A Lagoa do Dragão Enfurecido

O sol já ia alto.

Isamu saiu da estrada e aproximou-se de uma lagoa, em cujas margens cresciam juncos e salgueiros que forneciam uma sombra acolhedora. Pensou que poderia encher sua cabaça de água, tomar um banho, e talvez descansar um pouco antes de preparar uma refeição e seguir caminho até a aldeia mais próxima. Não esperava, contudo, encontrar oposição armada aos seus planos: um rapaz de quimono escuro pulou de trás de uma árvore, apontando-lhe uma lança naginata em atitude ameaçadora.

- Alto lá! Aonde pensa que vai?

- Até a lagoa, encher minha cabaça... se não for proibido - replicou Isamu, tentando parecer inofensivo, apesar da espada ninja-to que trazia ostensivamente atravessada no cinto.

- Esta lagoa pertence ao povo de Kitamura - declarou o jovem, sem baixar a naginata. - Se quer apenas matar a sede, entregue sua ninja-to e eu a devolverei quando partir.

Isamu ergueu os sobrolhos. Será que o lanceiro o estava achando com cara de idiota?

- Escute... - começou a dizer, quando foi interrompido pela súbita aparição de um grupo de quatro homens usando máscaras bugaku de madeira - e empunhando naginatas.

- Armadilha! - Gritou o lanceiro, desesperado.

- Se não são seus amigos, meus também não são - retrucou Isamu, mão no cabo da ninja-to.

Eram dois contra um, na melhor das hipóteses, e apenas o lanceiro possuía uma naginata. Todavia, o que os atacantes não sabiam, é que Isamu era versado na arte marcial do daito-ryu. Enquanto o lanceiro duelava com seus dois oponentes, escorando-se num salgueiro para defender-se melhor, Isamu deixou que seus dois adversários se aproximassem. Apenas quando um deles chegou perto o suficiente e ergueu a naginata para baixá-la em sua cabeça, ele sacou a ninja-to e deu um golpe preciso no ventre do atacante, o suficiente para cortar pano e pele e desviar a atenção do mascarado. Quando este baixou a cabeça para ver o estrago, Isamu já havia girado o corpo e estava ao lado dele, a ninja-to erguida. Deu uma rasteira no homem e a espada cortou seu pescoço, fazendo o sangue esguichar. O outro adversário, não querendo ter o mesmo destino do seu companheiro, girou defensivamente a sua naginata à frente do corpo. Isamu ficou imóvel, aguardando o ataque. Quando o oponente projetou a lâmina, ele apenas desviou o corpo, e novamente, girando de um lado para o outro sem erguer a espada. Finalmente, quando a lâmina curva da lança passou a centímetros do seu peito, ele estendeu um braço e a puxou pelo cabo. Com ela, veio o adversário - que encontrou pela frente o cotovelo de Isamu. Antes que caísse ao solo, Isamu soltou o cabo da lança e girou a ninja-to no ar: mais um pescoço cortado.

Vendo a carnificina, os outros dois mascarados, que não estavam conseguindo furar a defesa do lanceiro, resolveram bater em retirada, perdendo-se em meio às árvores. Isamu levou um tempo atento aos arredores, até finalmente embainhar a espada. O lanceiro aproximou-se, e fez uma profunda reverência.

- Não sabia que estava diante de tão formidável guerreiro... devo-lhe minha vida! - Agradeceu o rapaz.

- Como se chama? - Indagou Isamu.

- Eu sou Yakamochi, de Kitamura, ao seu serviço.

- E eu sou Isamu, um peregrino para Towada.

Ambos curvaram-se então, frente a frente.

- Quem são estes homens? - Indagou Isamu em seguida.

Yakamochi curvou-se sobre os dois corpos e removeu as máscaras de suas faces.

- Sicários de Kanezane... um homem muito mau que persegue o povo de Kitamura. Provavelmente, irá tentar de novo - declarou Yakamochi com ar sombrio.

- Tentar... o quê? - Inquiriu curioso Isamu.

Yakamochi voltou-se para as águas plácidas da lagoa esmeralda, mais adiante.

- Despertar a fúria do dragão que vive no fundo daquelas águas.

[Finaliza em "O Dragão Ataca"]

- [23-01-2019]