Peripécias no Natal

Chegara o mês de dezembro e logo nossa mãe iniciara a faina com os preparativos para o Natal.

Meus irmãos e eu éramos crianças e a excitação nos dominava, embora soubéssemos que dificilmente Papai Noel deixaria algum presente nos sapatos que colocávamos atrás da porta, mas sempre havia um fio de esperança. Éramos bons, porém nosso pai só pensava na mesa farta do almoço do dia 25. Não comemorávamos na véspera, dia 24.

O porco que engordara já fora abatido e suas carnes assadas se encontravam na infusão de banha. As linguiças estavam defumando vagarosamente no varal sobre o fogão a lenha. As cidras, figos e laranjas da terra ficavam numa infusão e eram fervidas durante alguns dias para sair o amargor, e depois eram colocadas na calda. Os doces de coco com gemas, ambrosia e suspiros começavam a ser preparados e a esteira onde quarávamos as roupas estava abarrotada de peneiras de taquara com doces para cristalizarem ao sol: mamão maduro, figos e muraba (um doce libanês).

Nossa prima Maria Francisca, de quem eu gostava muito e tinha a minha idade, nove anos, vinha passar o Natal conosco.

Chegou o grande dia, enfim. Nossos sapatos estavam vazios, sem presentes, mas a fartura imperava. Cheiros deliciosos espalhavam-se até a rua – mamãe era excelente cozinheira e fazia tudo no capricho.

O almoço era servido. Os pratos das crianças eram preparados, porque elas não podiam se misturar aos adultos. Muitos vizinhos estavam a postos, sentados à mesa, porque tinham sido convidados.

Como Papai Noel não trouxera presentes, minha prima e eu resolvemos, às escondidas, conhecer uma bebida apreciada pelos homens: Ron Merino. Bebemos, cada uma de nós, um copo cheio, porque não tínhamos noção do seu efeito.

Terminado o almoço e servidos os variados doces, fomos designadas a lavar a louça. Bêbadas como gambás, só sabíamos rir, e a cada risada era um prato quebrado ou uma panela que caía ao chão.

Diante de tanto barulho, minha mãe nos tirou da cozinha e mandou-nos para o quarto. Mesmo assim, não paramos de rir até que nos sentimos mal e colocamos para fora tudo o que havíamos comido e bebido. Ficamos o dia todo enjoadas e o nosso Natal acabou.

Maria Tomasia
Enviado por Maria Tomasia em 10/12/2015
Reeditado em 19/12/2015
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