A Jabuticabeira

Era um menino, que como eu, sentia a trilha ao seu redor. Nunca identificou o porquê, mas era como flutuar sobre nuvens.

Seu sonho era ser uma árvore com galhos lotados de frutos, que alimentaram animais, crianças, transeuntes. Todos se admirariam com tamanha doçura de seus frutos.

Assim, ele buscava e mapeava todas as árvores frutíferas em seu caminho e retirava de cada uma delas uma lembrança do que gostaria de ser, ou, que já o era. Uma busca sem objetivo aparente, até encontrar uma árvore especial em seu caminho.

Tronco liso, folhas com nervuras protuberantes apesar de quase transparentes, frutas arredondadas e suculentas, com uma casca levemente resistente.

Imaginou como seria ser aquela planta, mas logo sua paixão foi sendo substituída por um desejo de ter aquela árvore para si. Porém, a única forma de tê-la sem tirar sua liberdade, seria colocá-la no lugar mais inacessível que pudesse encontrar.

Aventureiro como era, não podia deixar de se imaginar entrando em uma trilha fechada com suas sementes em mãos, buscando alcançar o inacessível. E, assim, ele partiu.

Comprou equipamentos, vestiu sua capa protetora contra espinhos, calçou sua bota de couro, calça e camisa compridas e entrou na mata densa, rumo ao pico da montanha , até então, nunca escalada.

Andou, escalaminhou, se feriu. Passou de solos pedregulhosos aos Barretos e escorregadios, mas não alcançava o fim. Sua respiração aumentava, até seu cérebro se concentrar inteiramente no ritmo necessário para suprir oxigênio. As pedras, os galhos, os espinhos passavam como recortes de cenas de um filme. Em seus pensamentos haviam apenas palavras: ar, morte, vida, cor, mosquitos.

Diante do desafio de vida, ele sentia que seu corpo não estava preparado e talvez não aguentasse chegar ao final. Mas, ele continuou até seu corpo parar. Seus músculos tremiam e não tinham mais impulso, seu cérebro cansado e confuso, sua pele perfurada pedindo atenção a dor, os barulhos já não eram mais ouvidos e ele não avistava mais nenhum alimento para lhe dar energia, além das jabuticabas que havia colhido.

Primeiro, colocou uma única na boca,as seu desejo não foi contido e sucessivamente engolia as demais, até restar uma última, que guardou dentro de sua mochila. Se debruçou em uma árvore caída e descansou por 2 horas, sendo acordado por um besouro que pousou na ponta de seu nariz.

Ele, então, prosseguiu, até, finalmente, alcançar o alto da montanha. Vitorioso por sua conquista, pegou a fruta restante, tirou sua semente e colocou-a em um pedaço de algodão embebido na água do riacho que cortava a montanha.

Esperou alguns dias para que a semente brotasse, colocou-a na terra e ficou mais alguns dias até que ela estivesse firme para sobreviver. Seu tempo era unicamente para coletar víveres e cuidar daquele ser que ali crescia.

Passaram-se semanas e a planta cada vez menos necessitava de cuidados, mas a atenção às suas necessidades não diminuía. O menino, agora homem, não se via mais sem sua árvore, antes fantasiosa, mas que agora era uma realidade. Ele criou raízes, métodos, vida junto a ela. Quando seus sonhos se concretizaram e sua planta deu seus primeiros frutos, sua alegria foi tanta, que sentia que aquela energia poderia durar para sempre.

Após anos a fartura da árvore se tornou seu maior vazio. Anos de proteção e dedicação, protegendo-a de chuvas e raios. O amor deu lugar ao ódio e toda a vida parecia não ter mais sentido. Tudo que poderia sentir, já estava sentido.