2022
Reeditado em 07/10/2022
Código do texto: T7622147
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