the pure juice

Sua juventude fora na beira do mar, passava o verão na praia de Torres com a família , na verdade passava mais tempo com o Sol e com o Mar do que com a família....curtia o verão inteiro , e assim, descalço e de cabelos desgrenhados e descoloridos pelo sal e pelo sol viveu os anos dourados da juventude.

Estudou muito, formou-se , amadureceu e formou uma linda família típica de classe alta...

Ele um médico de sucesso,e a esposa de família muito rica.

Numa determinada manhã de março ele acordou com um sorriso enigmático no rosto....

Banhou-se, vestiu-se e desceu até a elegante cozinha da casa para tomar seu café da manhã.

Sua esposa percebera algo diferente, olhou para seus pés descalços e pensou compreender a situação... num tom sereno falou: “é porque compro muitos sapatos que tu estas fazendo isso? É uma espécie de provocação? Quer confusão? É isso?”

...e mesmo antes do homem poder responder ela interrompeu sua queixa , largou seu café e saiu da cozinha deixando-o só e ainda mais pensativo...

Os filhos chegaram, riram daquilo tudo e saíram um para cada lado... cada um para seus compromissos enquanto ele inabalável tomava seu ultimo gole do café.

A velha empregada da família balançou a cabeça sem proferir nenhum comentário.

Levantou-se, sacudiu o farelo de pão da camisa e caminhou rumo ao seu carro...atravessou descalço a grama bem aparada do jardim e sentiu-se livre....

sentia o mundo pulsando sob seus pés...sentia a umidade do orvalho entre seus dedos....arrumou o nó da gravata e embarcou no carro.

Inicialmente parecia bem desconfortável a posição dos seus pés sobre os pedais...gelados e duros...mesmo assim ele encarou o desafio , sabia que era só o inicio de um dia igualmente gelado , um longo dia de trabalho.

Olhava as pessoas nas ruas, todos devidamente calçadas em passos rápidos rumo ao destino de suas vidas...

olhava outros motoristas ,nos semáforos. todos sérios, autômatos conduzindo seus carros.Seguiu....

Estacionou o carro distante do hospital onde trabalhava somente para poder ir caminhando...

Calçadas ásperas, sujas,algumas com fezes de animais,outras com entulho e lixo esparramados,isso o obrigava a caminhar de cabeça baixa, olhando seus pés e o caminho sem poder olhar para frente.

Aquela sensação de liberdade foi sendo superada pela sensação de estar sendo julgado ...

Isso simplesmente emanava dos outros transeuntes quando olhavam aquele homem bem vestido porém , descalço (certamente alguns pensavam tratar-se de uma pegadinha, outros atribuiriam a um possível surto psicótico ou stress)

Um mendigo , igualmente iluminado pelo descaso alheio , sorriu para o homem com seus seis dentes e apontou para cima com seu polegar encardido...ele o compreendia....

No hospital,alguns colegas clínicos e outros tantos cínicos já se reuniam pelos corredores para saber o que estava acontecendo...uns chegaram inclusive a pensar em oferecer alguma medicação..alguma forma de tratamento , ajuda.....ja as enfermeiras riam entre si...os pacientes...pobres pacientes assustados já não sentiam a confiança que ele deveria inspirar..mas mesmo assim ele fez seu trabalho tão bem como fazia em todos os outros dias....

No intervalo do almoço fugiu para uma praça ali perto, queria ter o contato dos pés com alguma superfície natural, areia, queria sentir novamente aquela sensação de poder...de liberdade, voltar a tocar o chão com os pés e deixar sua alma perceber a textura dos grão de terra. Caminhou assim pela praça, correu até seu carro e no caminho arrancou as próprias roupas...foi largando tudo pelo caminho, peça por peça até chegar nu no seu carro, e assim dirigiu até um posto de gasolina e ainda nu de dentro do carro pediu um telefone emprestado para que pudesse ligar para sua casa....

o telefone tocou , tocou...tocou....e tocou....

De sobressalto em casa ,assustado, assim ele acordou, desligou o despertador....a mulher ainda dormia...e com um sorriso muito estranho no rosto ele foi para o banho, vestiu-se , calçou seu melhor mocassim italiano e desceu para tomar o café da manhã...sorrindo e pensativo acariciou seu cão que lambeu sua mão....caminhou até o carro com o mesmo sorriso no rosto....e naquele dia não foi trabalhar....pegou secretamente e sozinho a "freeway" e foi para a beira do mar.....