Segure as pontas
- Capitã Alla Afanasievna Yerzova?
Ao ser chamada, a oficial do Exército Vermelho, peito do uniforme coberto de medalhas (incluindo uma Estrela de Ouro de Heroína da União Soviética), ergueu-se da cadeira no corredor onde aguardava e entrou na sala anônima num dos subterrâneos do Palácio dos Ministérios, em Moscou. Lá dentro, por trás de uma mesa de reuniões retangular, à frente da qual havia somente uma cadeira, estavam sentados três homens em trajes civis, dois na faixa dos 50 anos e outro por volta de 35. Ela não conhecia dois deles, embora um certamente devesse ser um alto oficial da KGB e outro alguém ligado ao Politburo.
- Sente-se, capitã - disse o homem que estava ao centro, ar de professor universitário aposentado, indicando a cadeira vazia. Este, ela sabia quem era: Ludomir Artemovich Chmykhov, coordenador do programa lunar soviético.
- Senhores - ela os cumprimentou, com uma ligeira curvatura de cabeça. E, retirando o quepe da cabeça, sentou-se à frente do trio.
- Creio que já deve me conhecer - prosseguiu Ludomir Artemovich.
Alla Afanasievna balançou afirmativamente a cabeça.
- Camarada Ludomir Artemovich.
O coordenador deu-lhe um sorriso de satisfação.
- À minha esquerda, está o coronel Boleslaw Yurievich Ryabov, da KGB, e à minha direita, o camarada Vadim Victorovich Maksudov, vice-ministro da Defesa.
A capitã inclinou novamente a cabeça para um e outro.
- Encantada - disse calmamente.
- Nós a convocamos aqui hoje, capitã, após termos entrevistado dezenas de candidatas, para compor a tripulação da primeira nave tripulada a descer no lado oculto da Lua. Esta será uma missão exclusivamente feminina... e secreta.
A expressão no rosto de Alla Afanasievna foi de surpresa, mas não disse palavra.
- Deve estar se perguntando o porquê da missão ser composta apenas por mulheres - comentou em tom retórico o coronel Ryabov. - Não podemos lhe dar maiores detalhes antes que nos diga se está disposta a participar da mesma, mas em linhas muito gerais tem a ver com a tecnologia utilizada.
- Eu estou disposta. E a tecnologia deve envolver diamantes da Antártida - foi a pronta resposta de Alla Afanasievna. Os três homens a encararam estupefatos.
- Como ela sabia disso? - Indagou o coronel Ryabov olhando de cenho franzido para Ludomir Artemovich.
- Não poderia saber - foi a resposta.
- Senhores - atalhou a capitã, em seu tom de voz suave. - Vocês estão diante de alguém que trabalhou com os diamantes durante a Grande Guerra Patriótica. E eu me formei em engenharia depois do Armistício; posso somar dois mais dois e chegar à uma conclusão sozinha.
Ludomir Artemovich deu uma gargalhada.
- Bem-vinda ao Projeto Krasnoye Nebo, capitã Alla Afanasievna Yerzova! Precisávamos de alguém como você nesta missão!
- E alguém capaz de matar nazistas, em caso de necessidade - falou pela primeira vez Vadim Victorovich.
A capitã indicou a estrela de ouro no peito.
- Foi exatamente por isto que ganhei esta medalha, camarada vice-ministro.
O burocrata entrecruzou os dedos sobre a mesa.
- Quantos foram mesmo, camarada capitã?
- Confirmados... 316, camarada vice-ministro. Nunca perdi nenhum tiro com o alvo na mira.
Vadim Victorovich riu baixinho.
- O diabo que se compadeça dos nazistas se cruzarem com a capitã no caminho...
- A capitã está sendo modesta - atalhou Ludomir Artemovich. - Foi graças às suas habilidades de franco-atiradora, que segurou praticamente sozinha o avanço de um regimento de infantaria da Wehrmacht, permitindo que nossos rapazes recuassem em segurança e os caças chegassem para dar cobertura.
Sob os olhares de admiração dos três homens, a capitã comentou, modestamente:
- Senhores, eu recebi ordens para segurar as pontas pelo máximo de tempo que pudesse... e segurei.
- [22-12-2017]