Almoço: Preá ou Peba

A SAGA DA FAMÍLIA NOBRE

Episódio 09

A vida do Sertanejo Nordestino nas décadas 50 e 60, era muito difícil, principalmente no ano de 1958 , quando teve uma das mais graves secas, sendo na época decretada calamidade pública.

Continuando a Saga da Família Nobre no ano de 1963, devido a vida difícil no Município de Banabuiu, Ce, meus pais e meus irmãos mais velho sem emprego e a convite de um amigo, fomos morar na Fazenda Guarani, localizada no Município de Pacajus.

Na época eu tinha 08 anos, porém era norma da Fazenda Guarani, toda família que viesse morar tinha que trabalhar, então minha mãe foi ser professora primária, minha irmã mais velha Edy, foi ser enfermeira, meu pai, eu e meus irmãos, fomos trabalhar na fábrica de castanha.

O trabalho era de segunda a sexta feira, tinha que acordar seis horas da manhã e ir para o campo, apanhar caju, quando era meio dia, vinha o trator recolhendo as latas cheia de caju e quando retornava para a fábrica, todos que estavam no campo ia na carroceria do trator, que deixava os trabalhadores em casa a maioria crianças e adolescentes.

Após o almoço eu e meus irmãos íamos para fábrica a pé, que não ficava muito distante da casa, para concluir os trabalhos, ou seja agora a meta era tirar a castanha do caju.

Eu lembro que tinha uma esteira bem grande com água corrente e dentro o caju, que passava boiando e a gente se posicionada na máquina e pegava o caju um por um e através da maquineta tirava a castanha, que depois era pesada e anotada para o pagamento no final de cada semana.

A minha rapidez pra tirar a castanha era de dar inveja, o trabalho era por produção, quanto mais castanha na lata mais dinheiro.

Lembro como se fosse hoje de um detalhes, eu me concentrava tanto que perdia a noção do tempo. Pegava o caju após tirar a castanha jogava na tina de madeira que ficava atrás nas minhas costas, era um movimento repetitivo.

Depois da tina de madeira cheia vinha um empregado e recolhia com um carrinho tipo patinha.

Em uma dessa ocasião eu não vi ele retirando a tina e continuei jogando o caju sobre as minhas costas, caíndo ele no chão, quando inesperadamente vinha o gerente da fábrica Sr. MÁRIO, mostrando a produção a uns visitantes de Fortaleza e eu sem ver o gerente, continuei jogando o caju, porém quando ele viu parou ao meu lado e disse : "menino pare com isso e vá lá pro escritório ".

Confesso que tomei um susto fiquei de cabeça baixa e a comitiva continuou a visita.

Por causa desse episódio levei só uma advertência e retornei aos trabalhos.

Pois bem, devido eu ser menor de idade, bem como meus irmãos, meu pai era quem prestava contas da nossa produção e recebia o dinheiro.

Confesso que esse trabalho era uma diversão, porém, tínhamos responsabilidade de chegar no horário e sair todos os dias mais cedo para ir pra escola.

Tudo era financiado pela empresa Cajubras, que dava a casa para cada família morar com água e energia grátis, isto era norma da empresa, toda família tinha que trabalhar, para ser beneficiada com a moradia grátis.

Antes de ir para escola a maioria das crianças e adolescentes, inclusive eu iamos para o pátio da igreja assistir televisão em um telão e os filmes que passavam na época era rintintim , viagem a fundo do mar e perdido nos espaços, contudo, após o filme a maioria seguia para escola.

Nos finais de semana, ou seja sábado e domingo eu acordava cedo e ia caçar , juntamente com os amiguinhos que moravam vizinho a minha casa.

Cada um com sua baladeira ( estilingue), um bozo cheio de pedrinha e um canivete.

A gente adentrava no matagal existente na própria fazenda, só ouvia barulho parecido com assobio, barulho de matracas e de pássaros voando.

Para capturar peba e preá , os animais existentes na região, usava - se uma armadilha chamada de fojo, que era colocado na vereda ( caminho onde passava os animais).

Somente no dia seguinte era que a gente vinha verificar se tinha caído algum animal.

As vezes a gente era surpreendido, quando abria o fojo, havia era cobra cascavel animal típico da região, porém, era uma tarefa difícil que a gente tinha pra retirar a cobra, contudo sempre quem executava essa tarefa era o colega Henrique , que na época tinha 15 anos , era o mais velho da turma.

Henrique também tinha a tarefa de desarmar as armadilhas, que na maioria das vezes pegava preá, peba ou tatu.

Nesse intervalo ficávamos caçando de baladeira(estilingue), a fim de capturar avoante e rolinha.

Essa era a sobrevivência do homem do campo naquela época, que tinha como "mistura" para o almoço ou jantar animais da caatinga nordestina.

Realmente era difícil comprar carne de boi, porque não tinha na fazenda, vez por outra comprava -se peixe.

Tinha que se virar como diz na gíria e a única alternativa era a caça.

E um detalhe, quando não se trazia nada, a gente com medo do " carão " de nossos país, arrajava-se qualquer solução.

Certa vez voltávamos da caça sem nada todos com fome, isso já era duas horas da tarde, éramos em números de quatro, todos na faixa de 09 anos de idade, somente Henrique tinha 15 anos, o qual era o encarregado do grupo e pra completar levamos uma carreira da caipora.

Segundo a lenda, Caipora é uma figura do folclore brasileiro, considerada a protetora dos animais e guardiã das florestas.

Ela ataca e agride os caçadores, solta uivos e gritos, assombrando-os.

Se você levar fumo pra ela, segundo reza a lenda, ela não ataca é deixa você caçar.

Como a gente já sabia disso, sempre levava no bozo fatias de fumo e deixava amarrado nos galhos das árvores, para a caipora pegar.

Mais na frente paramos e sentamos no chão pra conversar e arranjar uma maneira de chegar em casa com alguma coisa, quando Henrique teve uma ideia.

Ele olhou pra mim, lembro como se fosse hoje devido o susto, que tomei e disse: "vamos passar no açude e pegar rã, para comer", pra mim comer rã era coisa do outro mundo, porém para Henrique não, ele tinha costume de comer animais anfíbios.

E assim procedemos, pegamos aproximadamente umas quinze rãs, todas grande e gordas, contudo as rãs foram tratadas ali mesmo na beira do açude.

Quando chegamos em casa, dividimos a carne e entreguei a minha parte a mamãe, que a priori achou esquisito, contudo nada falou, temperou e colocou no fogo e todos naquele fatídico dia saboreamos carne de rã.

Moral da História

Somente muito anos depois foi que eu contei a história verdadeira pra minha mãe, que apenas disse " tu quando era menino, era muito danado mesmo".

No Nordeste naquela época tinha que se virar de qualquer maneira, senão passava fome, cada qual com sua comida típicas e as vezes exóticas.

Quanto a Caipora, todo menino naquela época, quando se danava ou não queria ir dormir cedo, nossos pais dizia: " vou chamar a caipora e os meninos morriam de medo.

CONTO de Edilberto Nobre baseado em fatos reais.

10.03.3021.