Dura Lex, Sed Lex
Spurius Gabinius Aper compareceu à III Pretoria dos Peregrinos de Roma, no dia e hora marcados, conforme havia se comprometido com o reclamante, Aulus Caedicius Bonus. A multa pelo não comparecimento havia sido estipulada em 200 denários. Com as partes presentes, o pretor levantou uma questão de ordem:
- Ambos são cidadãos romanos. Por que trouxeram o caso à Pretoria dos Peregrinos, que cuida dos estrangeiros?
- O acusado está aqui na qualidade de representante de peregrinos, vossa honra.
- Isso é verdadeiro, vossa honra - aquiesceu Spurius Gabinius.
- Que seja, então - retrucou o pretor. - Mas, antes de começarmos com a parte legal, devo indagar se desejam resolver a questão através de juramento.
Perante a expressão de dúvida do acusado, explicou:
- O reclamante desafia o acusado a fazer um juramento aos deuses, em defesa da sua causa. Se o acusado aceitar, ele ganha...
As sobrancelhas de Spurius Gabinius ergueram-se.
- Porém, devo advertir que, se for comprovado que houve perjúrio, as consequências podem ser extremamente severas - concluiu o pretor.
- Eu não vou solicitar o juramento, vossa honra - declarou Aulus Caedicius, encarando o oponente de modo duro
- É uma pena, pois eu nada tenho a esconder - observou Spurius Gabinius com um sorriso irônico.
- Muito bem - atalhou o pretor. - Então, vou proceder a leitura dos nomes dos juízes aptos a examinar o presente caso... lembrando que ambas as partes podem vetar qualquer nome.
Para irritação do pretor, não houve consenso sobre nenhum nome da lista.
- Assim sendo, - retomou o pretor, consultando o horológio de pulso - cabe a mim escolher o juiz.
E, deslizou o dedo pela lista impressa, até parar sobre um nome.
- Nomearei Herius Axius Ruso como juiz do caso.
- Esse não é o juiz daquele caso da falsificação das provas do Senado, vossa honra? - Indagou preocupado Aulus Caedicius.
- Desculpe pretor, mas esse Herius Axius é um dos maiores larápios da magistratura romana... - protestou Spurius Gabinius. - Nem sei como o deixam julgar depois daquele escândalo!
O pretor olhou para ambos com cara de paisagem.
- Ou vai ser Herius Axius ou então juramento. Decidam.
Spurius Gabinius aparentava estar se divertindo com o rumo dos acontecimentos. Aulus Caedicius, por sua parte, parecia sentir dores estomacais.
- Muito bem, vossa honra... eu vou desafiar o reclamado a fazer um juramento.
- Sábia decisão - aprovou o pretor. E, fazendo um gesto de mão para Spurius Gabinius:
- Você tem a palavra. Queira levantar-se.
O reclamado assim o fez. Levou a mão direita ao coração, pareceu concentrar-se no que ia dizer, e então... apontou para o reclamante.
- Utilizo minha prerrogativa de provocado, e devolvo o desafio ao reclamante. Ele deverá jurar pelos deuses que sua causa é justa!
E sentou-se, braços cruzados.
O pretor balançou a cabeça, reconhecendo a esperteza do gesto. Virou-se então para Aulus Caedicius.
- Como se manifesta?
O interpelado não se ergueu, cabeça baixa.
- Não vou fazer o juramento, vossa honra.
- Declaro o acusado livre da presente acusação - sentenciou o pretor. - Caso encerrado.
- [19-05-2018]