o VALE ESQUECIDO

Já se passaram dois anos e ainda me lembro como se fosse ontem..... Cheguei ao vilarejo atraído por um local de paz e solidão...Estava no meio dos Andes, uma cadeia de montanhas que encantavam e nutriam as pessoas, de contos fantásticos e misteriosos.... O Vilarejo em que me encontrava era bastante pequeno. Ficava em um vale esquecido dos demais. Sobrevivia basicamente do artesanato e do turismo local onde pessoas viciadas em esportes radicais e de neve buscavam aventuras.... Área rica em montanhas e cavernas que em grande parte do ano ficam encobertas pela neve e as grandes antenas...Essas sim!!! Digno de nota. São duas grandes formações rochosas que mais parecem antenas e que passam grande parte do ano sob muita neve e é considerada a grande atração daquele vale nos períodos de verão. Durante os dias de muito vento, soa entre elas ruído melodioso que excitam a imaginação do povo local e provocam novas histórias de extraterrestres. Dizem que, através daquelas antenas, seres de outros planetas se comunicam. Se é verdade ou não, ninguém conseguiu provar ainda, mas da aos turistas ingredientes e emoções à parte o que torna a atividade de contador de histórias bem concorrida na região...

Como cheguei ali? Hora, me candidatei a função de cozinheiro brasileiro. Eles estavam precisando e como a oportunidade faz o ladrão, me candidatei e fui aceito. O certo é que já se vão dois anos... A rotina aqui é praticamente a mesma. Com seis meses de muita neve, o vilarejo fica praticamente isolado, apenas alguns “gatos pingados” aparecem perdidos e seis meses entre verão e primavera onde muda pouca coisa. A neve continua, mas de forma mais branda. É ai que aparecem os adeptos por aventuras. As pousadas se enchem de aventureiros em busca de desafios e novidades exploratórias. Mas, a atração mais desejada é a imensa cachoeira que se forma da neve derretida pelo sol no vale abaixo das antenas e que segue despenhadeiro abaixo em grandes corredeiras e pequenos lagos de água corrente nas áreas que inunda. As águas limpas invadem as cavernas no sopé das antenas e com a incidência de luz, propicia um espetáculo de cores variadas devido aos minérios contidos nas formações rochosas. Realmente algo único a se ver por aqui.

Algumas instituições de pesquisas ligadas ao clima, alguns ufólogos atraídos por historias da região e muitos curiosos estão sempre presentes nesse período. É o momento em que “vivemos” , saímos do enclausuramento monastérico e passamos a atualizar informações, interagir com outras pessoas e principalmente buscar notícias de nossos parentes.

Esse ano em particular, foi muito intenso. Já estamos no fim do verão, quando as grandes tempestades assolam a região. Porém, ainda temos um fluxo de pessoas bastante considerável que é bom para os negócios locais.

Esse ano em particular acaba meu contrato. Ando em dúvidas se vou permanecer ou não na região. Nesses dois anos, fiz muitos amigos. Com eles, aprendi a arte da tosa, da modelagem de cerâmica, do trato dos animais, inclusive com imobilização de membros feridos ou fraturados por algum acidente. A região é isolada e não se acha médico. É considerado como artigo de luxo ser atendido por medico. A população local sobrevive de curandeiros, xamãs, parteiras e das tradições dos antepassados. Vida dura mas, rica em vivencias e experimentações com o próximo.

Identifiquei-me com o local, o clima e principalmente com as pessoas nativas. Foram dois anos de muito aprendizado. Talvez me cadastre como guia. Busque outra atividade ligado a pesquisa e exploração. Conheço bem a região, no meu tempo livre explorava os recantos do vale mantendo a forma física e me familiarizando com a paisagem. Fiz ótimos amigos e penso enveredar por esse caminho. Vamos ver..... Por hora vou aproveitar os dias que ainda tem movimento, conhecer mais pessoas e visitar alguns pontos antes que as tempestades cheguem ao vale.

A manha transcorria tranqüila ate que chegou a noticia de uma reunião emergencial que aconteceria logo mais na única cantina que havia na província. Todos os guias e pessoal cadastrado como guias, moradores antigos estavam sendo convocados para essa reunião pelo pessoal da segurança - espécie de polícia responsável pela lei e ordem do vilarejo, além de resgates e busca de desaparecidos. Certamente havia um problema de proporções altas para isso. Não me lembro de nada parecido nesses dois anos de convivência. Em fim, fui como curioso e por me considerar parte da comunidade.

Muita gente já se encontrava no local e o barulho era ensurdecedor. Ninguém sabia mais do que outro e a especulação que circulava era de algum provável acidente. A imaginação do povo era incrível. Desde ao desaparecimento de pessoas ate a invasão de seres de outro planeta surgiam nas conversas dos que ali se encontravam.

Especulações à parte, todos esperavam com grande ansiedade a presença do chefe da segurança para os esclarecimentos. A espera não foi grande. Entrou recinto adentro um homenzinho gordo e baixinho com ar de preocupação e nervosismo. Se posicionou num palanque improvisado para ser visto e ouvido por todos ali.

- Meus amigos!!! Disse o homem. Acabamos de receber um pedido de socorro de uma aeronave que caiu nas montanhas atrás das “antenas”. Não sabemos maiores detalhes, mas no primeiro momento parece que deve haver umas 15 a 20pessoas. Estamos buscando informações das autoridades da capital para nos auxiliar na identificação. O certo é que precisamos formar várias equipes de buscas antes das tempestades chegarem. Aquela área fica muito arriscada e difícil de acessar quando estamos no inverno. O tempo urge.

Formaremos equipes de no Maximo dez componentes o mais rápido possível. Se houver sobreviventes queremos resgatá-los. Vamos montar os grupos e definir as áreas de ação de cada grupo.

Fui movido não sei porque a fazer parte de um desses grupos de busca. Aguardei que as equipes se formassem e me apresentei a um dos últimos grupos a serem definidos. O líder do grupo me aceitou sem maiores problemas. Após uma rápida entrevista passamos a listar os materiais que iríamos levar. Não havia tempo a perder. O nosso líder foi receber as instruções e equipamentos das mãos das autoridades voltando logo em seguida. De posse de alguns mapas e equipamentos de comunicação, o grupo se reunião para os últimos informes. A área estava que nem um formigueiro. As pessoas iam e vinham...Uns iam com remédios, outros com cobertores térmicos, enfim, tudo que foi considerado útil e que estava a disposição no momento foi diligenciado e disponibilizado aos grupos. Saímos para organizar as lhamas e alguns trenós para o inicio da jornada. Ficamos com a parte leste das “antenas”. Sabíamos que o acesso era muito complicado. Teríamos que chegar ao sopé o quanto antes. Era muito arriscado a subida pela aquela parte do monte.

Após os preparativos demos inicio a nossa jornada. Todas as equipes já estavam a caminho e a nossa era uma das ultimas e, portanto, precisaríamos recuperar o tempo perdido. Os veículos nos levaram ate onde era possível trafegar com eles. A partir daquele ponto seria com os animais. Uma jornada de pelo menos duas horas. Estávamos no início da tarde. Se tudo desse certo, estaríamos do outro lado das antenas ao final do dia.

As equipes de policiais montaram acampamento na base da montanha para dar apoio logístico e atuar em caso de alguma eventualidade com as equipes de buscas e resgates.

A hora havia chegado, testamos os rádios, ouvimos as últimas recomendações e partimos confiantes no sucesso da empreitada. Caminhamos rapidamente para o sopé das montanhas em silencio, cada um envolto em pensamentos. Sabíamos que o vento e o frio eram ingredientes que dificultaria a jornada. A subida por si só era difícil.

Como parte integrante da equipe fiquei responsável pela montagem do acampamento assim que chegássemos do outro lado. Faria a tenda para a equipe e mais duas outras para serem utilizadas como hospital de campanha. Ficaria juntamente com o Sebastian, guia peruano e enfermeiro de lhamas nas horas vagas, responsável pela manutenção do acampamento após montagem. Os demais seguiriam vale a dentro em busca dos sinais do acidente.

O Voo saiu no horário previsto. Todos os dezesseis passageiros se encontravam a bordo. Havia ainda o capitão Mendonça, piloto experiente e velho militar reformado. Conhecedor da região e famoso pelas inúmeras missões de resgate nos andes. Seu irmão como copiloto e sócio da pequena empresa de aeronaves e dois funcionários como comissários de bordo. Mendonça depois de dar baixa militar, juntou-se com o irmão que era engenheiro mecânico e especialista em aeronaves, montando a pequena empresa que hoje administravam. Havia pelo menos 10 anos no mercado, sempre levando cargas e pequenos grupos de pessoas interessadas em pesquisas ou diversão. Em alguns momentos participava de resgate de grupos presos na neve ou perdidos nos infindáveis vales que compunham a cadeia de montanhas dos Andes e o qual conhecia tão bem.

Grupo pequeno, estavam de retorno de uma festa chamada de Inti Raymi (Festa do Sol) no Peru que era uma das atrações turísticas de muita beleza e significância para os povos da região. Essa cerimonia era feita pelos sacerdotes Incas ao Deus Sol agradecendo pelas boas colheitas ocorridas e para a fertilidade do solo para as próximas estações. A celebração marca o Solstício de inverno nos Andes. Enfim, o grupo chegou até ele e agora tinha a responsabilidade de conduzi-los ao seu destino em segurança. Piloto experiente, sabia da precariedade do tempo naqueles dias.... As mudanças no vale ocorriam de uma hora para outra e toda cautela era necessária. Estava a todo instante verificando as condições do tempo e verificando as rotas mais seguras e prováveis.

A única rota escolhida fazia uma curva próximo de um monte conhecido na região como “Antenas” e de lá para o vilarejo distante 50 km. Seria a última viagem desse período de verão.

Segundo o líder do grupo, permaneceriam o inverno inteiro no vilarejo, efetuando levantamento folclórico da região. Os levantamentos que seriam obtidos faziam parte de um projeto maior bancado pelo governo Peruano que culminaria em vários documentários. Grupo composto de quatro professores pesquisadores e 12 alunos universitários, vinham com uma serie de tarefas a serem realizadas na região com os nativos... A inda estava pensando como aceitara tamanha responsabilidade. Na verdade, foi forçado a aceitar. Lembra do momento em que agentes do governo foram pessoalmente persuadir a fazer a viagem. Não adiantou as explicações dadas, do perigo real existente em fazer aquela viagem ao vale, indo de encontro inclusive a toda política de segurança pregada pelas agências reguladoras de viagens aéreas. Enfim, poderia perder a licença ou ter algum tipo de entrave com o governo e ai cedeu a pressão. Iria levar.... Acompanhou pensativo os últimos trabalhos de preparação da aeronave, o abastecimento e todos os testes que seu irmão fazia criteriosamente. Admirava o irmão pela dedicação e genialidade. Estava ali, mesmo febril, conduzindo pessoalmente os serviços preventivos da máquina ao invés de descansar para a jornada que teríamos logo mais. Voltou-se mais uma vez aos informes meteorológicos da região buscando qualquer coisa que justificasse o cancelamento do voo. Nada em vão.... No íntimo não se sentia feliz como das outras vezes. Buscava justificar essa apreensão às contrariedades vividas dias antes com os agentes do governo.

- Meu Capitão!!!! Meu Capitão!!! A aeronave está pronta. Ela é toda sua. Boa viagem!!!! Meu irmão sempre me chamava assim... Achava engraçado o jeitão dele, mas nunca perguntei o porquê.... Deixa para lá, é coisa de gente velha....

- Vamos meu velho!!! Vamos botar essa “Ferrari” no ar e terminar logo com isso. Dizendo isso, parti para taxiar a aeronave e pegar os passageiros que já me aguardavam.

Eram 06:30 horas local quando avião levantou voou. A viagem levaria em torno de 4 horas se tudo fosse favorável. Deixaria o grupo no seu destino, abasteceria e retornaria a tempo de tomar uma xicara de chá bem quentinha antes de escurecer.

As primeiras duas horas e meia tudo normal, calmaria até demasiada. Pessoal dormindo ou lendo. Apenas uns dois estudantes olhando a neve por entre as montanhas. As coisas começaram a ficarem difíceis quando entramos no que chamamos de “corredor” que nada mais era que um grande desfiladeiro que teríamos que atravessar. Nessa época do ano ventos em turbilhões variam o desfiladeiro causando uma serie de transtornos desde os deslizamentos de neve até nebulosidade em função da própria neve lançada ao ar e a incidência dos raios solares. Essa combinação tornava a travessia perigosa.

- Atenção senhores passageiros!!! Aqui quem fala é o seu capitão. Estamos passando por área de turbulência, portanto, apertem os cintos e aguardem novas instruções.

No início, as vibrações eram suaves e dava para controlar o leme sem grandes esforços, mas após 30 minutos de aparente tranquilidade as coisas foram ficando mais difíceis exigindo novas medidas preventivas do piloto. Na sequência, como se não bastasse o vento, um ruído estranho na asa direita denunciava um comportamento não muito bom do motor. Se o motor aguentasse mais um pouquinho, chegariam ao destino apenas com o susto provocado pela turbulência. Ao longe já se vislumbravam as antenas e agora era uma questão de tempo. Por via das dúvidas iria disparar o alarme e deixar o sistema de navegação triangular a localização. Vamos lá… Mais vinte minutos, só mais vinte minutos para sair desse túnel de vento... Precisava de tempo para avaliar melhor os estragos do motor da asa direita.

De repente um ruído ensurdecedor se fez houvir no lado direito. O motor estava em chamas!!! Os passageiros, todos, assustados não sabiam como proceder. As instruções eram dadas pelos tripulantes aos gritos.

Estávamos perdendo altitude e havia com isso o perigo de colisão. Situação nada boa...

Já estava bem próximo das antenas e precisava encontrar lugar para aterrisagem forçada. Não havia como continuar mais.... Jogaria a aeronave em uma planície que existia logo após as antenas. E para isso teria que passar entre elas e torcer para não pegar nenhum pedaço de rocha.... Não tinha mais nada a fazer.

- Senhores passageiros, posição de impacto, faremos aterrisagem forçada.... Ao mesmo tempo abriu canal de emergência solicitando socorro e informando possível local de pouso.

De olho na altitude e na velocidade da aeronave, buscou alinhar por entre as antenas e lançou-se à frente....

Estávamos chegando à metade da subida. A equipe de resgate ainda se mantinha em fila indiana. O nosso líder, constantemente nos obrigava a mudar de rota em função do acumulo da neve e da possibilidade de pequenos deslizamentos. Não me preocupava com o cansaço, mas pela sensação térmica baixa que o vento que passava por ali trazia. Já havia mais ou menos uma hora que o vento tinha retornado e causava entre outras situações a baixa visibilidade. Para se ter ideia, estávamos separados uns dos outros a alguns metros e já era difícil enxergar-nos.

O que veio a seguir nos deixou sem muitas opções. De alguma forma, um pedaço de rocha se desprendeu e veio rolando monte abaixo trazendo consigo muita neve. Não tivemos muito tempo para nos protegermos. Nos posicionamos da melhor forma que podíamos e esperamos as coisas serenarem. Minutos se passaram como se fossem horas. No início, foi muito difícil manter o equilíbrio, estava semi encoberto pela neve, mas sem nenhum tipo de lesão ou danos. Não sabia sobre os outros. Havia um silencio muito grande só quebrado pelo vento e pela rocha que descia despenhadeiro abaixo. Um dado momento o silencio foi quebrado pelo acionamento do rádio. O líder fazia a chamada do grupo um a um. O Manoel foi o único que não respondeu de imediato. Manoel era um Venezuelano que viviam no vale a mais de 15 anos trabalhando como guia nas cavernas, no período de verão. Ele demorou um pouco mais a responder. Durante a passagem da avalanche, tinha perdido os equipamentos que levava e de quebra, havia sido lesionado no ombro, não sabendo da gravidade da situação. Em face da nova realidade, fomos forçados a efetuar uma parada para verificação.

Faltava muito pouco para alcançar a trilha que levaríamos ao outro lado. A lesão do Manuel não era algo grave mais limitava os seus movimentos. Ficou então decidido que terminaríamos a subida montaríamos acampamento na área coberta após a trilha. Ficaríamos eu, o Sebastian e o Manuel, nas atividades de montagem das tendas e aguardaríamos a equipe abrigados. Não havia condições de descer naquele momento para o sopé das antenas.

Levamos em torno de 45 minutos para vencer o restante do trajeto. Nova avaliação foi feita no ombro do Manoel e redistribuído os equipamentos que seriam levados pelo grupo vale abaixo. Ficamos então, recuperando o folego para iniciar a montagem das tendas. Sebastian analisou o paredão procurando melhor ponto para a montagem.

Levamos pelo menos duas horas na montagem. Estávamos mais protegidos dos ventos e do frio lá fora. Um pequeno aquecedor a bateria foi ligado mantendo uma temperatura mais agradável. Montamos também uma antena adicional para que as transmissões do rádio tivessem melhor recepção. Espalhamos pontos de luzes para servirem de sinalizadores ao redor das tendas montadas. Agora era esperar...

Manoel continuava sentindo o ombro. Mas mesmo assim, postou-se na frente do rádio atento a qualquer chamada. Não havia no momento como descer com ele e isso o distraia. Tivemos a perda de equipamentos durante a avalanche e muitos suprimentos, inclusive medicamentos ficaram perdidos nas mochilas. Se tudo desce certo, ao amanhecer, teríamos condições de localizar e tentar resgata-las. Agora era descansar e aguardar...

O descanso não durou muito, o rádio começou a emitir sons de alguém pedindo socorro. Não era na mesma frequência do canal da equipe de resgate e isso nos intrigou. Será que era o pessoal do avião? Ou alguém em dificuldades? Manoel tentava estabelecer o contato para desvendar o mistério....

- Identifique-se senhor!! Qual a sua localização? Repetia sem sessar...

- Socorro!!! Est... ou dentro da fenda... Aval... nos pegou ... descida.

A mensagem repetia sempre com interrupções e muita estática. Definitivamente, alguém estava em apuros e não era pessoal do avião.

A fenda era justamente o desfiladeiro que separava as duas antenas. Esse espaço era constituído de muitas reentrâncias que davam em cavernas naturais sob a montanha. Durante as nevascas ficavam com muita neve e a maioria encobertas. Qualquer um que estivesse ai , teria muita dificuldade de retornar à superfície sem ajuda externa.

- Qual sua localização!!! Insistia o Manoel pelo rádio. Você tem sinalizador? Cambio?

Silencio total... .- Estou na fenda!!! Tenho sinalizador!! Estão me ouvindo? Tenho sinalizador!!!!

- Estamos lhe ouvindo!!! Estamos no topo da montanha!!! Dispare sinalizador para que possamos localiza-lo!!!!! Cambio...

- Certo!!! Certo!!! Vou tentar!!! Cambio!!!..... Minutos de silencio preencheu o espaço em que nos encontrávamos. Havia alguém precisando de ajuda!!! E pelo jeito não era o grupo do avião. Havia mais gente em dificuldades....

O primeiro a reagir, foi o próprio Manoel.

- Vamos pessoal!!! Vão lá para fora, se aproximem da fenda e vejam se localiza a luz do sinalizador. Continuarei tentando contato. Avisarei ao pessoal o que se passa. Dizendo isso, mudou a frequência e tentou estabelecer contato com a base e com o grupo ao qual pertencíamos.

Após alguns instantes, Miguel conseguiu contato com o grupo na base da montanha informando o que se passava. Cientes da nova situação, passaram a monitorar de baixo o vale que se estendia entre as antenas, em busca do clarão que o sinalizador deixaria. Sabiam que seria muito difícil enxergar com toda aquela nevasca provocada pelos ventos, mas ficariam alerta. Enquanto isso, Eu e o Sebastian nos posicionávamos melhor pelo alto em busca do sinal.

Não demorou muito e o próprio Sebastian alertou para uma luz tênue que escapava de uma reentrância das rochas logo abaixo onde estávamos. A nevasca não deixava enxergar direito, mas dava para ver claramente o ponto em que a luz escapava. Muito provavelmente, era uma das tantas cavernas existentes por ali. Marcamos a posição e retornamos para a tenda em busca de orientações...

- Encontramos a posição. Precisamos buscar ajuda, não dá para chegar lá sem descer o paredão!! Foi logo dizendo o Sebastian assim que entro na tenda.

- Tornei a falar com ele pelo rádio. Disse o Miguel. Ele e mais dois outros alpinistas estavam descendo quando foram pegos por uma avalanche e lançados abaixo. Os outros dois ele não sabe onde estão. Ele está com o tornozelo machucado e não pode andar. Vamos conversar com a cada uma hora para economizar a bateria.

O Rádio começou a emitir sinais!!! Alguém estava tentando se comunicar….

- Atento Miguel!!! Líder um chamando!!!!Responda!!!

- Líder um!!! Aqui é a base!!! Estamos com chamado de socorro na fenda!! Alpinistas em dificuldades!! Requerem assistência!!! Precisamos de ajuda!!

- Base!! Localizamos aeronave!!! Informar ao comando central!!! Comunicação ruim por aqui!!! Preparar para receber equipe de socorro para o auxílio por aí. Montaremos tendas para atendimento local dos acidentados!! Novo enforme breve!!!

Miguel prontamente repassou os informes ao Comando Central e pediu verificar possibilidade de apoio aos alpinistas sinistrados.

A resposta do Comando Central era que já havia sido deslocada equipe para a base das antenas. Montariam acampamento e de lá, acessariam as cavernas na tentativa de localizar os alpinistas logo nas primeiras horas do dia. Seria um trabalho muito ariscado principalmente pelo fato de ser início do inverno na região.

A aeronave estava trepidando bastante o que dificultava a manobra a ser feita. O comandante concentrado nas alternativas mal tinha tempo de pensar. Com muita dificuldade lançou-se por entre o vão dos dois montes, mas o equipamento não respondia bem. Iria inevitavelmente chocar-se em uma das antenas. Não havia como evitar o impacto... numa tentativa mais arrojada promoveu pirueta fazendo com que a aeronave desce um giro de 360º sobre si mesma numa tentativa de evitar a colisão. Perderia em altitude, mas evitaria o contato direto com as rochas. Assim procedeu num movimento quase que instintivo.

A manobra ousada pegou todos desprevenidos. Foi um festival de coisas voando dentro da aeronave e indo de encontro aos passageiros que não podiam fazer nada naquele momento. Gritos de dor foram ouvidos... O comandante não podia fazer muita coisa. Torcia para os estragos serem os menores e que todos saíssem bem ao final.

Manobra feita, consegui passar pelas antenas... agora era encontrar campo para pouso. Isso se deu três quilômetros à frente.... Não havia mais alternativas... Era pousar ou pousar.... Assim o fez... Lançou de forma controlada a aeronave na grande trilha de neve que se apresentava. Não podia saber o que tinha por baixo. Lembrava vagamente de uma velha estrada que havia na região e que durante boa parte do ano ficava encoberta pela neve. Torcia que estivesse nela... Desceu de barriga e como podia tentou manter o controle até a parada total. O ruído era ensurdecedor, os gritos dos passageiros também... os minutos pareciam longos demais. Por fim paramos.... Seguia-se um silencio que dava para ouvir as batidas dos corações descompassados... sentia dores fortes nos braços e um pequeno corte no supercilio esquerdo, fruto de algo que o acertara durante as manobras. Hora de avaliação geral. Contabilizar os danos e verificar situação dos passageiros.

A aeronave resistiu bem. Havia uma fissura na parte central deixando à mostra parte do céu. O vento se fez presente no ambiente interno. A confusão era muito grande

Coisas espalhadas por todos os lados. Haviam pessoas machucadas, mas no primeiro momento, todos vivos!!! As pessoas quase que simultaneamente começaram a falar e a pedir ajuda. Precisava tomar logo a frente da situação para não perder o controle.

Precisava avaliar a situação e verificar se o pedido de socorro foi ouvido pelas autoridades locais....

Manoel era guia Peruano e experiente apesar da pouca idade. Estava à frente de grupo de dois pesquisadores na parte alta das antenas. Haviam retornado de área de pesquisa e tinham que descer os montes antes do anoitecer. A ventania tinha piorado nas últimas horas e a quantidade de neve deixava pouca visibilidade. A preocupação era com a quantidade de neve que se acumulava no topo, deixava a trilha muito perigosa e suscetível a deslizamentos. Todo cuidado era pouco. A descida se dava em fila indiana e muito lenta. Todos estavam amarrados uns aos outros, guardando distância segura para eventualidades.

A todo instante Manoel olhava para o tempo na tentativa de enxergar melhorias. Estava preocupado. A parte que se encontravam era muito íngreme e bordeava o despenhadeiro. Abaixo haviam cavernas nas várias saliências que existia. Um desequilíbrio, poderia joga-los na fenda o que seria lamentável. Já faziam alguns minutos que ele olhava para o céu, tentando compreender um ruído que ouvia. Não sabia ao certo de onde vinha. Parecia ruído de algum motor. Mas onde? Parecia que almentava... Mas o vento não deixava precisar onde... A impressão que dava era que algo se aproximava ou estava caindo sobre suas cabeças... Mas olhava, olhava e não via nada.... Como medida de segurança, solicitou ao grupo que buscassem ficar atentos a qualquer situação que fugisse da normalidade...

Continuaram a descer e de tempos em tempos paravam para escutar o ruído......Agora estava mais forte. Definitivamente, algo vinha de cima para baixo... não era imaginação!!! Avia algo se aproximando... uma aeronave!!! Gritou um dos pesquisadores. Uma aeronave e está vindo por cima de nós!!! Estão em dificuldade!!!

Vendo a cena diante dos olhos, o guia Manoel, gritou aos integrantes que buscassem abrigo, enquanto ele tentava de forma rápida, prender a corda em algo solido. Sabia que se não houvesse colisão da aeronave na parte superior onde estavam, por certo faria desprender neve que poderia desceria sobre eles.... Tinha que ser rápido se quisesse ter chance de sobrevivência....

Por um milagre ou perícia do piloto, ou até mesmo ambos, o avião não se chocou. No último momento deu uma volta sobre si mesmo e passou por entre as colunas rochochas das antenas seguindo adiante em sua trajetória acidentada. Mas, na sequência, boa quantidade de neve foi deslocada começando sua descida montanha abaixo.

Não havia como escapar daquela avalanche de neve que principiara montanha abaixo. A solução mais louca, seria buscar abrigo em alguma das cavernas cujas entradas estavam no precipício ao lado. A reação foi quase automática. Todos estavam com o mesmo pensamento.

Após prender a corda em uma formação rochosa próximo da borda, tentariam lançar-se no precipício na tentativa de alcançar alguma caverna no nível abaixo...Era a única solução!!! Tinham que ser rápidos. A avalanche estava chegando......e assim o fizeram...

Desceram muito rápidos,

A corda que servia de sustentação chegou a queimar o rosto de um dos integrantes dada a velocidade que descia... mesmo assim não sentia nada.... a situação anestesiava a situação.... Estavam quase alcançando a borda de uma das tantas cavernas do rochedo quando a neve chegou. Foram lançados como marionetes com violência de encontro ao paredão. A corda não resistiu à força e se rompeu lançando os alpinistas em queda livre em direção a uma saliência natural que havia metros abaixo de onde eles estavam. Caíram e lá ficaram imóveis sem forças para se movimentar…estavam vivos, e isso era o mais importante….

O grupo já havia caminhado pelo menos umas duas horas desde que haviam saído do acampamento. A equipe estava reduzida, pois ficaram três responsáveis pela montagem das tendas de atendimento e montagem da antena de rádio. O Miguel ficou responsável pelos trabalhos no acampamento e já havia se comunicado informando outras notícias não esperadas. Obtiveram informações de haver pessoas em dificuldades no paredão. Não havia como retornar para ajudar. Estava já noite e a falta de luz poderia induzir a erros. E isso poderia custar caro... além do mais, estavam próximos da aeronave sinistrada pois, durante o trajeto, foram encontrados pequenos pedaços que sugeriam ser dela.

De repente, alguém do grupo à frente gritou!!! – Tem uma luz piscando ali adiante!! Vejam!!! Parece um sinalizador da calda do avião!!! Achamos!!! Manda mensagem para o pessoal.....

O cansaço acumulado por conta da caminhada exaustiva por encanto havia desaparecido no rosto daqueles homens.... Realmente haviam encontrado a aeronave... restava saber como estavam os passageiros….

As outras equipes receberam a informação sobre a localização do avião e estavam em curso também. Logo, logo teríamos um grupo suficientemente grande para poder atuar melhor no socorro aos acidentados....

O comandante da aeronave, juntamente com dois professores passaram a atender e avaliar o restante dos passageiros... A maioria teve apenas escoriações e cortes que não preocupavam... Dois estudantes com fratura na perna e outro no braço eram os que requeriam maiores cuidados. Os demais estavam mais assustados do que machucados.

Após os serviços de atendimento aos passageiros, o capitão como era conhecido, passou a avaliar os estragos do avião. Havia uma fissura no meio da aeronave, por onde entrava uma quantidade generosa de ar gelado, não via a cauda. Acreditava ter perdido parte dela durante os primeiros contatos com o solo. A asa esquerda parcialmente destruída e a direita inexistente…Do lado de fora, apesar da pouca luminosidade, podia verificar que se encontrava em área plana. Não corriam riscos iminente. Por hora era montar um sinalizador, usando a bateria do avião para que as equipes de resgate os enxergasse e tratar de colocar o rádio de novo para funcionar.

Homem de muita fé, não cansava de agradecer pelo bom desfecho... considerava intervenção divina o fato de terem sobrevivido à queda sem óbitos... um verdadeiro milagre!!!

Manoel, após o descanso tentou levantar para avaliar a situação em que se encontrava. A avalanche já havia passado e tudo voltara a silenciar. Sentia fortes dores pelo corpo, não conseguia respirar direito. Achava ter partido algumas costelas. Olhou para o lado e localizou um dos pesquisadores sobre sua responsabilidade. Estava imóvel... com dificuldade se arrastou até onde ele estava e constatou que o mesmo estava inconsciente, mas respirando. Devagar fez a verificação em busca de fraturas, mas aparentemente não havia. Isso lhe deixou um pouco mais tranquilo. O segundo pesquisador, não conseguia encontrar. Não estava no seu campo visual e nem na saliência em que caíram. Procurou as mochilas e também não encontrou. A corda que os unia estava rompida... não havia como saber o que houve. Não tinha como solicitar ajuda... os rádios ficaram nas mochilas e os sinalizadores também... teria que aguardar amanhecer para identificar melhor onde estavam e o que poderia ser feito... retornou com muita dificuldade para próximo do companheiro inconsciente e buscou aquecimento da melhor forma possível.

Sem comunicação e lesionado, seria muito difícil sair dali. Essas cavernas se comunicam, mas para descer teriam que ter equipamento de alpinismo e bom preparo físico. Não dava para descer como se encontrava. A sorte é que estava vivo e havia um possível acidente com um avião na parte de cima dos montes o que certamente traria grupos de resgate. Trataria de economizar energia para o amanhecer…Era o que podia fazer no momento...

Manoel adormeceu vencido pelo cansaço e pela dor, vindo a acordar desperto por clarão que subitamente invadiu a área em que estava... levou um tempo para compreender o que estava ocorrendo... Alguém havia acendido sinalizador... bem no nível abaixo onde ele se encontrava. Isso reacendeu a esperança de ser encontrado. Certamente alguém estava por ali. Não estavam sozinhos.... Olhou para o companheiro inconsciente e verificou se estava respirando normalmente. Depois voltou a se recostar da melhor forma possível. Sentia muitas dores por conta da lesão.

Ainda era madrugada quando no acampamento montado chegaram as equipes de resgates que informadas do sucedido, vieram iniciar as buscas e salvamento dos alpinistas. De uma hora para outra, o silencio foi trocado por murmurinhos de pessoas falando quase que simultaneamente. Estavam cansados, mas sabiam que não era hora para pensar nisso.

Sebastian e eu nos oferecemos a levar o grupo onde possivelmente estavam os alpinistas acidentados. Na noite anterior, o Sebastian havia marcado o ponto onde poderiam estar.

Fizeram uma rápida refeição e uma parte do grupo composto de seis pessoas além de mim e do Sebastian, iniciaram a descida. O dia estava raiando com o céu claro e limpo. Bem diferente do dia anterior. Não demoramos muito a alcançar a borda do precipício... seria uma descida vertical até as cavernas abaixo. Dividimos o grupo em dois, ficando um responsável pela descida pela trilha, até alcançar as entradas das cavernas e outra desceria de rapel. Fiquei no segundo grupo. O da trilha, enquanto que o Sebastian ficou no grupo, de rapel.

A base por sua vez, estava com equipe dedicada a subir, partindo do sopé das antenas no sentido inverso ao nosso. A ideia era de fazer um pente fino e trazer quem estivesse em dificuldades por lá.

O Capitão deu uma última olhada para o céu escuro antes de retornar para o interior do avião. Fazia bastante frio. Era hora de recolher-se junto aos outros e aguardar…ao longe pensou ver luzes. Não era possível, luzes!!! A imaginação estava lhe pregando peças!!! Não!!! Eram luzes mesmo.... Alguém estava vindo em sua direção...após alguns minutos, Já conseguia visualizar parcialmente o grupo que se aproximava. Era pequeno mas enchia de alegria saber que haviam grupos de busca pela região. Por certo logo outros apareceriam.

Assim que chegaram foram recepcionados pelo capitão que os deixou a par da situação facilitando o entendimento da realidade existente ali. De posse do rádio, foram feitas as transmissões informando sobre a situação encontrada no local e logo depois, foram feitas as avaliações clinicas dos passageiros. Feitas as intervenções nos acidentados de maior gravidade, medicado os demais, todos foram preparados para no amanhecer, serem removidos em direção ao vilarejo mais próximo. Descansariam por hora, esperando outras equipes chegarem para iniciar remoção do pessoal.

O amanhecer veio recheado de alivio pelas horas de dificuldades passadas até então. Grupos de resgates chegavam ao local e isso trazia um novo ânimo a todos. O local fervilhava de pessoas e pequenas maquinas de transporte de carga. As providencias estavam sendo tomadas e, logo, logo, todos deixariam o local em segurança. Por ali, não havia mais nada a fazer.

O capitão deu uma última olhada para sua aeronave e exclamou pensativo.... Está na hora de me aposentar!! Não tenho mais idade para aventuras desse porte!!! Voltou-se para a tenda improvisada e ficou aguardando a retirada dos passageiros por parte das equipes de resgate. Teriam uma longa estrada a percorrer...Antes de sair por definitivo, deixou o sistema de sinalização ativado e o rádio em stand by para alguma necessidade....Nunca se sabe quem vai aparecer precisando de ajuda....

A descida pela trilha até o ponto que permitisse deslocamento seguro para as cavernas não estava sendo muito fácil. A neve solta, constantemente, provocava deslizamentos pelo simples fato de passarmos pela trilha, o que tornava arriscada e lenta a nossa jornada.

Não menos diferente eram os que optaram por descer de rapel. Sebastian estava já a algum tempo nessa descida e não havia dado indicativo de ter alcançado os alpinistas. Não nevava como antes, mais o vento ainda era forte. A descida era lenta e cuidadosa...

O outro grupo, o qual fazia parte, não tinha também avançado muito. Só no meio da manhã, alcançamos uma das entradas de acesso ao grupo de cavernas.

Estávamos nos preparando para entrar em uma delas, quando o rádio anunciou terem encontrado dois dos três alpinistas presos, em reentrância do rochedo. Sebastian informava estar tentando alcançar a borda onde estavam. Paramos as atividades e ficamos acompanhando atentamente as comunicações pelo rádio.

Finalmente após algumas tentativas, o Sebastian conseguiu alcançar a borda. Fixou os cabos guia que trazia e foi ao encontro dos dois que se encontravam mais adiante encostado na parede. Manoel olhava para o amigo com alegria.

- Só você mesmo Sebastian!!! Que alegria em vê-lo!!

- Calma meu velho!!! Você acha que ia lhe deixar por aqui? Nem pensar... deixa dar uma olhada em você... após alguns minutos constatou que haviam costelas quebradas e, portanto, precisava de imobilização. Verificou o outro alpinista que se encontrava acordado, mas sem poder se mexer muito por conta de alguma lesão na cervical. Passou os informes aos demais socorristas e aguardou a descida de dois deles trazendo os equipamentos necessários para imobilização.

Após alguns minutos, os dois chegaram e iniciaram os procedimentos de imobilização dos dois acidentados. Eles seriam içados para local de transbordo, preparado acima do paredão. Enquanto os dois estavam sendo medicados, o Sebastian averiguava onde poderia estar o terceiro alpinista. Deslocou-se para próximo da borda e fixou olhar longo e cuidadoso no desfiladeiro abaixo. Havia já um bom tempo que não tinha informes pelo rádio a respeito dele. Não demorou muito tempo e localizou do outro lado do desfiladeiro, as mochilas e resto de morteiros que provavelmente foram usados na noite anterior para sinalizar a posição. Apesar de não visualizar o alpinista, mas sabia onde procurar. Avisou pelo rádio a situação dos dois que havia socorrido e informou a posição do terceiro. Decidiu ficar e aguardar a retirada do amigo Manoel e do pesquisador acidentado. Auxiliou na imobilização dos dois acidentados nas macas cesto e acompanhou a subida dos dois, paredão acima. Precisava controlar periodicamente a corda guia por causa dos fortes ventos, evitando assim que houvessem oscilações fortes que viessem a trazer perigo para o grupo. A tarefa exigia grande esforço do Sebastian que em alguns momentos suava, mesmo com a temperatura no entorno dele ser baixa. A tarefa de içamento dos acidentados levou mais de uma hora. Ao final, o velho socorrista e guia se encontrava extenuado pelo esforço desprendido, mas gratificado pela tarefa ter sido um sucesso. Deitou por alguns minutos e deixou que o silencio fosse seu companheiro ate que o rádio o chamou....

-Sebastian!! Atento Sebastian...

- Na escuta base!!!

-Estamos sendo alertados de possível tempestade vindo em nossa direção. Se posicione para retirada emergencial.

- Mas o outro rapaz!!! Ele está a alguns metros abaixo de onde me encontro. Do outro lado do rochedo!!! Não vamos resgata-lo? Cambio...

Após breve momento de indefinição, novas instruções são dadas.

- Vamos iça-lo e aguardaremos instruções... não é seguro ficarmos por aqui... se posicione…cambio...

- Não posso sair agora!! Não vou deixa-lo lá!! Vou tentar chegar ao outro lado do rochedo e ficarei com ele, aguardando o tempo melhorar para ser resgatado. Cambio e desligo... com passos firmes Sebastian se dirigiu ao rochedo onde estava na busca de ponto de fixação de suas cordas para tentar alcançar os níveis abaixo, onde seria possível alcançar o terceiro alpinista acidentado. Teria que ser rápido!!! O tempo logo, logo impediria que ficasse pendurado. Era preciso ser ágil... encontrou sem muito esforço, local de fixação das argolas. Revisou rapidamente o material que seria levado, deixando de lado os itens que não seriam necessários para aquele momento. Evitaria transportar pesos desnecessários.

Enquanto isso, na parte baixa, acompanhava todo o dialogo entre a central e o amigo. Recebi a mesma mensagem que ele, e lutava também com a possibilidade de deixar o posto por conta da tempestade. Por outro lado, não podia ficar onde estava... Haveriam deslizamentos e seria atingido.

Após momentos de indefinição, tomei coragem e fiz comunicado a central.

_ Central, Atento Central!!! Estou me posicionando para entrar em caverna logo abaixo do suposto ponto de coleta do alpinista acidentado. Estou com material para montar tenda de sobrevivência para o resgate. Quanto tempo tenho?

- Estamos estimando cerca de duas horas!!! Muito pouco tempo para vocês entrarem, montarem e saírem... Abandonem a missão e retornem a base, cambio!!!

Meu companheiro se virou e decidiu retornar. Olhou-me como que implorando para acompanha-lo. Acenei positivamente e dei o indicativo que permaneceria. Fiquei a observar seu deslocamento ate não poder vê-lo mais. Após alguns minutos voltei as atenções para o rádio.

-Central, entrarei na caverna e montarei a tenda de sobrevivência. Ficarei lá para apoio. Local é seguro e protegido. Se houver deslizamentos durante a tempestade , não alcançará o ponto em que estarei. Ficarei no aguardo do Sebastian para apoio se necessário. Cambio e desligo...

Não podia perder tempo. Estava com muitos equipamentos e tinha que colocar para dentro da caverna que se apresentava à frente. Estava sozinho e a trilha a ser percorrida não era fácil...

A tempestade veio sem avisar, estava na metade do caminho para a caverna e carregava a ultima mochila de equipamentos. As demais já haviam sido colocadas na câmara escura da caverna, onde montaria o posto de atendimento emergencial. Não tinha ideia de quanto tempo havia se passado. Mas o fato era que a tempestade veio e com ela ventos que só não me deslocavam por conta do peso que carregava. A visibilidade diminuía a passos largos. Vez por outra , pequenas quantidades de neve eram deslocadas e caiam em profusão à minha frente obrigando-me a parar e me proteger. Sabia que tinha que apertar o passo por conta das condições que só pioravam. Torcia para que o Sebastian já estivesse com o alpinista me aguardando em algum lugar acima do ponto em que estava. Sabia que a sobrevivência dele dependia da habilidade do Sebastian e dos recursos que levava comigo. Enfim, vencida a distância que me separava do ponto escolhido para montagem da tenda, cai extenuado pelo esforço. Não sei precisar por quanto tempo. Não sei mesmo se cheguei a dormir... Fui chamado a realidade por um forte estrondo vindo de cima. Era uma avalanche que chegava e com ela toneladas de neve. Tudo ficou escuro de repente, e me fez lembrar da necessidade de montar os equipamentos de sobrevivência. Acendi lanternas a bateria e iniciei a montagem das tendas de sobrevivência...

Sebastian já havia transposto boa parte do despenhadeiro a sua frente, pendurado pelas cordas. Estava a pelo menos uns 50 metros do ponto em que havia percebido movimento. A tempestade também o alcançou e fez dele um boneco lançando-o perigosamente para cima das rochas que o circundavam. Alpinista experiente sabia que estava correndo grande risco. Tinha que alcançar o mais rapidamente possível a pequena base que se apresentava a sua frente. De repente uma das argolas de sustentação se desprendeu e ele foi jogado com violência de encontro ao paredão. Não podia fazer mais nada a não ser aguardar o impacto com a rocha. Assim ocorreu e por alguns minutos, ficou atordoado pelo choque. Sentia dor aguda no ombro esquerdo e na cabeça, mas, estava consciente e com os movimentos em perfeitas condições. Tornou a olhar para a base pensando em montar ponto novo de sustentação cortando a corda que o prendia ao ponto antigo ou se lançava em queda livre cinquenta metros abaixo. Teria que ter muita sorte para cair sobre a base logo abaixo dos seus pés. Por certo a neve amorteceria a queda. Tinha que decidir rápido. Não podia ficar como estava. Optou por montar ponto novo de sustentação cortando o ponto anterior. Iria concluir a descida apenas suspenso por essa argola... Assim o fez e ao chegar a dez metros de distância a argola que o prendia se soltou jogando-o em queda livre sobre a base. O impacto foi amortecido pela neve, mas mesmo assim causou dores principalmente no ombro machucado. Ficou alguns minutos recuperando o folego para depois se mover, indo em direção ao interior da caverna que se apresentava a sua frente.

À medida que adentrava na caverna, a dificuldade de visualização se tornava maior. Em dado momento, foi necessário ligar a lanterna. Buscava avidamente encontra o alpinista acidentado. Sabia que a situação dele não devia ser muito boa. Exposição ao frio e limitação dos movimentos por conta provavelmente dos machucados em virtude da queda. O Espaço interior era muito amplo e com muito cuidado buscava iluminar seguindo um critério para não passar pelo alpinista , que naquele momento poderia estar inconsciente.

- Olá!!! Tem alguém aí? Insistia na pergunta a cada movimento, se esforçando para ouvir e enxergar qualquer coisa fora do normal. O ombro e a cabeça lhe incomodavam, mas ele não tinha tempo de pensar nisso. Precisava localizar rápido o acidentado. Alguns minutos se passaram ate que visualizou o que poderia ser o rapaz acidentado. Se aproximou, cuidadosamente e percebeu que estava respirando fracamente apesar de inconsciente. Sabia o que o tempo estava contra eles. Colocou a manta térmica sem perda de tempo. Teria que aquece-lo. Não sabia qual a extensão de seus ferimentos e temia remove-lo da posição com ele ainda inconsciente. Montou a pequena tenda que trazia na mochila instalando as lanternas para poder iluminar melhor o local.

Olhou-se no espelho. Estava com a aparência horrível. Havia um pequeno corte acima do supercilio. Nada que preocupasse!! O ombro ainda doía e limitava alguns movimentos. Iria precisar de ajuda para socorrer o rapaz. Buscou o rádio, tentando estabelecer comunicação com a base. Sabia que lá fora o tempo não estava para brincadeira e muito provavelmente não teria sucesso!!!

- Base Cambio!!! Chamando base.... Encontrei o alpinista acidentado!!! Necessário ajuda para remoção!!! Difícil avaliar situação!!! Tentou varias vezes a comunicação, sem retorno aparente da base .... Havia muita estática!!! Torcia que pelo menos tivessem ouvido sua transmissão. Por hora, não havia muito a fazer. Precisava também descansar. Tentaria comunicação em outro momento...

As tendas foram montadas e agora, com o ambiente iluminado, buscava avaliar a situação que se apresentava à minha frente. A avalanche havia selado a entrada da câmara. Aparentemente não havia como sair por ali. Teria que buscar outras saídas. Por sorte já tinha estado em outra ocasião por ali, acompanhando grupos de exploradores. O próprio Sebastian havia dado instruções sobre aquele complexo de cavernas. O silencio era assustador...

De repente sons vindos pelo rádio. Entre a estática e ruídos, mensagens sendo transmitidas. Não dava para precisar direito. Parecia que o grupo lá fora estava passando dificuldades. E deviam estar mesmo. A tempestade veio forte!!! Em algum momento pareceu ouvir o Sebastian informar ter encontrado o alpinista acidentado. Sabia que ele se encontrava em algum lugar acima. Talvez teria que deslocar material de apoio para ajudá-lo. Por hora tentaria poupar energia para as horas seguintes. Ficaria atento às transmissões.

Não sei quanto tempo dormi. Acordei com chiado no rádio, da base tentando comunicação..

- Atento grupo de regate 1 e 2. Situação!!! Cambio!! Atento grupo de resgate 1 e 2!!!! Rapidamente peguei o rádio e expus a situação. Informei o bloqueio que houve por conta da avalanche e da necessidade de buscar outra rota para sair. Solicitaram que aguardasse instruções. Já o Sebastian tinha informado ter encontrado o alpinista, mas que não havia condições de desloca-lo sem ajuda. O rapaz havia acordado e estava sob efeito de medicamentos no momento. Estava com prováveis fraturas nas costelas e o tornozelo esquerdo machucado. Aguardaria apoio no local. Próxima transmissão seria feito pela manhã com a base.

Com o apoio do rádio central, estabeleci contato com o Sebastian.

- Mestre!! Estou abaixo de onde você se encontra. É a mesma caverna do último verão, onde você nos trouxe em treinamento, lembra? A rota de entrada está bloqueada. Só posso buscar uma alternativa de saída pelas galerias. Posso tentar chegar até onde você se encontra, Cambio!!!

- Você está a duas horas do ponto em que estou. É uma subida íngreme e vai ter que ser feita no escuro. Preciso de materiais de imobilização e algo para comer(risos). Vou passar instruções para você nos alcançar!!

- Atento base, resgate 2 virá ao meu encontro pelas galerias. Favor acompanhar informes. Cambio e desligo.

Sebastian passou instruções de como alcançar os níveis mais altos e quais os pontos de dificuldades que poderiam ser encontrados. Acordamos contato a cada trinta minutos para avaliarmos a evolução. Apesar de não ter sido dito, sabia que algo não estava bem, ele não teria proposto que subisse ao seu encontro se não houvessem problemas sérios.

Reuni os materiais que foram solicitados e iniciei a jornada. No íntimo , algo me dizia que deveria ser rápido!! Andar no escuro não era o meu forte, mas precisava ser objetivo e não pensar nisso. Os equipamentos que estava levando, tornava o deslocamento lento. Muito provavelmente o tempo não seria de duas horas como dissera o Sebastian.

Levei um tempo para criar um padrão de deslocamento que permitisse economizar energia e ganhar velocidade por entre as galerias fracamente iluminadas pela lanterna.

Seguindo criteriosamente as orientações dadas pelo Sebastian, fiz a primeira parada em uma câmara que se bifurcava. Havia ruído de água corrente por uma delas e o ruído ecoado do vento pela outra. O problema era que as duas, aparentemente levavam para níveis mais baixo e não para o alto. Fiquei indeciso por instantes.... Pelo meu relógio já se haviam passado quarenta minutos de jornada. Era hora de entrar em contato... Tentei por alguns minutos estabelecer contato pelo rádio, sem sucesso!!!

Teria que fazer uma escolha. Revisei cuidadosamente as instruções dadas para ver se havia cometido algum erro. Não!! Fiz tudo certinho....Pelo menos segui a risca o que foi dado. Nas instruções não falava dessa bifurcação... Teria que fazer escolhas e buscar sinais mais adiante que me desse a certeza do caminho tomado...Se ao menos o rádio funcionasse...

Resolvi ir pelo túnel que ecoava o vento. Parecia ser mais lógico. Sinalizei adequadamente nas instruções e parti com atenção redobrada. Sabia que já era noite lá fora. O ruído do vento, único companheiro de viagem, hora se intensificava, hora reduzia a sussurros. Às vezes parecia me dizer: É por aqui.... É por aqui.... O fato era que já estava na trilha a uns bons trinta minutos de caminhada e não encontrava as marcas que as instruções informavam haver no caminho. Para piorar a situação nem mais a estática do rádio se ouvia...Recostei-me em uma pedra no caminho para refletir e revisar melhor o mapa. Deveria ter esquecido ou me passado em algum detalhe. Fique não sei quanto tempo olhando as informações. Sentia os olhos arderem. Sabia que o cansaço estava chegando. O silencio me incomodava. Olhei as sombras projetadas nas paredes quando lançava a luz da lanterna. Fiquei admirando as formas disformes que apareciam. Horas sombras como se fossem animais, hora como se fossem construções, desenhos.... Desenhos!!! Achei!!! Achei desenhos!!! Achei de um lado das cavernas desenhos quase que imperceptíveis!! Eram desenhos!!! O mapa falava de desenhos.... Peguei as folhas buscando as informações... Estavam lá, desenhos de uma caçada provavelmente de muitas centenas de anos atrás. Finalmente, encontrei o caminho.... Estava tão contente que não me dei conta de estar falando sozinho.... De animo renovado, segui a passos firmes pelo caminho à frente. Após a parede com as imagens, havia uma pequena abertura que dava para uma outra câmera bem mais ampla em comparação com a que estava. Agora sim, estava sentindo progresso. O vento estava mais nítido e a caminhada se tornara íngreme, direto para cima. Havia uma renovação do ar que denotava abertura próxima com o exterior...

A trilha era bastante acidentada, e em muitos trechos, estreitava a tal ponto que parecia terminar. Só quando chegava a poucos metros era que se via a continuidade dela... Estava pelo menos a umas duas horas de caminhada quando, a trilha se abriu em uma câmara ampla e bem ventilada. Havia chegado.... Ao longe via luz fraca, em um dos cantos, o que sinalizava ser os dois alpinistas. Gritei de contentamento!!! Quebrei o silencio reinante que só vento se atrevia em fazer... Fui em direção a luzinha fraca, que em dado momento começou a se mexer... Eram eles!!! Havia encontrado!!!!

_ Que alegria em ve-los!!! Disse ao me aproximar o que foi correspondido pelo amigo e pelo alpinista Pablo(soube depois o seu nome). Rapidamente, Sebastian me deixou a par da situação e das providencias que deveriam ser tomadas. Era imperativo imobilizar tanto o tornozelo do alpinista quanto as costelas. Haviam fraturas. Depois atuar no ombro do Sebastian que se encontrava lesionado limitando os movimentos. Sob orientação do mestre socorrista, fiz as imobilizações necessárias. Para o Pablo foi um tormento, pois sentia dores muito fortes!!! Enfim, após duas boas horas o trabalho estava feito! Observava o alivio estampado no rosto do alpinista... Voltei-me para o Sebastian que aguardava a vez. Fiz a imobilização do ombro conforme orientação e logo depois, extenuado, sentei-me ao lado com os olhos fechados. Tinha sido uma noite dura até ali. Dura, mas gratificante... Havia encontrado e agora era aguardar amanhecer para tomar as providencias. Percebia que a tempestade continuava com toda sua intensidade. O ruído dos ventos era ensurdecedor. Vez por outra, deslocamentos de neve se ouvia vindo de cima.

Sebastian estava também descansando após os curativos do ombro e da cabeça. Deveria ter sido duro para ele, machucado, ter cuidado do Pablo.

Ficamos em silencio. Por muito tempo, apenas ouvindo os nossos pensamentos só quebrados pelo ruído da tempestade lá fora...

- Você está com aspecto ruim, disse Sebastian em dado momento sorrindo... Sua aparência é de que você não dorme a dias!!! Mas, aqui para nós, estou feliz por estar aqui. Muito obrigado por ter vindo...

Olhei para aquele ser humano que aprendi a admirar e agradeci a gentileza de suas palavras. Sabíamos das dificuldades que enfrentaríamos, principalmente para sair com o rapaz acidentado. Tínhamos no íntimo a certeza que não teríamos ajuda externa. Não seria possível tão cedo!!! Lembrei dos chocolates que trazia na mochila e da preferencia que ele tinha pelo petisco. Passei para ele e vi com satisfação, seus olhos brilharem na tênue luz das lanternas ao perceber o que era... Olhei para o Pablo e percebi que dormia tranquilamente. Aproveitei para também tirar um cochilo... Estava satisfeito!!! Foi uma caminhada difícil e um sono tranquilo era tudo que precisava naquele momento!!! Acordei com a claridade tênue ao longe, mostrando que já era dia...Parecia não ter dormido nada!! Estava me sentindo bem... Olhei em redor e percebi o Sebastian, ao meu lado, tentando pelo rádio, estabelecer comunicação com a base. O Pablo se encontrava desperto ao lado, observando atentamente as tentativas de comunicação...

- Como se sente? Perguntei...

- Melhor!!!Graças a Deus!! Depois que foi colocado o colete, minhas costelas reclamam menos. Disse esboçando um fraco sorriso.

- Ótimo!!! Fico feliz... Dizendo isso, fui ao encontro do velho alpinista que me levou para próximo da abertura da caverna.

- Amigo!! As coisas não estão boas. A tempestade continua e parte da entrada da caverna desmoronou. Veja!!! Por aqui, não haverá condições de nos resgatarem. Teremos que descer para outro nível, buscar outra entrada. Estou tentando entrar em contato para informar a situação...

Enquanto Sebastian falava, observava o que foi a entrada da caverna. Toda parte que existia e servia de apoio para a câmara da caverna desapareceu com as avalanches que houveram. Não tínhamos como descer ou subir por ali. Restava buscar entre as galerias, outra passagem... Isso implicava ter que deslocar o Pablo, pois não estava em condições de andar ou de se sustentar direito. Seria um trajeto muito delicado e perigoso. Voltaria para a escuridão reinante das galerias. Apesar de não estar sozinho, não me sentia confortável com a ideia. No fundo, no fundo torcia para que as comunicações fossem restabelecidas e que as notícias pudessem ser boas.

Em dado momento do dia, a estática voltou a ser ouvida. Isso nos animou. Sebastian, incansável, buscava melhor posição para estabelecer comunicação.

-Atento base..... Atento base... Cambio!! Um ruído longe se fez ouvir em dado momento. - Sebastian?? Estamos ouvindo!! Informe situação!!! Repito, informe situação!!

- Estamos com o alpinista acidentado. Estou com o socorro 2 aqui comigo!! Fizemos os primeiros atendimentos, porem haverá necessidade de remoção pois o acidentado esta sem condições de deslocamento, cambio!!!

- Sebastian, recebemos ordens de sair do posto. Tempestade muito forte tem provocado muitas situações de risco. Orientação de abandonar posto. Vocês terão que pelo menos aguardar uns dois dias por aí ate as coisas serenarem, cambio!!! ......A outra possibilidade é tentar chegar até a saída sul das cavernas, antes que o nível do lago suba!! .... Ou congele de vez bloqueando as rotas pelas galerias!! Cambio!!!

Após alguns minutos de silencio, Sebastian pensativo volta a informar a base....

- Vamos tentar nos deslocar para a saída sul do complexo de cavernas. Jornada de três dias por entre as galerias, cambio!! Solicito autorização!! .... E apoio na chegada...

- Autorização concedida!!! Boa sorte!!, nos vemos lá... Economize baterias!!! Cambio e desligo!!!

Após desligar, Sebastian olhou para mim e sentenciou... Mãos a obra!!! Temos muito que fazer... e o tempo não está a nosso favor...

Sentamos próximo ao Pablo, que nos observava com curiosidade. Foi explicado a situação e colocado as possibilidades e opções para a jornada. Distribuímos as tarefas, e revisamos os equipamentos que seriam utilizados. Os demais itens seriam deixados para não atrasar a jornada. O Pablo ainda sem poder andar, seria deslocado por maca e eu faria o papel de puxa-lo pelas trilhas. Sentamos no entorno de velho mapa das galerias onde o velho e experiente socorrista marcava pontos a serem alcançados. Após vários minutos observando seu traçado, ele voltou a atenção para nós e mostrou o que tinha feito. Pediu que olhássemos com atenção e que gravássemos cada detalhe. Aquele mapa tinha que está na nossa mente o mais rápido possível. Exercitamos a memorização sempre acompanhado pelo olhar atento do nosso líder. Enfim, como um velho professor ensinando aos seus pupilos, deu-se por satisfeito e recomendou que dormíssemos. Precisávamos estar com força máxima para a jornada a ser feita.

Quando acordei, horas mais tarde, não havia mais a luz tênue do dia. O ruído do vento era ensurdecedor... O sebastian já se encontrava de pe organizando algumas coisas que não dava para ver direito. Quando me viu, esboçou um sorriso e chamou para mostrar o que estava fazendo. Era uma espécie de cinturão de corda que seria usada para puxar o Pablo durante o percurso. Pediu que experimentasse, se estava confortável. Fiz uso sem cerimonias. Estava tranquilo. Ajustei aos ombros as alças e na região da cintura.

Na sequencia ele acoplou quatro outras alças que seriam interligadas com a maca. O Pablo também já havia acordado e o que me parece estava terminando de escrever um cartaz. Me aproximei curioso e vi sua obra. Ali estavam escritos os nossos nomes e a rota que iriamos fazer. Data, hora e tudo que precisava para uma localização rápida. Seria colocada em um pedestal habilmente montado. Os pertences que seriam deixados também estavam identificados, bem como informações sobre o ponto de socorro que deixei montado na galeria abaixo. Tudo pronto!!

Algumas sacolas estavam na maca junto com o Pablo e uma outra seria usada pelo Sebastian. A mim, restava puxar a maca. O Sebastian se posicionou à frente do grupo comigo logo atrás e o Pablo fazendo o papel de iluminar à frente. Zeramos os cronômetros e começamos nossa jornada. Cada trecho, tinha um tempo de pelo menos nove horas a ser cumprido. Tínhamos pelo menos cinco trechos a vencer com intervalos de descanso cada...

Puxar o garoto não parecia complicado. O problema era nos pontos em que o terreno acidentado criava obstáculo mais acentuado. O esforço era duplicado nesses trechos. A nossa primeira parada de 30 minutos ocorreria após 4 horas de jornada. Hidratação e verificação do caminho eram necessários. Qualquer erro poderia nos levar a consumo exagerado dos nossos recursos. Luxo que não tínhamos...

Vez por outra, o Sebastian apertava o passo e se distanciava de nós ao ponto de vislumbrarmos apenas um pequeno ponto na penumbra mal iluminada. Os olhos sempre atentos do Pablo, pude perceber que a todo instante fazia consulta aos seus rabiscos, emendando ou acrescentando algum detalhe percebido durante o trajeto. Sabia que os pequenos tombos que eu dava com a maca, deixavam-no com desconforto. Mas não reclamava. Mantinha-se firme!!!

Com muito custo vencemos as primeiras quatro horas. Estava ensopado!!! O esforço de puxar me deixava com as pernas e os ombros com ardência e queimação. Minha respiração estava acelerada. Sebastian me ajudou a desacoplar a maca e me deu água para beber. Pediu que sentasse e repousasse. Depois se dirigiu ao Pablo e verificou as anotações do rapaz. Aprovou o que viu e sentou ao lado também para descansar. Ficamos assim em silencio por alguns minutos. Até o Pablo falar voltando-se para o Sebastian: - Estamos indo bem? Qual a sua análise?

- Estamos um pouco fora do prazo que traçamos, mas indo na direção certa. Essa primeira fase é importante porque temos um lago à frente para transpor. Não sei em que condições... E, voltando-se para mim, perguntou: - E aí velho amigo? Acha que dá conta?

Sorri para ele assentindo com a cabeça. – É moleza!!! Disse aquilo sem muito acreditar nas palavras. Ele me olhou com um sorriso!!!

Vencido o tempo do repouso nos pusemos a andar. Teríamos mais quatro horas de jornada ate alcançar o primeiro ponto marcado às margens de um lago subterrâneo.

O Pablo, sacou de uma gaita e começou a ensaiar musicas do seu repertório. De certa forma trouxe um pouco de alegria ao grupo... Depois de algum tempo de caminhada, novamente voltei a sentir as pernas. As panturrilhas estavam ardendo pelo esforço empreendido. Olhei distraidamente para o relógio e vi que já haviam se passado sete horas do ponto que iniciamos. Faltavam mais duas horas para o novo repouso. Não ouvia mais o ruído dos ventos, não me recordo em que momento deixei de ouvir. só um leve som de água corrente ao longe e claro, a gaita do Pablo. No inicio era reconfortante o som, mas agora, a vontade era de fazê-lo engolir goela abaixo aquele instrumento. Do repertorio que ele disse saber tocar, não saiu de uma canção a se repetir continuamente. Isso dava nos nervos...

Em dado momento, o Sebastian pediu que parássemos. Estava a buscar algo. Uma passagem, um sinal especifico. Ficamos aguardando seu comando. Essa parada foi providencial. Estava já a beira de ter um ataque de câimbras!!! Sentei rapidamente e comecei a efetuar alongamentos. Voltei a olhar para onde o Sebastian se encontrava. Observando-o ao longe via seus movimentos alternados entre procurar algo e olhar para os mapas que levava nas mãos. Definitivamente havia algo de errado!!! Fui ao seu encontro e perguntei. – O que se passa? Procurando algum sinal? Quer ajuda?

- Ele voltou-se e disse: Deveríamos ter topado com um paredão. Na sua base, deveria existir uma abertura pouco mais de cinquenta centímetros que iria nos levar para o outro lado. Pois, pelo tempo, já devíamos ter encontrado. Definitivamente algo estava errado!! Muito provavelmente pegamos algum caminho equivocado... Agora, em que momento isso se deu? Não tenho ideia....

Pablo ouvia calado e pensativo a explicação do velho socorrista...Sabia que não cabia falhas nesse tipo de aventura. O preço que se pagava normalmente era muito alto.

Mas, acreditava que não estavam de todo fora da rota. Ele mesmo, em muitos trechos, enxergou os sinais que haviam no mapa estudado.

Transcorreu um momento de silencio. Todos meditavam em busca de alternativas ou revendo imagens que poderiam ter passado despercebido no trecho empreendido. Por mais que olhássemos o mapa, não enxergávamos onde poderíamos ter feito o desvio.

Pablo por sua vez, divagava alto seus pensamentos.... Olha gente, passamos por varias seções onde haviam marcas. Agente pode retroceder em busca do ultimo sinal e refazer o caminho... Ou

Continuar para frente em busca do tal lago...

Sebastian voltou-se para ele e disse: - É isso que faremos... Vamos seguir o ruído da água corrente. Ele deve nos levar ao lago. Sabemos que estamos próximos. Vamos localiza-lo. Os senhores fiquem de ouvidos e olhos abertos.

Assim, de animo renovado, começamos a nos mexer seguido pelo som de água corrente. O ruim, era que, durante a nossa caminhada, o som aumentava e em outros momentos, parecia diminuir. Isso trazia certo desconforto e insegurança.

Andamos seguramente um bom par de horas, ate finalmente encontrarmos a fonte do ruído. Havia uma grande câmara à nossa frente, onde deixava à mostra um grade espelho de água alimentado por uma serie de pequenas quedas de água. Havíamos encontrado o lago!!!!

Sentamos enfim emocionados pelo comprimento do primeiro trecho do percurso. Estávamos exaustos pela tarefa realizada. De minha parte, só queria deitar e dormir.

Antes de apagar de vez, vi o Sebastian orientar o Pablo para que ele ficasse com o primeiro turno de vigília. Apesar dos machucados, o rapaz mantinha lucidez pois não teve que deslocar os pesos que nós fizemos durante aquelas horas. Era justo que ficasse de guarda.

Foi um sono rápido porem revigorante. Quando acordei, os dois membros da equipe estavam conversando e olhando um mapa à luz de lanternas. Nitidamente, se preparavam para a segunda etapa.

Me aproximei e fui recebido com algo para beber. Uma mistura que o Sebastian fazia com ervas e energéticos. Dizia que era receita de parentes antigos, que viveram nas montanhas. Não sei se era verdade, mas, mantinha agente aceso por um bom tempo apesar do gosto horrível (não disse a ele claro).

Após os informes de alinhamento, iniciamos nossa descida para transpor o lago. Precisávamos chegar em um ponto especifico na outra margem. Haviam balsas construídas para passeio turístico que serviriam de transporte. O desafio era encontra-las naquele breu intenso principalmente porque estávamos em um lado do lago que não conhecíamos bem. As pedras estavam escorregadias e constantemente me faziam perder o equilíbrio. Puxar o Pablo era ainda mais penoso...

Como de costume o Sebastian ia na frente explorando o caminho e sinalizando por onde passar. Mesmo assim as coisas não estavam fáceis.O terreno escorregadio e molhado não dava boa segurança para andar quanto mais arrastar uma pessoa deitada em maca. O esforço era muito alto. Em dado momento, parei e fiquei simplesmente, acompanhando a pequena luz que saia das lanternas que o Sebastian usava. Era melhor deixar ele buscar identificar onde se encontravam os barcos e ai sim me deslocaria...

A busca não levou muito tempo. Acredito uns bons 40 minutos. Segundo a informação, o nível do lago estava alto e por isso não achávamos os sinais feitos no pequeno atracadouro que estava submerso. Sem falar que algumas partes do lago já sinalizava congelamento. Pequeninas placas de gelo se formavam. Tínhamos que ser rápidos ou não passaríamos para a outra câmara.

De animo renovado pelo descanso e pelas notícias, passei a puxar minha carga com mais vigor. Isso causava de tempos em tempos, protesto do Pablo.

Em fim chegamos onde os botes se encontravam. O Sebastian já havia recolhido para a proximidade da margem e começava a adequar para que colocássemos não só o nosso acidentado como as coisas que levávamos. Levamos um bom tempo nessa tarefa. À frente dos barcos ia o nosso guia a nos orientar e eventualmente quebrar pequenas placas de gelo pelo caminho. Ao centro e dividindo as duas canoas ia a maca com o Pablo. No equilíbrio, distribuídas no piso, as mochilas. Eu . no fim, remando. Nosso deslocamento era lento e exigia grande esforço. Nossa jornada levaria em condições normais pelo menos uns 20 minutos ate chegar ao paredão que separava as duas câmaras. O Sebastian tinha urgência em chegar lá. O nível estava muito alto e poderia já ter encoberto a passagem. Todo tempo era precioso.

Apos uma hora , começamos a visualizar o paredão à nossa frente.A abertura estava cada vez menor. Em tempo normal, no verão , ela chega a ter pelo menos três metros de altura e uns bons cinco metros de largura contados a partir do espelho d’água. Pela nossa visão, não passava talvez de um metro de largura por alguns centímetros de altura. Esperava que fosse suficiente para ultrapassa-la. Chegamos, mas tínhamos que ajustar o arranjo das canoas. Não dava para passar do jeito que estavam. As duas juntas, paralela como montamos, não passava. Tínhamos que nos afastar pois criava-se pequena corredeira pela passagem o que desestabilizava os barcos.

Enquanto o Sebastian controlava com o uso dos remos, as embarcações, procurei ajudar o Pablo a se deslocar da maca para um dos barcos. Nessa manobra, quase que perdemos a maca. Ela simplesmente caiu entre as embarcações. Se não fosse a corda que a prendia, teríamos perdido. Na sequência, começamos a organizar as mochilas. Tinhamos que ser rápidos, a fenda se aproximava e estávamos sendo vencidos pela correnteza que se formara. Corríamos o rico de naufrágio. Após acomodar as mochilas em uma das embarcações e o Pablo na outra, tínhamos que desatar as cordas que as unia. O Sebastian ficaria com uma e eu com a outra. Não havia mais tempo. Tínhamos que cortas as cordas. Ao sinal do Sebastian fizemos juntos, cada um em uma das extremidades que nos encontrávamos.

Após a separação, os barcos ganharam em velocidade em direção a pequena fenda que a cada instante se fechava. Era uma corrida contra o tempo. Na frente o Sebastian com o Pablo deitado como podia. Devia estar sentindo fortes dores pela posição que ficou. Mas não tinha jeito. Logo atrás estava eu, com as mochilas tentando manter estável. O Sebastian remava a toda velocidade em direção ao pequeno ponto. À medida que nos aproximávamos, o distúrbio aumentava e eu ficava em duvida se iriamos conseguir ou não. Estávamos a uma boa velocidade e aumentando. Seriamos literalmente jogados de encontro com a passagem. A adrenalina aumentava e a única coisa que via era o pequeno buraco onde devíamos passar. A canoa a minha frente, de repente, ganhou força e foi lançada por aquele estreito sem do nem piedade. Por breves momentos não vi os meus companheiros. A abertura se aproximava, o teto baixo. Fui lançado pela pequena abertura e aí, algo ocorreu!! Uma forte pancada na cabeça. Ficou tudo escuro. Apaguei...

Sebastian ao passar pela fenda, rapidamente, posicionou o barco e aguardou a minha passagem. Foi a minha salvação. Durante a passagem bati com a cabeça em alguma parte do paredão e desmaiei. O barco tinha passado, mas estava com o corpo parcialmente para fora. Se não fosse a agilidade do velho alpinista, não teria sobrevivido. Ele ao perceber a situação, se aproximou da embarcação e rapidamente me recolocou no bote. Havia um grande corte na testa. Com muito esforço, e com a ajuda do Pablo, trouxe as embarcações para a margem do lago. Fui medicado e continuei inconsciente por um bom tempo.

Acordei com forte dor na cabeça. Mas estava vivo. O Pablo não tirava os olhos de mim. Aguardava que me mexesse. Foi ele que me contou o que tinha ocorrido.

- Essa etapa foi difícil. Disse ele. Perdemos uma das mochilas que continham suprimento durante a travessia da passagem, mas graças a Deus, todos bem!!!

- Cadê o Sebastian? Perguntei ainda com fortes dores na cabeça. Percebi uma grande atadura envolvendo-a.

- Não se mexa muito!! Você perdeu muito sangue!!! Ele foi verificar mais adiante a trilha que iremos pegar. Por hora a recomendação é descansar. Dizendo isso, me passou uma xícara com um chá para tomar.

Não estava com vontade, mas, não reclamei. Peguei e tomei o liquido amargo que se encontrava ali. Voltei a dormir...Não sei por quanto tempo....

- Amigo!! Hora de acordar!!! Vamos!!

Abri os olhos e percebi o rosto sorridente do meu velho amigo.

- É bom vê você!!! Sempre lhe dando trabalho... Falei em meio a um sorriso...

- Amigos são para essas horas!! Como se sente? Temos uma jornada grande pela frente. A sorte é que estaremos descendo e o terreno é mais firme e regular.

Coloquei a mão em seu braço e agradeci pela ajuda que tinha recebido. Sei que deve ter sido um esforço enorme desprendido. Com aquele ombro lesionado, não deve ter sido nada fácil o que fez.

Sorrindo, ele ajudou a me levantar. Vi que algumas coisas foram dimensionadas. Levaríamos somente o que fosse essencial. Algumas coisas ficariam por lá.

O Pablo estava de posse de muletas improvisadas com os remos das canoas e alguns acessórios pego nas mochilas. Não havia mais necessidade de transporta-lo o tempo todo. Estaríamos alternando entre o deslocamento pelas muletas e a maca improvisada.

Nesse momento, a maca estava preenchida com os itens que levaríamos. Estaríamos mais lentos em função das nossas condições físicas. Estávamos na nossa terceira etapa do percurso. O Tempo, não importava muito. Seguiríamos o plano traçado na integra. Assim demos por iniciado nossa jornada, dessa vez, os três, lado a lado. Ao centro, o Pablo e nas extremas eu e o Sebastian arrastando as nossas coisas com a maca.

Me sentia bem, apesar da dor de cabeça... Me veio lembranças da vila. Dos amigos e canções que entoávamos durante os encontros. Senti vontade de cantar... e, sem constrangimentos ensaiei uma melodia local. Para minha surpresa, fui acompanhado pelos demais. O clima ficou melhor e mais agradável. Seguimos, vivos, adiante...

Nossa primeira parada foi depois de umas três horas de caminhada. Estávamos diante de uma bifurcação. Havia ali uma decisão a ser tomada. Fizemos uma rápida refeição e descanso e analisamos os registros contidos nos mapas. Não estava claro os sinais dos mapas com o relevo encontrado. O grande problema era que um dos caminhos descia de forma abrupta e íngreme e o outro, tinha leve inclinação para o alto. As referencias não batiam em nada com os registros contidos no mapa... Trocamos algumas ideias e ficou decidido que o Pablo ficaria de repouso por ali, enquanto que o Sebastian iria pela trilha que subia enquanto que eu me deslocaria pela outra. O Acerto era de localizar uns sinais constantes no mapa e que não tínhamos identificado ainda. Teríamos como tolerância, duas horas para retornar e decidir qual situação seria assumida. Empreendemos a nova jornada. Cada um na sua trilha.

Comecei com muito cuidado, tentando encontrar algum sinal condizente com os do mapa. Não era tarefa fácil uma vez que o campo de visão era limitado pela luz das lanternas. E diga -se de passagem, estávamos ficando sem baterias...

A descida era íngreme, mas não oferecia dificuldades, quase que não haviam obstáculos.

Caminhei por uns bons trinta minutos. Não havia encontrado nada digno de nota, a não ser o ruído do vento que passei a ouvir com maior intensidade. Era o único referencial que tinha e o qual buscava seguir como referência. O teto da caverna onde me encontrava tinha uma serie de estalactite de cores variadas. Formavam uma visão encantadora. Às vezes pareciam grandes catedrais esculpidas pelo tempo. Por certo seria uma atração a mais para os turistas que se aventurassem por ali.

O ruído do vento continuava a aumentar. Não havia nenhuma claridade que pudesse sugerir a proximidade de uma saída. Apenas o vento. Já começa a sentir a corrente de ar circulante no ambiente. O fato do ruído estar chegando ate ali não indicava proximidade da saída. Às vezes dutos canalizavam essas correntes de ar e o efeito era percebido a distancias consideráveis. Mesmo assim era o único parâmetro que tinha para seguir...

Acredito eu já terem se passados uns bons oitenta minutos. Já deveria ter voltado. Mas o som estava tão forte, que merecia extrapolar o tempo para investigar melhor...E isso quase foi o meu fim. De repente cai, não tinha chão...Faltou o chão. Um abismo se apresentou diante de mim. Não havia percebido. O vento vinha de baixo para cima. Se não fosse uma das alças da mochila ter enganchado em uma saliência da rocha, teria caído. Fiquei uns minutos paradinho, me recuperando do susto. Estava pendurado. Não podia me mexer muito pois não sabia como estava preso à rocha acima. Iluminei em baixo de mim e não via nada. Era um grande buraco negro. Sem fim...Depois de refeito do susto, passei a verificar como alcançar a borda da rocha. Devagar e com muito cuidado, comecei a desenrolar uma corda que tinha, para ver se laçava algo solido acima para servir de apoio. Tinha que ser de forma lenta e precisa. Não podia desestabilizar o ponto de apoio em que me encontrava. Algumas tentativas infrutíferas foram feitas, ate que uma delas a corda lançada se prendeu a algo. Lentamente fui tencionando para ver se conseguiria resistir ao peso. Passei a distribuir melhor o peso entre a alça da sacola e a corda lançada. Com calma fui me movimentando ate fica na posição que me permitisse subir. Aos poucos fui ganhando altura ate poder, com a mão alcançar a borda da rocha.Essa parte era ainda mais delicada. Não havia sustentação para os pés, a não ser o que a corda oferecia. A cabeça havia voltado a latejar. Grande momento para ela me incomodar!!!

Enfim, consegui voltar para a parte de cima. Estava exausto pelo esforço, mas aliviado por ter conseguido. Fiquei alguns minutos recuperando o folego. Tinha que retornar... Por ali definitivamente não era um bom caminho...

Fiz umas sinalizações de alerta, para o caso de algum outro desavisado enveredar por lá.

Olhei mais uma vez para o abismo a minha frente, dei meia volta e retornei o mais rápido que pude. Por certo o Sebastian já havia voltado e estava esperando....

O retorno não demorou muito. Quando entrei na câmara onde deixamos o Pablo, o mesmo estava sentado, escrevendo alguma coisa... Me aproximei e sentei ao seu lado...

- Onde se encontra o Sebastian? Não voltou?

- Ainda não!!! Você foi o primeiro... E ai? Achou algo?

Com calma contei o que havia ocorrido. O Pablo ouvia atentamente e buscava rabiscar em uns papeis as informações que eram dados do lugar. No mapa, também ele acrescentou alguns detalhes que foram ditos, ampliando assim o leque de informações sobre o lugar visitado.

- Você acha que deveríamos esperar mais pelo Sebastian? Será que ele não esta em dificuldades? Disse o Pablo preocupado.

- Vamos nos organizar. Vou lá olhar e lhe dou retorno!!!

- Negativo. Vamos juntos!!! Não quero ficar nem mais um minuto aqui sozinho!!! Além disso, pelo que você disse, só temos agora essa alternativa.

Fui obrigado a concordar com ele. Só tínhamos aquela alternativa. Decidimos então levantar acampamento e segui a trilha do Sebastian. Antes, fizemos umas marcações e informamos por onde iriamos.

Coloque as coisas na maca e para agilizar a caminhada, resolvi puxar o Pablo com o material. Era mais prático já que ele não estava em condições de andar sozinho e as costelas dele doíam.

Organizamos tudo e saímos em direção a trilha que o Sebastian tomou. No íntimo, torcia que ele estivesse bem. Só descansando....

Enquanto eu puxava e prestava atenção a trilha, o Pablo buscava identificar os sinais registrados no mapa e fazia também outras marcas para melhor sinaliza-la.

Tempos em tempos, chamava pelo velho amigo na esperança dele ouvir e responder...

Já aviamos avançado por mais de uma hora e nada de sinais ou do Sebastian. Foi ai que o Pablo alertou...

- Ouça!!! Tem um barulho vindo da nossa direita. Parece alguém batendo de encontro a uma rocha!!!

Parei para escutar. Não havia ruído algum. Fiquei quase que sem respirar na tentativa de não encobrir o ruído informado. Nada!!! Sem ruído.... Olhei atentamente para o jovem na esperança que houvesse novamente registrado o tal ruído. Ele também não ouviu... Íamos iniciar a jornada quando o ruído veio, forte. Decididamente, alguém estava sinalizando. Peguei umas ferramentas e reproduzir os sons o que prontamente foi respondido. Não havia dúvidas!!! Era alguém se comunicando... Comecei com calma a deslocar em direção ao som...

Não demorou muito para encontrarmos a fonte dos ruídos. Lá estava ele, o Sebastian, deitado, ao canto da passagem. Nos aproximamos com cautela.

- Como rezei para ve-los!!!

-O que houve? Perguntamos quase que simultâneo.

-Escorreguei ao subir na estrutura ao lado. Mostrou com a mão o local. E cai. Umas pedras se deslocaram durante a queda e uma delas ficou sobre a minha perna. Preciso de ajuda para remove-la...

Fizemos a avaliação da situação e rapidamente, conseguimos retirar a pedra que imobilizava a perna do velho socorrista. O joelho estava lesionado, mas não tão grave. Impediria apenas alguns movimentos. Fizemos os curativos e imobilizamos a região afetada.

Mesmo com o novo problema apresentado, estávamos felizes pelo encontro. Rapidamente contamos o que ocorreu do outro lado, deixando o amigo informado do que ocorreu. Terminado os relatos, aguardamos ansiosos que ele relatasse sua aventura...

- O caminho é este aqui!!! Encontrei os sinais de que o mapa falava. Estamos na rota certa. Vamos descansar e mais tarde seguir caminho... e virando para o Pablo...Tem algo para comer por ai? Estou com uma fome danada.... esse passeio está abrindo o apetite... Disse bem-humorado.

Algumas horas mais tarde estávamos de volta no caminho. Eu, puxando o Pablo que tinha cedido as muletas para o Sebastian. Estávamos devagar por questões obvias. Iniciamos assim, a quarta etapa da aventura.

Sebastian havia nos informado que no posto o qual nos dirigíamos, haviam alguns materiais de apoio. Desde primeiros socorros, alimentos desidratados, cordas novas e até baterias sobressalentes. Portanto, não teríamos problemas de ressuprimento. Isso nos tranquilizou por conta da escassez que se fazia dos nossos recursos. Estávamos quase sem alimentos, as baterias estavam se acabando e medicamentos nenhum. Do ponto de apoio já conseguiríamos ter sinal de rádio para comunicação.

O Caminho até o ponto de apoio foi suave. Era mais conhecido dos guias mais experientes. Levamos quase seis horas para alcança-lo.

Pela primeira vez, pude deitar em uma cama. No acampamento de apoio, havia infraestrutura com dormitório, cozinha, laboratório de pesquisa e enfermaria. Tudo que fosse necessário para atender aos aventureiros e pesquisadores que se lançavam por entre o labirinto das cavernas. Um verdadeiro oásis. Havia um pequeno gerador que fornecia iluminação aos ambientes...

Sebastian foi para a sala de radio estabelecer contato com o mundo exterior...

- Base, aqui é o Sebastian... Cambio!!! Base.... Cambio..... alguns minutos se passaram...

- Sebastian... aqui é a base... Bom ouvir você... Já não era sem tempo...Como estão as coisas por aí? O que houve?....

Em breves palavras foi relatado os eventos que ocorreram e a situação atual de todos...

- Sebastian... Aguarde contato que vou acordar o pessoal.... Aqui são três horas da manhã. Só eu estou de plantão... Vou acordar os demais... Volto a ligar daqui a três horas... Aconselho a dormirem...

Sebastian desligou o rádio, mas com o sentimento de aflição... Sabia que haviam problemas... O operador não disse, mas nas entrelinhas deixou claro que haviam decisões e comunicados a serem feitos e que ele não estava autorizado...

Lentamente se deslocou para a cozinha. De lá saia um cheirinho muito agradável. Algo quente estava saindo...

Sentado diante de uma vasilha com sopa e chocolate quente estava o Pablo comendo avidamente... Ao me vê, esboçou um sorriso e convidou a sentar... Estávamos os três ali...

Sentei e pensava se seria prudente ou não compartilhar as preocupações que assolavam a mente...

Me servi também da sopa e após alguns momentos relatei o que ouvira da base...

- Acho que eles estão com alguns problemas para nos resgatarem... Nada foi dito... O operador pediu para aguardar umas três horas... Acredito eu, que alguém foi incumbido de nos da a noticia..

Agora não há nada a fazer... Exceto, descansar e aguardar retorno das comunicações... Sugiro, após a refeição agente dormir um pouco... Opinião sensata que prontamente acatei... Depois daquela refeição, iria dormir um pouco... Estava precisando.....

Acordei com o Pablo me chamando...

- Vamos muchacho!! O pessoal está no rádio...

Na sala de rádio haviam três cadeiras convenientemente colocadas. Sentei em uma delas...

- Base cambio!!!! Sebastian Falando!!

--Sebastian, velho amigo!!.... Bom ouvir sua voz!!.... Poderia reportar a situação de momento?

- Mestre Manoel, é bom ouvir sua voz também. Está melhor? Espero que sim... A situação é a seguinte...... Sebastian Relatou todos os eventos ocorridos até o momento com detalhes. Algumas partes foram ditas por mim e outras pelo Pablo....Após o relato, ficamos no aguardo da transmissão que não demorou muito a ocorrer....

- Velho amigo!!! ... A situação é a seguinte.... Houve uma grande avalanche que bloqueou a entrada sul. Não há como chegar por ela.... Até tentamos, mas está inviável.... Se insistirmos corremos o risco de perda de vidas...

A tempestade não se afastou... A previsão meteorológica é de mais quatro dias de tempo ruim....

Depois desses dias levaríamos outros tantos para tentar desobstruir a entrada da caverna lado sul. As demais estão inviáveis.....

Não sei como estão os suprimentos por ai... Acho que vocês tem para uma semana.

O prognostico mais otimista são de duas semanas, se não houver outras tempestades, para desobstruir a entrada sul....

Estamos com alguns especialistas buscando opções.... O rádio ficou mudo por instantes.....Eles estavam conversando por lá.... Dava para perceber...

Sebastian que ouvia tudo pensativo.... Demostrava grande preocupação!!! Velho conhecedor da região, sabia que quanto mais tempo ficasse por ali, menos chance de sair teria... A situação exigia medidas drásticas..... Teriam que correr riscos.... Apostar suas próprias vidas nas opções que apareciam... Nada fácil...

Deixou de lado o radio e fixou nos mapas a sua frente.... Ainda bem que o abrigo montado tinha documentações atualizadas das ultimas expedições de exploração das cavernas... Buscava enxergar algum dado novo ainda não divulgado... Nos sentamos ao seu lado, também com o propósito de verificar...

Após vários minutos de idas e vindas nas anotações, algumas opções foram levantadas....Começamos a discutir a viabilidade de cada uma delas.... Os riscos e as possibilidades...

Em dado momento fomo chamados à realidade pelo radio..

- Atento Sebastian!!! Cambio!!!

- Pronto Manoel!!! Pode falar.... Estamos na escuta!!!

- Estive conversando com algumas pessoas que fazem a exploração dessa parte das cavernas e estão me apontando para algumas possibilidades.... Talvez seja interessante vocês analisarem também...

- Estamos atentos e ouvindo... Pode falar!!!

Após longa explanação das opções apontadas pelos especialistas e da troca de observações de ambas as partes, ficou clara a necessidade do grupo se deslocarem para as áreas ainda em processo de estudos. Essas áreas indicavam a possibilidade de haver saídas ainda não descobertas para o vale. Seria na verdade uma grande aventura pois a maioria das câmaras ainda não tinham sido mapeadas. Os riscos não tinham sido levantados.... Mesmo assim as opções pareciam ser melhores... Os debates se prolongaram por varias horas, entre sugestões e argumentações... Enfim, a decisão fora tomada.... Optariam por entrar em uma das trilhas novas recém mapeadas... Estabeleceram um tempo para um possível retorno para a base caso fracassassem... Ficou acertado que o grupo de socorrista externo, estariam nos trabalhos de desobstrução da entrada sul enquanto eles teriam cinco dias de exploração nas trilhas novas. Se não obtivessem sucesso, retornariam para a base e aguardariam o socorro....

Restava agora decidir entre eles se seria viável todos irem ou apenas uma parte...Passamos um bom tempo pensativos... Um olhando para outro sem coragem de se expressar... Passamos muitas coisas juntos... Estávamos ali, graças aos esforços coletivos que empreendemos.... Como agora nos dividir?

O silencio foi quebrado pelo Pablo...

- Olha gente!!! Sei que vocês estão aqui por minha causa... Além do mais nas condições que me encontro não sou muito útil ao grupo... O que vocês decidirem eu acatarei!!

- Olha deixa de besteira... Chegamos aqui juntos e vamos sair juntos!!! Não ficará ninguém...Ou vai todos ou não vai ninguém!!! Somos agora uma equipe!!! Disse isso com uma energia tão forte que tanto o Pablo quanto o Sebastian me olharam de forma espantada. Não era o meu perfil aquele tipo de reação...Mas foi bom. Me sentia leve em poder externar aqueles sentimentos.... Nas poucas horas em que estivemos juntos, aprendi a respeita-los e considerava-os como minha família... Não iria partir sem eles...

Sebastian abriu largo sorriso e concordou com a cabeça...

- Sem chances de nos separarmos!!!... Como você disse!... Viemos ate aqui juntos e vamos sair ou não juntos!!

- Atento Miguel!!! Sebastian falando!!!

- Na escuta velho amigo....

- Iremos explorar a trilha nova... Nos de cinco dias de credito para o retorno... Fiquem atentos para qualquer sinal na região!!!! Partiremos amanhã bem cedo!!!Grato, amigos!!!

- Estaremos atentos amigo!!! Boa sorte!!!Cambio e desligo!

Estávamos felizes... Não sabíamos como seria a jornada, mas o fato de estarmos juntos, nos dava novo ânimo...

Fomos buscar as coisas que poderiam ser uteis durante a exploração... Depois restava descansar ao máximo e por o pé na estrada....

No dia seguinte, bem cedinho, já estávamos a caminho. O Sebastian ainda mancando por conta do joelho, o Pablo também andando que nem saci-pererê(lenda brasileira que conta a história de um negrinho de uma perna só, que vivia aprontando travessuras ,tendo um gorro vermelho e um cachimbo sempre à mão. Protegia a fauna dos malfeitores) e eu ainda me recuperando dos machucados na cabeça.

Estávamos ainda pela trilha conhecida. O Sebastian ia à frente, buscando identificar os sinais constantes nas macas e preencher com alguma observação a mais. Eu, acompanhando o Pablo, buscava também identificar pontos que pudessem servir de marcadores. Já estávamos pelo menos a umas quatro horas de jornada. A nossa meta era de explorar por uns quatro dias e caso não encontrasse possíveis saídas, retornar à base. No íntimo, todos ali torciam para achar algo que nos levasse ao exterior das cavernas. Tínhamos suprimentos para o período e água não era difícil de conseguir por causa dos minadouros que surgiam a todo instante.

Nosso primeiro desafio foi a transposição de um pequeno riacho que dividia o caminho. Não era nada difícil. Tinha uns cinquenta centímetros de largura. O problema era que no entorno haviam pedras meio que soltas formando uma espécie de cinturão, tornando o trecho muito ariscado a quedas. Analisamos a melhor forma de transpor.... Utilizamos nossos equipamentos e improvisamos pequena ponte. Gastaríamos mais tempo na travessia, mas estaríamos seguros.

Após transpor o riacho, iniciamos uma etapa desconhecida. Não havia mais indicação no mapa. Caberia de todos nós um cuidado redobrado e constantes paradas para marcações e sinalizações. Estávamos preparados para isso. Após mais quatro horas de exploração, decidimos fazer a nossa primeira grande parada. Ali, faríamos uma revisão do que já havíamos encontrado, nos alimentaríamos e descansaríamos para o momento seguinte. Até o momento, nada digno de nota e nem surpresas que abatessem nosso animo. Estávamos tranquilos até então.

Após revisar todas as anotações, efetuar as correções e registrar num novo mapa em construção, fizemos uma rápida refeição e fomos dormir para o momento seguinte da nossa jornada...Dormi assim que me acomodei... Estava cansado e não tina dado conta disso...

Acordei ouvindo um som longe, como se fosse o vento batendo nas rochas... Percebi que os demais também estavam acordados.... Apontei a lanterna para onde o Sebastian se encontrava...

- É velhinho, estou ouvindo também... Deve ser o vento em algum canal interno. Pode ser boa noticia ou não.... Mas esse sinal vale a pena agente seguir.... O que vocês acham?

Concordei quase que imediatamente... O Pablo também teve a mesma reação... Estava na hora de seguir viagem.... Verificamos os equipamentos comemos e colocamos o pe na estrada.

Não demorou muito e encontramos uma bifurcação... Teríamos que decidir. Estava ainda muito fresco na memoria a ultima situação em que nos separamos... Não estava disposto a correr o mesmo risco... Fizemos as devidas marcações e optamos por uma das entradas... A sorte estava lançada...

A câmara em que estávamos era estreita e afunilava ao longo do trecho o que obrigava em vários momentos, a nos abaixar ou a nos postarmos em fila indiana... Um verdadeiro

tormento principalmente para o Pablo que se ressentia das lesões sofridas ate então... Permanecemos assim por várias horas até alcançarmos área mais ampla. Havia agora uma subida bastante íngreme. Nesse ponto, paramos para descansar e analisar melhor a situação. Revemos as anotações feitas ate então, efetuamos as sinalizações necessárias e sentamos para discutir melhor forma de subida. Não havia outra opção. Era voltar ou subir e ver o que tinha à frente..

Do ponto onde estávamos, não dava para precisar a extensão da ladeira. Teríamos que subir. Ate onde a luz da lanterna alcançava, deixava claro que era bem longa...

Fiz a escolha de ir na frente explorando a subida. Seria o guia dessa vez... Os demais iriam aguardar um pouco as impressões que pudessem ser coletadas pelo caminho... Comecei a empreitada. No início bastante tranquila, mas, ao longo da trilha, trechos mais íngremes, exigiam de mim esforço que só eram vencidos com o uso das mãos ou algum bastão de sustentação. Parava constantemente para recuperar a respiração... Olha para baixo e vislumbrava apenas um ponto luminoso, que sabia ser dos outros dois. Olhava para cima e não via o fim da subida. Continuei a subir ate encontrar pequena base plana. Ali era o melhor ponto para descansar... Voltei a olhar para baixo e com a lanterna sinalizei para os demais, começarem a subir... Como resposta, vi que receberam a mensagem e estavam se deslocando ladeira a cima. Fiquei imaginando a situação dos dois. Deixei às coisas amarrei uma corda em uma das saliências de pedra que encontrei e retornei para ajuda-los...

Por fim, com muito esforço, conseguimos alcançar a base plana... Estávamos todos exauridos pelos esforços desprendidos. O Pablo demonstrava no semblante que estava sentindo dores... O Sebastian, não parava de colocar a mão no joelho machucado... Levamos deitados, vários minutos nos recuperando....

Após descanso, fui auxiliar nas tarefas que precisávamos desenvolver. Iriamos ficar um por ali. Ajudei o Pablo, verifiquei suas costelas e a situação do tornozelo. Procurei melhorar a imobilização e apliquei uma das medicações que trouxemos para aliviar as dores. A mesma coisa com o Sebastian.

Improvisamos ali nosso acampamento. Após ligeira refeição, verificamos as anotações e os pontos de sinalização indicados durante o percurso... Fim da tarefa, nos recolhemos para dormir.

Mais uma vez o Sebastian me acordou... Já haviam se passado pelo menos umas seis horas... Sorri timidamente para ele.. Sabia que não podia ter me dado o luxo de dormir tanto..

Após a arrumação, refizemos as mochilas, ficando os equipamentos mais pesados sob a minha guarda. Sabíamos que teria que ser assim. Os demais não estavam em condições de ter essa carga extra por motivos óbvios...

Voltamos a subir. Fui na frente verificando a subida. Os demais ficaram observando e aguardando minha sinalização. A subida era ainda íngreme e precisava que utilizasse na maioria das vezes as mãos como apoio. Após alguns minutos de subida verifiquei pequena base plana e fixei parada. Voltei com a lanterna sinalizando para os demais. Quase que não via o feixe de luz da lanterna do Sebastian. Mais uma vez, retirei o equipamento, fixei a corda e desci para auxilia-los. Nos encontramos no meio do caminho. Peguei a mochila do Sebastian e amarrei na extremidade da corda. Subimos todos utilizando-a como apoio. Chegamos na base e repetimos a operação pelo menos umas quatro vezes ate que o chão se tornou plano. Seguramente foram umas duas horas de subida. Merecíamos descanso. Novamente fizemos os registros no mapa dos pontos de observação e ficamos sentados descansando.

- Rapaz!! Essa subida não é para todo mundo não!!! Estou exausto!! E com uma fome danada!

- É Pablo, estou com você... Precisamos comer algo mais calórico. Essa subida me deu apetite... Olhei para o Sebastian que concordou plenamente, saiu do repouso e me ajudou a preparar algo mais substancial para o momento... Seria uma sopa. Estava decidido...

-Ouçam!!! Falou o Sebastian, pedindo silencio. Barulho de vento!!! Parece que tem uma corrente de ar gelado vindo da nossa direita... Percebam!!! Agora que estamos parados, sinto uma corrente de ar mais gelada...

Parei o que estava fazendo e procurei sentir o que ele havia dito... Era verdade, estava sentido uma brisa suave passando por nós. Deixava uma sensação agradável no rosto...

Isso nos animou e de certa forma revigorou a nossa disposição de continuar... Terminei a sopa e comemos avidamente. Estávamos felizes com a nova situação.... Fizemos a nossa refeição em animada conversa.

Organizamos as coisas e partimos para a nova etapa que se apresentava. O vento e a brisa suave que se apresentava nos indicava grandes possibilidades à frente.

Dessa vez o Sebastian tomou a dianteira enquanto eu acompanhava o Pablo.

Mantive a maioria dos equipamentos comigo...Conversávamos sobre qualquer coisa. O que vinha na mente... Vez por outra parávamos para tomar nota de algum sinal importante no trajeto e beber água. Os trechos alternavam entre trilhas estreitas e suaves subidas... Continuávamos sempre buscando como referência o ruído do vento... Já estávamos, acredito, com pelo menos cinco horas de jornada quando o Sebastian fez a parada.

- Vamos acampar aqui!!! Descansaremos por algumas horas!!!

Já não era sem tempo, pensei. Estava cansado e o peso dos equipamentos incomodavam os ombros. Não muito diferente estava o Pablo. Ele esboçou fraco sorriso e foi se sentar próximo de uma grande pedra. Nos acomodamos todos, um próximo do outro, e fizemos as verificações dos sinais encontrados pelo percurso. Após as anotações o Sebastian pediu a nossa atenção.

- Pessoal temos mais um dia de jornada antes de decidirmos a volta. Espero que estejamos próximos de alguma saída não mapeada ainda. O Que vocês acham?

O Pablo foi o primeiro a emitir opinião.

- Estou acreditando que o rumo que tomamos foi o mais acertado. Detestaria ficar parado aguardando que meu destino fosse decidido pelos outros.

Concordei em silencio. Sabia que se não encontrássemos a abertura ou seja lá o que for, teríamos que tomar uma decisão drástica.

Entre as possibilidades de decisão seguramente não cabia voltar. Era o meu pensamento...

Fui deitar e dormi quase que imediatamente.... estava cansado. Estávamos dormindo em torno de seis horas e caminhando uma quantidade de horas que ultrapassavam o dobro das de sono.

Novamente fui acordado pelos dois que já estavam prontos a me esperar. Havia algo estranho ..Não sabia o que era....mas intimamente algo ali precisava ser explicado.... O que não demorou muito!!!

Sebastian tomou a dianteira e disse sem cerimonias... Estávamos aqui pensando em possibilidades... E, uma delas, que nos deixou bastante felizes é a que vamos lhe propor agora. Preste atenção...

- Como estamos, não vamos muito longe... Você por outro lado, pode desenvolver mais rapidamente sem nós dois ao lado...A proposta é que você vá na frente e deixe marcas para que sigamos sua trilha. Desse jeito você chegará mais rapidamente a lugares que nós, do jeito que estamos, não chegaríamos. É uma tentativa de sermos mais eficientes... Do jeito que estamos, só atrapalharíamos a jornada. Você é a nossa esperança de encontrar essa passagem. Desejamos boa sorte!!! Venha aqui e nos abrace velho amigo!!! Vamos celebrar esse momento!!!

Estava sem saber o que dizer... Já havia me acostumado com a convivência dos dois. Mas entendia a situação e achava coerente o que tinha sido dito. Levantei-me nos abraçamos desejando êxito nas nossas empreitadas. Verifiquei a mochila que o Sebastian havia preparado e parti pelo caminho a dentro... Tinha agora que encontrar essa passagem... Era uma questão de honra. Meus amigos dependiam disso!!

Rapidamente avancei pela trilha. Vez por outra olhava para trás na tentativa de ver uma nesga de luz das lanternas deles.

Passei bom período seguindo as orientações do Sebastian e agora estava sozinho... Agora era comigo... Minhas decisões, minhas observações... e o pior, o caminho tomado seria decisivo para todos nós...

Continuava a andar e a marcar alguns pontos de maneira que ficassem fáceis de serem seguidos pelos dois... Não tinha vontade de parar... Queria achar logo essa saída... Não sei quanto tempo andei, mas algumas horas depois, passei a ouvir não só o ruído do vento como de água caindo.

Me aproximei do pequeno córrego que fluía ao lado de umas formações rochosas e procurei ver o que poderia ser. As rochas no entorno estavam bastante encharcadas e frias. Minavam liquido com facilidade. Parecia que do outro lado havia uma grande concentração de água. Após breve momento de descanso, fiz as marcações e continuei andando câmara adentro...

Outra surpresa me aguardava à frente.... Havia uma área com as paredes revestidas de algum tipo de minério que refletia a luz da lanterna, provocando a formação de figuras geométricas de uma beleza ímpar... Parei um tempinho admirando as formações que a luz provocava com a incidência. Tornei a fazer a marcação e enveredei por uma outra área, mais ampla, que a caverna apresentava. Estava mais frio e a sensação era de que o vento se tornara mais forte...Até assoviava.

Buscava de forma precavida a fonte do ruído. Lembrava muito bem o episódio anterior onde quase fora engolido pelo despenhadeiro... Era difícil porque hora o ruído se apresentava forte e em outros momentos bem fraquinho. Os ecos sugeriam direcionamentos que poderiam levar a equívocos muito grande. Por isso todo cuidado era pouco. Deveria concentrar em outros sinais presentes... Encontrei uma bifurcação. Era um momento de definição. Qual caminho seguir. No primeiro momento, procurei fazer a sinalização para os que vinham atrás e sentei buscando meditar um pouco afim de buscar a tranquilidade necessária para decidir...Terminei dormindo de tanto cansaço que me encontrava.

Acordei e de forma intuitiva comecei a deslocar para a direita. Fiz a devida marcação e segui o rumo. No meu intimo era o caminho mais correto a seguir...Olhei para o pequeno relógio e percebi que havia dormido horas. Não havia tempo a perder...

A câmara que estava no momento, apresentava leve inclinação de subida e começava a se estreitar nas laterais formando um grande corredor. Apesar da inclinação não havia impedimentos que dificultasse o deslocamento. O frio começava a ser sentido. Isso para mim era um bom sinal.

Estabeleci uma meta de pelo menos mais quatro horas de caminhada com uma parada para descanso. Sempre tomando o cuidado de registrar o caminho e sinalizar de forma mais adequada possível. Já tinha um tempinho que não comia e o estomago estava reclamando. Duas horas de caminhada e encontrei pequena área ampla e circular formada por cristais que reluziam ao contato da luz. Muito bonita a área. Fiquei um tempo a observar as cores que surgiam quando a luz da lanterna incidia sobre eles. Por fim continuei a caminhada sem mais nada digno de nota ate chegar ao fim da trilha....

Não havia mais nada por lá... Grande frustação se apoderou de mim. Como é possível? Pensava... cadê a continuidade da trilha? Mas ali estava um fato... Não tinha mais caminho a seguir... Não estava acreditando no que via.... Olhei detalhadamente todo o espaço buscando uma brecha que fosse...Nada!!! De repente fique cansado. Como se todo o esforço de dias se apresentasse de uma vez só... Comecei a retornar, sem pressa, como que esperando por um sinal não visto... Retornei para a área dos cristais... Resolvi fixar acampamento ali...Precisava colocar os pensamentos em ordem....Não sei quanto tempo fiquei assim pensativo ou se dormi, o certo é que fui desperto com o barulho do Sebastian e Pablo se aproximando... Eles haviam alcançado... Graças a Deus estavam ali comigo... Aguardei que eles admirassem o local e me aproximei...

-Amigos!!! Bom vê-los!! Vocês foram rápidos!!! Disse em meio a um sorriso sem muita graça....

- Velho amigo, disse Sebastian. Que lugar espetacular é esse? Olha quantos cristais... Uma beleza!!!

- Vamos ficar um pouquinho por aqui...Vamos descansar...

- Pablo, venha ver isso? Aquele pontinho ali está brilhando na parede do fundo, ali sobre aquele ressalto...

- Pablo atraído pela informação, olhou por alguns minutos e começou a sorrir... Lindo!!! Lindo!!! E veio de encontro a nós e nos abraçou com lagrimas nos olhos...

No primeiro momento não tinha entendido o motivo de tamanha emoção, mas em seguida, observando melhor, sem a luz da lanterna, percebemos que era luz externa, era luz de alguma estrela. Estava ali, em cima, uma pequena brecha do exterior...Passei por ela e não havia percebido...Não havia ruído forte dos ventos porque não havia tempestade... Só tinha suave brisa a entrar no recinto...e era noite....

-Sebastian também ficou eufórico... Bem meus amigos!!! Encontramos a nossa saída. Recomendo que agente marque aquele ponto e vamos estudar como chegar lá em cima. Era uma subida de pelo menos trinta metros....

- Sebastian pediu para desarmar a mochila que levava e de lá começou a montar pequena antena de rádio...

- Sabia que poderia ser útil. Vamos ver se as interferências não vão atrapalhar os sinais.

Após montagem, iniciou tentativa de comunicação...Acompanhávamos tudo em silêncio. Ao ligar o rádio, grande ruído de estática se fez ouvir...

Sebastian buscava posições para estabelecer comunicação... A cada ponto novo, estabelecia contato e aguardava retorno... Se houvesse alguém na base, por certo entrariam em comunicação... Cada vez que ele falava pelo rádio, crescia a expectativa de alguém responder... Mas, só o silencio e a estática se ouvia. Nada mais...

Por fim deixou o aparelho de lado e olhando para nós informou...

- É, parece que estamos sozinhos... Vamos descansar e ver como chegar lá em cima...Temos muito que pensar...

Acordamos pela manha e o que vimos não nos animou muito... o Tempo estava novamente ruim. O ruído do vento agora era impressionante!!!

- Sebastian já tinha verificado os lados das paredes e imaginava uma forma de escala-las. O Pablo também havia feito observações a esse respeito. Apesar da idade demonstrava grande conhecimento sobre o assunto. Entre nós três, o menos experiente era eu. Portanto, aguardava pacientemente os informes dos dois. Sabia que pela minha condição, seria o primeiro a tentar subir. Precisavam de alguém para montar uma base no alto.

Ouvi atentamente as orientações dos dois e de que forma seria feita a subida... Assim que terminou, pude iniciar a escalada... Os primeiros metros foram tranquilos. Havia reentrâncias que facilitaram a fixação dos grampos. Os demais já não tinham essa facilidade. Fui obrigado a mudar constantemente de face da rocha em função de não haver possibilidade de fixação dos grampos. Outro fator que desestabilizava era o vento que entrava pela fissura existente acima. Muito forte e direcionado para a área em que me encontrava. Além do frio que passei a sentir a força não deixava ter um bom equilíbrio... Com muita dificuldade alcancei o espaço existente em frente a fissura da caverna. Não era grande, mas nos acomodaria com certa dificuldade...

Do ponto em que me encontrava ate o outro lado, ainda existiam pelo menos uns três metros. Teria que me lançar em um salto que possibilitasse alcança-la. Não seria nada fácil... Improvisei uma machadinha amarrada em uma das extremidades da corda na tentativa de lança-la para fora da fissura numa tentativa de prende-la. Várias foram as tentativas... O braço estava já protestando quando consegui que se fixasse em algum ponto do outro lado. Estiquei e fixei a extremidade no lado em que me encontrava. Agora era hora de fazer a passagem. Transpus o espaço com toda cautela do mundo... Ao chegar próximo da borda pude alcançar ponto de apoio e concluir a subida sem maiores problemas. Deitei no chão gelado e com aquela ventania que açoitava o corpo.

La em baixo ouvi os dois batendo palmas por ter conseguido... Procurei normalizar a respiração por alguns minutos... Dei uma olhadinha para o lado da abertura. Não era nada grande. Cerca de uns oitenta centímetros, talvez mais um pouco. Na verdade, parecia que tinha sido arrancado um pedaço daquela rocha. Os fragmentos pelo chão denunciavam isso. Não era uma abertura natural. Mas que importa? Natural ou não era uma abertura e era por ali que sairiam.

- Sebastian!!! Pablo!!! Estão me ouvindo bem?

- Sim, garoto!!! Respondeu Sebastian. Prenda essa corda e jogue a que você levou para baixo. Temos que iniciar a subida. Primeiro vão os equipamentos. Você consegue içar?

- Sem problemas!!! Pode amarrar.... Assim foi feita a primeira parte da subida. Os equipamentos que foram erguidos e como não havia espaço, foram colocados para fora da abertura da caverna. Foram amarrados para não serem arrastados pelo vento que naquele momento estava muito forte!!!

Feito os procedimentos com os equipamentos, era hora de erguer um deles. Seria o Pablo pois não estava em condições de dispender tanto esforço... A operação de içamento foi demorada. Feita com toda cautela para não piorar mais ainda a situação.... A maior dificuldade foi colocar ele sobre a plataforma. Nessa hora não teve jeito. Foi com certeza bastante dolorido para ele. Mas, aguentou firma sem reclamar...

O Sebastian veio logo na sequência. Apesar do joelho e ombro ainda machucados veio tranquilo...

Estávamos agora os três diante da saída...Felizes!!! nosso próximo passo era de tentar localizar onde efetivamente estávamos.... A visibilidade era muito pouca por conta da tempestade. A melhor opção, era a de montar tenda na entrada da caverna e atenuar o vento e frio que estavam fazendo.... Depois de descansar faríamos o reconhecimento do local...

Montamos a tenda e com isso trouxe um pouco de conforto térmico... Aquela massa de ar fria deixou de ser problema. Estávamos no momento protegidos. O Pablo que ate então estava ao lado, continuava a tentar comunicação com a base. De posse do rádio, tentava a todos os instantes, estabelecer algum contato sem sucesso. Não tínhamos potência para alcança-los....

O melhor a fazer era sentar e recompor as energias.... Não tínhamos mais o que comer...Nossos mantimentos já tinham sido consumidos muitas horas atrás... Via-se nos semblantes de todos que estávamos felizes com o desfecho ate ali... Não era muito religioso, mas agradecia aos Céus, a todos os instantes, por termos alcançado ali sem perdas de vida. Foi uma grande Graça alcançada....

A noite não demorou a se apresentar e com ela mais ventos e mais frio... Estávamos todos juntos, agasalhados e com os cobertores térmicos a nos cobrir. Mesmo assim o frio era de rachar!!! Sabíamos do perigo de hipotermia e precisávamos ficar vigilantes. Fizemos revezamento para dormir um pouco. O Pablo fez o primeiro turno. Não me fiz de rogado. Fechei os olhos e não demorei a dormir. Na verdade, apaguei literalmente e ficaria assim se o Sebastian não chamasse. Já havia amanhecido... Ele não me acordou para o turno. Fiz uma cara de reprovação, mas no fundo estava muito grato a ele por ter me deixado dormir...

- A tempestade não diminuiu. Acho que aumentou.... Vamos aguardar mais um pouco e depois vamos tentar ver se localizamos algum sinal externo que nos de a posição. Falou o Sebastian, olhando para fora da tenda. Antes de sair, pediu que acordasse o Pablo.

Ele estava relutante a acordar. Tive dificuldades para desperta-lo. Observando melhor, ele estava febril. Alguma coisa não ia bem ali...

- Você está sentido alguma coisa? Perguntei.

- Só cansaço!! Respondeu. Estou com dores nas costelas. Acho que foi devido ao esforço da subida. Talvez um pouco de febre...

Rapidamente o Sebastian retornou e informou que não havia condições de se aventurarmos. A visibilidade era pouca, o vento estava muito forte... Era mais prudente aguardar. Sinalizei para ele observar o Pablo.

- Pablo, deixa eu ver esses seus machucados. Você desprendeu grande esforço nas ultimas horas e quero verificar se está tudo em ordem. Feita a inspeção não foi encontrado nada visível que indicasse problema. Se fosse interno, naquela situação não havia muito a fazer a não ser repouso.

- Você está febril. Vamos acompanhar pra ver o que está ocorrendo.

- Está sentindo dores?

- Só o desconforto normal das costelas e o tornozelo quando faço um movimento brusco. A febre pode ser alguma infecção.... Ainda tenho algum remédio...

- Vamos tentar estabelecer comunicação com a base. Informa-los que conseguimos uma saída. Pode ser que eles nos ouçam.... Pelo menos a cada duas horas.... Por hora vamos descansar... Não há como sair nesse tempo....

O dia se arrastou sem mudanças da situação. A tempestade continuou implacável... As opções eram poucas agora. Ter paciência e pensar nas melhores possibilidades... O Pablo ficou dormindo enquanto estudávamos todo o mapa construído ate aquele ponto.

Pelas observações do Sebastian, se não houve grande desvio, estaríamos em algum lugar no vale. O problema era que no vale não havia entrada de caverna. Foi uma área muito batida por todos os guias a anos. Área inclusive para esquiadores. Se houvesse entrada de caverna, por menor que fosse, já teriam encontrado.

Se o tempo limpasse por algumas horas por certo conseguiria identificar a posição. Ficamos especulando possibilidades até que a noite chegou...O Pablo continuava dormindo. Verificamos e percebemos que a febre não sedia. Ao contrário, parecia aumentar. Isso nos preocupava...

Sebastian olhando para ele, demonstrava preocupação...

- É rapaz!! Se a febre do Pablo não cessar vamos ter que arriscar sair nesse tempo. Temos que encontrar algum sinal que identifique nossa posição. Depois tentar comunicação com a base para nos resgatar...

Hoje não vai haver revezamento de turno. Durma e se prepare para amanha sair em busca de ajuda. O nosso amigo está precisando o mais rápido possível...

Olhei para o Pablo e concordei em silencio. Estava na hora de nos mexer em busca de alternativas...

Me encolhi da melhor forma possível e fui dormi embalado pelos sons do vento lá fora...

Pela manha o tempo não havia se alterado... O Sebastian estava com o semblante de cansaço. Deve ter ficado a noite toda acordado observando o Pablo...

Ele me viu acordar e passou algumas instruções... teria pelo menos uns trinta minutos lá fora. Se não enxergasse nada que voltasse. Acertamos os relógios e sai sem pensar muito...

O frio la fora estava de matar. A sensação térmica com o vento não deixava duvidas do perigo que corríamos. A cada passo que dava parecia que carregava toneladas nas pernas. Isso porque estava usando uns suportes adequado para andar na neve. Segui uma linha imaginaria, sempre tentando observa algo que fosse digno de nota... Nada!!!

A visibilidade era de uns poucos metros... Pedras, sombras, depressões, subidas, tudo era observado, mas nada dava indicação de onde nos encontrávamos. Os trinta minutos já se esgotavam. Era hora de voltar... O retorno se deu com maior dificuldade por conta do vento, mas, consegui chegar ao ponto de partida. O que pude observar de momento foi apenas a formação rochosa onde se encontrava a tenta que montamos no formato de concha quebrada no seu ponto mais alto. Nada mais... Entrei e fui recepcionado pelos dois amigos que me olhavam em busca de boas notícias...

Retirei as proteções extras que levava e me posicionei nos cobertores térmicos para recuperar um pouco a temperatura...

Contei minuciosamente o que tinha registrado...

O Sebastian pediu para descansar por duas horas e depois sair em uma nova tentativa. Desta vez em direção oposta....

A segunda tentativa foi mais suave. Não estava com muito vento e o piso não oferecia muita resistência. Tinha uma pequena inclinação. Porem, mais uma vez, os trinta minutos se passaram e nada foi verificado que indicasse a nossa localização. Para todos os lados que olhava, só via um mundo branco e sem fim.... A visibilidade continuava comprometida pela tempestade. Hora de voltar..... No retorno, escorreguei em uma saliência existente no caminho... Estava escorregadia e quase me cortava...Algo estava parcialmente encoberto pela neve...E era metálico. Pude comprovar ao observar melhor... E para minha surpresa parecia parte da calda de um pequeno avião...Aquele achado me encheu de alegria... Veio à mente o nosso motivo primeiro a estar ali.... Achar um avião que havia caído... Sem pressa, ignorando o frio intenso, inspecionei o objeto para certificar não estar errado... Realmente, era parte da calda de um avião. Bastante danificado. Provavelmente por algum choque com o solo ou rochas... Voltei o mais rápido que pude para contar o fato aos demais... Fui recepcionado pelo Sebastian que estava preocupado com a minha demora. Demorei muito inspecionando a calda do avião.

- Porque demorou tanto amigo? Ficamos preocupados... Já ia sair em sua procura....

Ouvindo tudo e não resistindo a alegria, contei aos dois sobre o achado...Detalhei tudo que pude observar. Formato, cor, parte de numeração, tamanho, enfim, tudo que pude registrar...Esse achado era muito importante para sinalizar a nossa posição.... Primeiro porque agora sabíamos que estávamos no vale. Provavelmente a calda do avião se desprendeu o bateu na rocha que provocou a abertura da caverna em que nos encontramos agora... Eram suposições, mas que tinham certo fundamento.... Olha, se a calda era do avião que caiu, por certo o avião não estava longe dali...

Precisávamos localiza-lo... Agora tínhamos um norte a seguir... Não estávamos mais no escuro....

O resto do dia ficamos construindo possibilidades para localizar a aeronave...

Fomos deitar já tarde da noite.... Na manhã seguinte, seria uma jornada muito dura e solitária. Teria que desbravar melhor a região e localizar a aeronave. O Sebastian e o Pablo não teriam como seguir. Estava sozinho e com uma responsabilidade muito grande sobre os ombros. Precisava de toda energia possível principalmente porque já fazia alguns dias que não ingeria alimentos...

A Manha iniciou como os dias anteriores. Muito frio, ventos e pouca visibilidade.... Acordei bem mais disposto do que no dia anterior... O Pablo estava dormindo ainda e com febre que não cedia. O Sebastian ao lado dele, verificando a situação... Sabia que não tinha muito o que fazer. A única chance nossa era de achar uma forma de comunicação com a base. Sem isso o resgate não viria. Não havia como voltar para o ponto de apoio na caverna. Era uma cartada final....

Estava muito magro...As roupas estavam sobrando em mim... Comecei a me organizar para sair...Sem pressa. Como se tivesse todo tempo do mundo.... O Sebastian relembrou as ultimas observações discutidas no dia anterior. Com palavras de animo e de otimismo, me levou ate a entrada da tenda. Antes de sair, olhei para o Pablo e pensei ter visto um aceno feito pelo rapaz e um leve sorriso... Com um grande abraço, o Sebastian se despediu e olhando nos meus olhos disse sem temor...

- Vá sem medo.... Confiamos em você.... Vai dar tudo certo....

Sai decidido a buscar ajuda... Morreria tentando se isso salvasse a vida deles... Esses poucos dias, aprendi tanta coisa e passei a respeitar essas pessoas que se mostraram fortes e destemidas... Poucos dias de convivência e era como se nos conhecêssemos a anos...Os pensamentos não paravam de brotar... O frio, parecia não me incomodar... Sabia o que estava em jogo... Não precisavam de palavras ... Durante a jornada era como se um filme de minha vida passasse diante dos meus olhos... Quantas coisas deixei de fazer. Quantas pessoas deixei para traz... Quantas machuquei com meu comportamento indiferente e inconsequente.... Esse é um daqueles momentos que você se olha no espelho da alma e se pergunta: Se houvesse uma segunda chance? Como seria? Faria a mesma coisa?

A jornada estava difícil... Os ventos açoitavam o corpo mesmo por cima de tanta proteção. Era duro manter o equilíbrio. Mas, tinha que continuar... Não havia outro jeito...Sabia o que estava em jogo... Em outras épocas, cairia por ali mesmo e deixaria que o frio e os ventos fizessem o seu trabalho.... Mas tinham os dois lá aguardando com fio de esperança que a jornada tivesse êxito... Não podia decepciona-los. Não conseguiria ter paz se desistisse tão facilmente...E a neve caia, e o vento rugia e açoitava meu corpo sem piedade... O Deus!! A sua ajuda senhor!!! Não por mim, mas pelos que confiaram suas vidas a mim....

Constantemente era obrigado a me inclinar tentando escapar da fúria da tempestade. Não havia lugar para abrigo, não tinha como parar... Os pequenos momentos eram apenas para recompor o folego e seguir adiante...O cansaço se apresentava a todo os instantes... Já não conseguia andar sem cair... Não sei quantas vezes me levantei.... nem quantas vezes cai... mas cada queda demorava mais um pouco a me erguer... A neve que caia em profusão, já não me incomodava tanto. O desejo era quase irresistível de ficar ali deitado... A noite se aproximava... Meu rosto ardia, meus pulmões ardiam... minhas mãos não sentiam direito.... Meus pés como chumbo se recusavam a seguir... Na minha mente aparecia sempre a voz ....” vá sem medo.... confiamos em você... não desista.... vai dar tudo certo....” a voz teimava em repetir... Não conseguia pensar em outra coisa.... Estava escuro... Estava escuro... Faço o que? Faço o que? De repente cai ao solo e num grito de angustia.... Berrei a plenos pulmões: - Desculpe!!! Desculpe!!! Não consigo... Não consigo.... As lagrimas veio e o choro farto se fez presente....

Não sei por quanto tempo permaneci assim.... Ainda ajoelhado na neve, olhava para os céus à procura de um sinal.... Nem uma estrelinha, nem um raio de luz!!! Nada....Que fim melancólico... Tudo escuro... nada nos céus... Só o vazio da noite, o vento, a neve e.... uma luz vermelha a piscar ao longe... No primeiro momento, pensei ser alucinação, bati no rosto algumas vezes... A luz vermelha continuava a piscar... Não era minha imaginação... Com dificuldade me arrastei em direção à luz... Era o avião!!! Era o avião!!! Achei... Finalmente achei!!.... Com muita dificuldade alcancei o que foi outrora a porta de entrada. Por certo, lá dentro, teria proteção do frio...Entrei e me joguei no assoalho... Estava extenuado... estava feliz.... Apos alguns minutos que pareceram horas, comecei a mapear a aeronave. Buscava alguma coisa para comer, algo para aquecer... Encontrei algumas ferramentas, parte do que foi um kit de primeiros socorros e vários cobertores... Rapidamente me enrolei neles... Na mina busca, alcancei a cabine e vi o radio... Será que funciona? Não custa tentar....

- Base, chamando base!!! Cambio..... Estática e mais nada... Base, alguém por ai? Estamos no avião que caiu no vale, estamos no avião que caiu no vale.....Gritava a plenos pulmões mas a voz saia fraquinha...Sem forças....Cambio!!! Alguém me escuta?

Estamos vivos.... Nada... nenhum sinal.....Então era assim.... Sem forças para voltar, sem forças para prosseguir...Permaneci alguns minutos a contemplar o painel da aeronave....

- Aqui é a base!!! Aqui é a base!!! Repita localização!!!Estamos lhe ouvindo!!! Repita localização!!!

Com um sobressalto, despertei e respondi ao chamado... Base!!! Estamos na aeronave que caiu no vale!!! Precisamos de socorro rápido...Precisamos de socorro rápido.... Desmaiei... Foi a ultima coisa que me lembro naquela noite...

Quando despertei estava todo enrolado e com umas bandagens no rosto e nas mãos.... não conseguia me mexer... Parecia que estava em uma cama de hospital... O corpo todo doía e respirava com auxílio de oxigênio.... Passavam mil coisas pela minha mente...

Aos poucos a visão se ambientou ao local... Não estava enganado!!! Era um hospital....

Tentei levantar e fui impedido por alguém que estava ao meu lado.... Tentei falar e a voz não saia... Quanto tempo estava ali? E os outros? Meu Deus, o Sebastian e o Pablo...Cadê eles? Tinha que buscar ajuda para eles.....

Tentei virar a cabeça para ver quem estava ali e não conseguia.... Tentei pedir ajuda e nada...Meu desespero crescia pela impossibilidade de estabelecer comunicação e pedir ajuda para os outros....

- Descanse velho amigo.... Deu tudo certo... Estamos vivos....

Era a voz do Sebastian.... ele se posicionou à minha frente.... Ombro enfaixado, olhou-me e disse baixinho.... Descance.Voce conseguiu... Você conseguiu.... Fomos resgatados.... Estamos bem....

De repente lagrimas vieram aos olhos... Fruto de dias de tensão e incertezas.... Deu tudo certo!!! Deu tudo certo.... Não conseguia parar de chorar... Era de felicidade... Era como um peso enorme tivesse sido retirado de cima do peito... Havíamos sobrevivido....

Nos dias subsequentes fui informado do que ocorrera naquela noite... De como eles me encontraram e de como encontraram os demais...

O Pablo ainda se recupera dos machucados, mas está fora de perigo...Tive a oportunidade de visita-lo. Eu, me recupero das queimaduras que tive por conta da exposição com o gelo, mas já estava no processo de cicatrização...

Meses depois, estávamos inaugurando uma nova atração no vale... Tratava-se de uma catedral de cristais recentemente encontrada... Os guias e descobridores da caverna eram os que iriam apresentar aos turistas e pesquisadores o novo ambiente....