Perdidos na mata

Joca era um menino bem sapeca, que adorava caçar camaleões e tomar banho de igarapé. Ele fazia baladeiras incríveis reaproveitando tubos de PVC. Bastava ter à mão algumas ferramentas, fita isolante e cola de contato para fazer a festa e convidar os amigos para suas caçadas! Seus companheiros inseparáveis eram Tonho, Zeca, Nuno e Teca, a única menina do grupo. Cada criança tinha uma aptidão especial: Joca era bom caçador; Tonho nadava muito bem; Zeca tinha uma força incrível; Nuno conhecia bem a mata e Teca tinha uma memória fantástica, além de conhecer muitas estórias de sua localidade.

Um certo dia, Joca cismou que deveria caçar nas proximidades do Rio das Almas. Mas logo que comunicou o desejo à sua turma, Teca o interrompeu, dizendo:

- Joca, lá não é lugar de caçar! Ali é cheio de bichos do fundo. A cada seis horas, uma porta para as águas profundas é aberta. Meu primo foi encantado uma vez, pois insistiu em tomar banho lá. Era perto de seis horas. Só sei que ele ficou com o olhar perdido, febre alta e sem dizer palavra. O jeito foi chamar a rezadeira para benzer o coitado. Dona Raimunda pegou um ramo de vassourinha e quebrou o encanto.

- Credo, Teca! Só de lembrar desse dia, fico arrepiado! – comentou Nuno, que estava presente na ocasião. O menino ficou trêmulo e confirmou tudo o que Teca disse.

- Bem, só resta arriscar perto do campinho, onde tem aquela mata enorme. O que acham? – comentou Joca.

- Fechado, Joca! – disse Tonho, em tom de empolgação.

No dia seguinte, por volta das quatro da tarde, a turminha se reuniu para caçar camaleões e capturar algumas espécies de insetos. Cada menino levava uma baladeira, enquanto Teca carregava sua mochila e usava uma sombrinha. Todos conversavam animadamente, atentos a qualquer barulho da mata.

Eles andaram muito, mas parecia que não saíam do lugar. Zeca, que era o mais forte, sentiu um pouco de tontura e fraqueza. Tonho sentia dor de cabeça e não aguentava mais caminhar em círculos. Nuno ardia em febre. Joca sentia tremores pelo corpo. Apenas Teca continuava bem. A menina estava desconfiada do que ocorria.

- Teca, ainda tem água aí pela tua mochila? Tira tua garrafinha, se ainda tiver – disse Joca. Eu preciso beber água, estou cansado de andar desse jeito. O pior é que não chegamos a lugar algum.

- Isso é coisa do Curupira, Joca. Ele deve estar aborrecido com as tuas caçadas. Tu sabias que ele é o guardião dos animais e das plantas da mata? Isso é coisa dele, sim! Ele só não me encanta porque tenho o corpo fechado, mas ele é quem causa tudo isso que vocês estão sentindo. Ele castiga quem maltrata a natureza – comentou Teca.

- Ave Maria! Valei-me, minha Nossa Senhora! Agora, ficaremos perdidos aqui para sempre! Égua, Joca, não vou mais caçar nada contigo, mano! Mexer com gente encantada dá nisso! – falava, desesperadamente, Nuno.

- Para piorar, não sei como tirar a gente dessa – disse Joca, cabisbaixo.

- Não esquenta, Joca! Eu estou aqui e sei como tirar a gente desse problema. Só preciso encontrar um cipó. Espera, tem um bem ali! Deixem comigo!- disse Teca.

A menina começou a enrolar o pedaço de cipó, fazendo alguns nós e escondendo as pontas. Joca, achando aquilo engraçado, perguntou se era uma pulseira para o Curupira. A menina explicou que aquele cipó amarrado era uma forma de escapar das travessuras do ser encantado. Segundo ela, o protetor da floresta gosta de ser desafiado a encontrar as pontas do cipó e desfazer os nós.

- Pronto! Agora vou me virar de costas, jogar para trás e todo mundo precisa correr em disparada. Ninguém pode olhar para trás, certo, gente?! – disse Teca, com um certo ar de mistério...

- Corre!!! – gritou Nuno, que estava apavorado.

No meio da correria, Tonho percebeu algumas pegadas no chão. Elas apontavam para outra direção. Foi quando o menino se lembrou de que o curupira tem o pé invertido.

- Meu Deus, o Curupira está por perto!- concluiu Tonho.

Zeca se atrapalhou com as pernas e tropeçou no tronco de uma árvore. Teca correu em seu auxílio. Nesse momento, o menino teve uma visão incrível: Zeca viu o Curupira sentado sobre um porco-do-mato! Aquele ser encantado tinha pés invertidos, cabelos cor de fogo e olhos que pareciam brasas. Teca tapou os olhos de Zeca, enquanto o ajudava a se levantar. Ela avisou que, se Zeca continuasse olhando, ele ficaria doente.

O relógio já marcava seis horas da tarde quando a turma de amigos saiu da mata. Cada menino, mais assustado que o outro, era motivo de muitas gargalhadas para Teca! A menina, que era a mais corajosa daquele grupo, ponderou:

- Aprendam a não desafiar os seres da natureza. Sempre os acompanho nas caçadas para garantir que soltem os animais ao fim da brincadeira. Nunca deixei que fizessem mal aos bichinhos. Saibam que, se tentarem aprontar com a natureza, o protetor dela vai lançar encantos sobre vocês.

Desde aquele dia, em vez de caçadas na mata, a turma preferiu brincar de bandeirinha, cabra-cega, peteca etc. Só quem ainda visita a mata é Teca, pois ela gosta de trançar cipós para brincar com o Curupira.

Maria Cleide da Silva Cardoso Pereira (MCSCP)
Enviado por Maria Cleide da Silva Cardoso Pereira (MCSCP) em 25/10/2015
Reeditado em 26/10/2015
Código do texto: T5426517
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