311 - O Contrabando

A mulher levantou-se antes, fez o café e as torradas, pôs a mesa e vestiu sobre o torso nu a malha de algodão leve. A praguejar contra a temperatura da água ele saiu a escorrer do chuveiro, vestiu a mesma roupa, descuidou o cabelo caído sobre a testa, comeu, abriu a grossa carteira para confirmar a presença do dinheiro, beijou-a e disse: - vamos. Ele entrou na Diamond verde e a mulher no Dodge descapotável. Ela ia à frente verificar se a estrada estava livre de fiscais, se não havia movimentações suspeitas enquanto Serafim aguardava, escondido, o aviso que ela daria no regresso da pesquisa. Só depois a viagem para o interior começava. Ele entrava em todos os caminhos que levavam às lojas perdidas pela extensão enorme daquele território. Aguardavam-no para a compra do peixe seco, base da alimentação da população que vinha comprá-lo ao lojista. Entre a cerveja e meia dúzia de amendoins torrados e a troca de informações ou notícias, o negócio consumava-se. O ajudante negro trazia as embalagens do peixe, Serafim recolhia o maço das notas, abria o sorriso alvar e recomeçava o trabalho de distribuir o produto fugindo a todas as fiscalizações e impostos. Pernoitava em estalagens perdidas naquela imensidão. Jantava à luz de candeeiros a petróleo, acordava antes de todos para evitar maus encontros e, no fim da viagem, cheio de poeira das estradas sem asfalto, tomava banho e dormia muitas horas seguidas. Depois, lia as notícias num jornal antigo, bebia , jogava à sueca e trocava calorosos apertos de mão antes de regressar, agora pelas vias principais, ao litoral. Buzinava ao entrar no quintal e recebia dela as boas vindas. Riam muito. A felicidade cheirava a suor.

Edgardo Xavier
Enviado por Edgardo Xavier em 06/11/2020
Reeditado em 06/11/2020
Código do texto: T7105137
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