O cavaleiro das profundezas

Era um peixe fora da água!

A batalha intensa não lhe era desconhecida, tampouco era um mal combatente, muito pelo contrário. O problema era o contexto. Lutar em meio a lama e planícies era fácil. Batalhar em um navio em meio a uma chuva de ventos fortes era uma experiência nova. Matou alguns dos piratas que havia abordado a embarcação, mas eles eram leves e ágeis e tinham uma vida de pilhagem que lhes dava uma vantagem no combate.

Seus compatriotas eram lançados ao mar como eram despejados os dejetos nas ruas de Londres. Os inimigos eram ferozes e implacáveis. Um homem caolho cortou uma das cordas, que liberou a tensão e fez subir uma roldada com tanta velocidade que parecia uma pedra sendo lançada de um estilingue. A pesada roldana acertou três homens pelo caminho, tirando-lhes sangue e quebrando os frágeis ossos que se partiram com o impacto. Um tiro de canhão vindo do navio inimigo levou ao mar mais algumas pobres almas. Os inimigos não se importavam com os seus. Disparavam e agrediam pelo simples prazer de matar e gerar o caos a bordo do Velho Viajante.

O navio do rei levava mais de oitenta bons combatentes vindos do oeste, todos cansados e ansiosos por suas casas. Muitos já não teriam a chance de revê-las.

— Senhor! — esgoelou o primeiro imediato.

Uma bala de canhão passou zunindo sobre sua cabeça e atingiu o mastro principal. A viga rangeu violentamente, fazendo o som se sobressair e congelar a batalha por alguns instantes. Todos olhavam para o mastro que caía ameaçadoramente na direção da proa. Um vento violento vindo do leste esticou a vela, que ainda estava presa ao pedaço do mastro, e fez com que a larga viga de madeira fosse para o mar, levando consigo mais seis almas que estavam no caminho. Entre eles o capitão do Velho Viajante.

Sacou a pistola e disparou contra o homem raivoso que corria em sua direção. O tiro acertou o peito do homem que caiu de costas. Ágil e experiente, virou a pistola e começou a usá-la como um porrete. Não tinha tempo para recarregar a arma. Bloqueou a lâmina de um novo adversário e deu-lhe uma coronhada na nuca. O rapaz bateu contra o parapeito da popa e ficou inerte no chão. Derrubou mais dois atacantes com dificuldade, sendo quase derrubado escada abaixo pelo segundo. Suas pernas já não respondiam com a mesma agilidade de antes. Era difícil manter o ritmo de ataque e defesa que os piratas impunham sobre ele.

Sentiu o impacto nas costas com tanta violência que não foi capaz de se manter em pé.

— Vocês lutaram bem, señor Carter! — disse uma voz rouca e pigarreada com um sotaque espanhol forte que se destacou em meio a barulheira que ia diminuindo. — Mas nós fomos melhores hoje!

Carter se virou, ainda caído, para ver seu algoz. O pirata que se dirigia a ele era ninguém menos que Don Perez de Alcatara, a Morte da Tempestade. Don Perez havia sido um corsário espanhol famoso antes de sucumbir à pirataria. Era capaz de manter um navio em curso como poucos e a violência de sua tripulação se equiparava a do famoso Barba Negra.

Era como se a tempestade estivesse sob o controle dos piratas. Uma vez perdida a batalha, os ventos pararam e o mar se acalmou. A chuva deu lugar para uma fina garoa e o estrago se fez visível. Dos oitenta homens que voltavam para Inglaterra, pouco mais de vinte ainda estavam vivos sob a ameaça pirata.

— Você é famoso, señor Carter! — disse Don Perez, enquanto avaliava os corpos mutilados ao redor da popa. — Dizem que matou tantos piratas enforcados em Port Royale que faltavam cordas para tantos pescoços.

— Fico feliz de ter livrado o mundo da sua laia!

Don Perez riu, sendo seguido por seus homens.

— Me gusta nobres como o señor. Destemidos e cheios de si, mesmo diante da morte. Mas se existe uma coisa que que eu aprendi em minhas matanças é que o señor só não se deu conta ainda que não há mais esperança.

O sorriso amarelado em meio à barba negra era assustador. Tateou o chão a procura de seu sabre, mas na queda a espada caira longe demais para que pudesse alcançá-la discretamente.

— Ele quer lutar, capitão! — disparou um dos piratas que olhava fixamente para Carter.

O capitão pirata se virou para o nobre caído e balançou o dedo em negação.

— Ainda não, señor Carter. Vai perder o espetáculo.

Ao ouvir essas palavras, o nobre se levantou para observar além do parapeito da popa, em direção ao centro do navio. Cordas eram lanças para cima e agarradas pela ponta. Na outra extremidade os pescoços dos vinte sobreviventes eram envoltos pelo fim.

O sinal foi dado e os ingleses foram erguidos do chão e seus pés balançavam desesperadamente. Os piratas riam e se divertiam com a cena, enquanto Carter observava horrorizado a morte de seus compatriotas.

— Maldito! Pare com isso! — gritou ele em protesto.

— Não, señor Carter. Como você mesmo disse, em um discurso em Port Royale, todos os piratas devem ser enforcados.

— Eles não são piratas!

— Para mim são — limitou-se sombrio o capitão espanhol. — Joguem no mar!

Irritado e desesperançoso, Carter se lançou sobre o primeiro pirata que encontrou e tirou-lhe a arma da bainha, empurrando o homem com um pontapé.

— Bravo! Bravo! Me gusta seu espirito! — aplaudiu Don Perez. — Se não fosse um enforcador de piratas até lhe daria a oportunidade de se juntar a nós, mas sabe como é, tenho que obedecer a tripulação, e eles querem sua cabeça.

— Nunca me juntaria a vocês, vermes!

— Ótimo! Isso resolve muita coisa. Prendam ele, mas não o matem!

Oito piratas partiram na direção de Carter que brandia a espada violentamente, atingindo dois homens no processo, mas foi logo contido. Ver os ingleses pendurados e o navio tomado de piratas havia lhe diminuído o ímpeto, ainda que houvesse aumentado sua ira, mas isso não foi suficiente para afugentar os captores.

— Então, a pergunta que resta ser respondida é o que fazer com o señor Carter — disse Don Perez em alto e bom tom para a interação da tripulação de patifes.

— Enforque ele! — disparou um.

— Tire a cabeça! — gritou outro.

Mais duas ou três ideias surgiram, uma mais violenta que a outra e Carter começou a gelar.

— Sí, sí. Todas boas ideias, mas são rápidas. Estamos com o enforcador inglês mais famoso do Caribe, señores. O que é isso?

Dois piratas tiravam da cabine uma armadura de cavaleiro inglês da era medieval que Carter havia reavido de um navio mercante ilegal alguns anos atrás, e que seria devolvida para Inglaterra, se tivesse concluído a viagem.

— Magnífico! Tragam aqui!

Os dois homens subiram a armadura de metal com certa dificuldade. Era uma armadura completa de placas, brilhantes e bem conservada. O metal refletia a luz do sol que se tornara visível após a tempestade.

— Señor Carter é um nobre, e deve morrer como tal. Vistam o nobre cavalheiro!

Os piratas riam e se divertiam com a ideia de seu capitão. Com dificuldade vestiram o prisioneiro que se debatia para não ser vestido com a armadura, até levar uma cacetada na nuca e apagar por alguns segundos. Após acordar e das várias investidas dos piratas, Carter estava completamente vestido, dos pés à cabeça, com as mãos amarradas nas costas.

— Muito bem! — disse Don Perez quando seus homens terminaram. — Quanta dificuldade, por Deus! Falta algo, o que pode ser?

Ninguém se movia. Carter respirava pesadamente debaixo do elmo, e praticamente não via o que estava acontecendo, porque os piratas haviam posto o elmo errado em sua cabeça. O silêncio que precedia a morte era a parte mais terrível.

— Mas claro! A espada! Um nobre precisa de sua espada! Vamos, deem una espada para el!

Um dos piratas prendeu um cinto na cintura de Carter que teve pouca resistência ao ato. O capitão pirata aplaudia o nobre vestido de cavaleiro e seus homens o seguiam em ressonância.

Além de derrotado, ainda era obrigado a ser humilhado antes da morte. O único pensamento consolador é que havia livrado o mundo de diversos vermes como aqueles antes de finalmente encontrar seu fim. Pena que não teria a oportunidade de fazer o mesmo com estes.

— Estamos prontos! Levem o señor Carter para a prancha!

O inglês engoliu seco. Era pior do que tinha imaginado. Iriam jogá-lo ao mar de armadura. O pânico começou a tomar conta do corpo e mesmo soltando todo seu peso, para dificultar ser arrastado, os piratas o carregavam até o parapeito danificado do Velho Viajante. Foram necessários quatro homens fortes para arrasta-lo, mas apesar da dificuldade que Carter impôs, os quatro conseguiram superar o peso e leva-lo até o parapeito.

— Adeus, señor Carter! — disse por último Don Perez, dando um pontapé no homem de armadura que caiu na água com violência.

Não teve tempo de prender a respiração. O pouco de ar nos pulmões saiu com o pontapé e perdeu completamente a noção da distância até a água, com o elmo lhe bloqueando a visão. Tentou se libertar nos primeiros segundos submerso, mas o nó foi bem atado. A água gelada foi invadindo cada fresta da armadura que puxava o corpo do nobre para o fundo do oceano com velocidade aterrorizante.

Ao longo da descida, Carter se debateu o máximo que pôde e o elmo acabou saindo a poucos metros do fundo. Quinze metros o separavam do navio na superfície, mas era inútil tentar nadar com a armadura o puxando para baixo. Cercado pelos corpos dos soldados enforcados alguns minutos antes de ser jogado ao mar, Carter viu seu fim num cemitério subaquático.

Quando abriu os olhos, estava confuso e desorientado. Ainda estava no fundo do oceano, cercado pelos seus companheiros, mas havia algo diferente, era como se pudesse respirar debaixo da água. Estava lúcido e tranquilo, apesar das circunstâncias.

— Finalmente acordou — disse uma voz feminina fina e estridente. — Achei que não tivesse dado tempo.

Carter se virou e deu de cara com uma criatura com corpo de mulher e tentáculos negros no lugar das pernas. Um espectro que se movia pelas águas e deixava uma tinta escura por onde passava. Os cabelos longos e escuros como alcatrão, dançavam e davam um ar fantasmagórico para o estranho ser que se apresentava.

— O que diabos é você? – perguntou ele, surpreso por conseguir falar debaixo da água.

— Não importa! O que importa é o que diabos será você!

— Do que está falando? — perguntou o nobre, extremamente confuso e assustado.

A criatura moveu seus tentáculos como um polvo e se aproximou com tamanha velocidade que Carter pode sentir a corrente de água que se formou com o movimento. A tinta preta começava a envolver seu corpo e gelar sua alma.

— Há muito tempo eu espero por alguém como você! Alguém capaz de fazer aquilo que é preciso, alguém que irá me servir como nenhum outro jamais conseguiu.

— Do que está falando? Como eu não estou morto?

— Quem disse que não está morto? — perguntou ela, em meio a um sorriso macabro.

O silêncio no fundo do oceano era estranho e frio.

— Como isso é possível?

— Eu tenho o poder de dar a vida de volta aos marujos afogados, desde que estes sejam dignos da minha atenção. Mas nunca antes eu tive um líder para executar minha vingança!

— Vingança?

— Sim, contra aquele que lança homens nas tempestades, contra aquele que não responde a ninguém e não teme ninguém, Don Perez!

A raiva fez seu sangue borbulhar e a água esquentar a seu redor.

— Quer matá-lo?

— Sim! Eu dei a ele os poderes que possui e o maldito me traiu. Quero minha vingança! — as últimas palavras soaram doces nos lábios da criatura.

— Que poderes? — perguntou Carter, confuso. Don Perez era apenas um homem.

— Ele controla as tempestades que afundam e derrotam seus oponentes graças a mim.

Carter se lembrou da súbita facilidade com que o navio inimigo se aproximou do seu em meio a ventos desfavoráveis e como a tempestade se dissipou segundos após a derrota dos inglês a bordo do Velho Viajante.

— Se tem tamanho poder, porque não o derrota você?

— Porque uma vez com os poderes, ele foi a terra e fez um pacto com um bruxa que lhe deu um amuleto que me impede de afundar seu navio amaldiçoado. Não tenho poderes na superfície. O amuleto lhe dá proteção contra mim.

Carter ouvia atento a criatura que nadava ao seu redor com destreza, escurecendo as águas com sua tinta. Era possível sentir seu ódio aquecer a água.

— O que eu tenho que fazer? — perguntou Carter, fazendo surgir um sorriso do rosto feminino de sua nova mestra.

— Apenas me servir e liderar os mortos contra meus inimigos.

— Terei o poder para matar Don Perez?

— Terá o poder para injetar pavor e medo no coração dos homens!

— Me liberte e eu serei seu — concordou finalmente o nobre inglês, gostando do prospecto apresentando.

A criatura contornou seu corpo e cortou as amarras que o seguravam.

— Não! Fique de armadura! — protestou ela, enquanto Carter começava a se livrar do metal que o mantinha submerso.

— Não vou conseguir fazer nada com esse peso todo.

Ela apenas sorriu e arregalou os olhos antes de fincar no peito de Carter os cinco dedos da mão, atravessando o metal e a carne do homem que sentiu um frio na espinha. A raiva e a vingança tomaram conta de seu corpo e a tinta tomou o lugar de seu sangue. A armadura ficou leve como uma pena e escureceu junto com tudo mais.

— Levante, meu cavaleiro das profundezas! Levante e destrua meus inimigos!

Carter teve uma sensação estranha. Sua mente viajava, como se estivesse em vários lugares ao mesmo tempo. Viu pedras no fundo oceano, depois um navio naufragado, depois peixes e criaturas marinhas circulando seu corpo. Às vezes lhe faltava um braço, outras era simplesmente leve como um esqueleto.

— O que está acontecendo? — gritou ele, desorientado.

Após vários minutos pulando de um lugar para o outro se viu novamente vestindo a armadura, diante da criatura que o observava atentamente. Estava diferente, como se ainda estivesse em todos os outros lugares ao mesmo tempo, como se tivesse controle sobre outros corpos.

— O que é isso? O que fez comigo?

— Eu lhe dei o poder de controlar meu exército sob uma única mente, a sua — disse a criatura abrindo os braços e mostrando os outros corpos que os cercavam. Dezenas de marinheiros afogados, alguns em decomposição, outros só a ossada e outros em melhores condições os cercavam, imóveis.

O cavaleiro ergueu o braço direito e todos os mortos o imitaram, era como se formassem uma unidade. Carter mudou de corpo e se viu vestindo armadura, próximo da criatura. Era como se sua alma pudesse ocupar o corpo que quisesse, sem perder o controle de seu principal. Era assustador e incrível ao mesmo tempo. Fez mais alguns movimentos e aos poucos foi entendendo como funcionava sua coletividade.

— Está satisfeito? — perguntou a criatura para o seu eu de armadura.

— Muito! — respondeu ele, de outro corpo no meio da multidão. Mais e mais corpos se juntavam aos que ali estavam, era como se todos os marujos afogados lhe pertencessem.

— Ótimo! Agora vá executar minha vingança!

Animado com seus poderes, Carter pôs seu batalhão para andar, mas logo se virou para a criatura novamente.

— Como vou alcançar um barco?

A criatura começou a girar e acelerar até formar um rodamoinho de areia, tinta e bolhas. O grito estridente dissolveu tudo e debaixo das pernas dos corpos uma forma de cavalo se fez visível. Mas não era o animal em si, apenas a silhueta feita em água, como se as bolhas tivessem tomado a forma do animal e ganhado vida.

— Isso é incrível! — maravilhou-se Carter com tamanho poder.

— Vá e me traga Don Perez! — comandou sua mestra.

O exército dos mortos cavalgou sob a água e espantou toda a vida marinha em seu caminho. Não havia ninguém ali que ousasse desafiar Carter. Não demorou muito e logo se via o rastro de um navio na superfície. Apressou os cavalos. Não tinha que gritar ordens, apenas pensar no que queria. Já havia comandado antes, mas aquilo era incrível. Uma unidade coesa, que pensava como ele, que reagia como ele, uma unidade invencível!

Ergueu seu batalhão e chegou a superfície. Ficou imaginando a cena de dentro do navio, dezenas de mortos emergindo, montando cavalos feitos de água como se estivessem cavalgando em uma planície. Não é de se surpreender que o medo e pavor tenham tomado conta do navio da Morte da Tempestade em questão de segundos. Don Perez apareceu no parapeito atônico com o que via. Esgoelava ordens para seus homens que pareciam confusos e demoravam para responder. O espanhol ergueu as mãos aos céus como que invocando a tempestade, mas o vento não era capaz de parar aqueles que andavam sobre as águas.

O navio virou com dificuldade enquanto a cavalaria se aproximava a toda velocidade.

— Atirem! — era possível ouvir Don Perez em pânico.

Alguns canhões dispararam contra os atacantes que eram lançados na água, mas logo emergiam novamente em um novo cavalo aquático. Vez ou outra uma bala de canhão acertava em cheio um dos corpos, mas mesmo mutilado era novamente devolvido a cavalaria segundos depois. Disparos de mosquetes eram dados de dentro do navio em direção aos mortos, mas tampouco eram efetivos. Alguns homens já se lançavam ao mar, desistindo da batalha que se aproximava. Mal sabiam eles que seria inútil.

Uma vez coberta a distância que separava a cavalaria do navio de Don Perez, os mortos se amontavam e se usavam para escalar a lateral e invadir a embarcação. Era como se uma onda de corpos se lançasse contra o parapeito.

O cavaleiro finalmente punha os pés no convés. Sacou a mesma espada que Don Perez havia feito questão de lhe dar e desferiu golpes mortais contra quem quer que se encontrasse em seu caminho. Seus outros corpos faziam o mesmo. Os mesmos piratas que haviam massacrado os ingleses eram agora massacrados sem ter nenhuma chance de se defender.

Uma lâmina lhe atravessou a fresta da armadura, mas não sentiu dor. Na verdade, não sentiu nada. Simplesmente retirou o sabre de dentro de si e o devolveu ao torço do dono que nem tentou se defender tamanho o espanto.

Um a um os piratas foram sendo mortos até que restasse apenas Don Perez. Que cercado por mais de quinze marujos mortos apenas media a distância com sua espada, impotente. A tempestade balançava o navio, mas os mortos pareciam não notar e os ventos perdiam a força como quem perde a esperança de lutar.

Abrindo caminho, o cavaleiro das profundezas chegou até sua vítima. Amedrontado e acanhado, Don Perez nem parecia o poderoso pirata que antes horrorizava os homens e controlava as tempestades.

— Señor Carter? — perguntou Don Perez, trêmulo, reconhecendo a armadura.

Carter ficou em silêncio, apenas balançando a cabeça.

— É um prazer revê-lo, vejo que encontrou a bruxa do mar, não é? — Don Perez tremia e tentava manter a voz o mais firme que podia.

— Sim — responderam uníssonos os corpos no navio.

— Imagino que ela deva estar um pouco irritada comigo, não é? O que quer? Diga, eu te dou. Prometo. O amuleto, não? Tome, tome, fique com ele!

Don Perez entregou o amuleto que escondia debaixo da camisa. As pernas do espanhol tremiam e ele olhava para o mar de mortos que o cercava, com desespero.

— Obrigado, Don Perez! Você me deu a oportunidade de ser invencível. Sem você não teria isso. — disse a unidade. — Por esse motivo, não vou te matar.

— Gracias meu amigo! — agradeceu aliviado o espanhol, apertando a mão do primeiro corpo que viu. — É um grande homem!

— Mas minha mestra vai!

O cavaleiro das profundezas deu um chute feroz no peito do espanhol que voou longe e caiu no mar. Don Perez ainda tentou nadar e voltar para a superfície, puxando o ar para os pulmões somente para ser arrastado novamente para baixo pela criatura de tentáculos, que deixou um rastro de tinta preta e vermelha na água.

Don Perez, a Morte da Tempestade, estava morto.

A criatura emergiu e olhou para o navio, onde Carter aguardava com a unidade.

— Destrua o amuleto, meu cavaleiro, e vamos destruir meus outros inimigos — comandou ela.

Carter colocou o objeto sobre um barril e ergueu a espada sobre a cabeça, pronto para dar o golpe destruidor, mas hesitou. Olhou em volta e se viu cercado por guerreiros invencíveis, com um navio veloz e o comando que nenhum outro homem no mundo teria poder de derrotar, nem mesmo os mais temíveis piratas do Caribe.

— O que está fazendo? Destrua logo isso de uma vez por todas! — gritou a criatura, fazendo sua voz ecoar pelo oceano.

— Não! — respondeu a unidade.

Carter pegou o amuleto e colocou no pescoço.

— O que pensa que está fazendo? Destrua isso! — protestava da água, a bruxa.

— Você não tem mais poderes sobre nós!

— Se fizer isso estará criando uma inimiga para a eternidade, cavaleiro! Eu o amaldiçoo.

A unidade riu.

— Já estou amaldiçoado. Estou morto sem estar. Mas agora eu tenho o que preciso para cumprir meu dever. Quando tiver terminado lhe darei sua vingança sobre mim, eu prometo. Até lá saboreie a que eu acabo de lhe providenciar.

A criatura soltou um grito terrível e voltou para o fundo do oceano, escurecendo o azul até onde a vista podia alcançar. Carter estava marcado, mas a bruxa teria que esperar, ele agora tinha o poder para livrar o mundo dos vermes!

Matheus Tonon
Enviado por Matheus Tonon em 28/05/2021
Reeditado em 30/05/2021
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