TAPETE AMARELO

TAPETE AMARELO

Naquele ano, o inverno havia sido mais implacável do que os anos anteriores e todos estavam ansiosos para a chegada da primavera, assim, todas as crianças poderiam brincar livremente por aí... desfrutar do donairoso tapete amarelo! Só que...

Ano passado durante a primavera, uma senhora gentil de cabelos presos no alto da cabeça por um coque, se mudou para a rua amarela. O nome dela era Dona Zica; (eu não me lembro do nome oficial daquela rua, porque desde sempre ouço todas as pessoas se referindo a ela dessa forma, até o moço do correio, devido a uma imensa e frondosa árvore de Ipê-amarelo, que ficava bem ao centro da praça do bairro). Todos os anos, aquela árvore nos servia um enorme e macio tapete amarelo, com suas flores que cobriam grande parte da praça, e ainda os ventos suaves as carregavam por aí... enfeitando as calçadas e ruas envolta da praça. Era ali que as crianças brincavam alegremente e os adultos passavam o finalzinho da tarde, debaixo da brisa refrescante daquela árvore.

Era a maior alegria! Tudo amarelo! Um espetáculo cor de ouro... Um gigantesco tapete amarelo.

Dona Zica, todos os dias de manhã, varria a calçada de sua casa, voltava para dentro de casa trazendo consigo um balde com água nas mãos, atravessa a rua e caminhava até a arvore amarela para regar suas fortes raízes; depois com o balde vazio, ia do outro lado da praça na padaria da dona Guiomar para comprar um pãozinho quente para o seu café da manhã, voltava para a sua casa cumprimentando a todos que encontrasse pelo caminho. Até as crianças.

Os dias se passaram, veio o verão, outono, o inverno... como já disse, esse ano o inverno foi bem rigoroso e o ipê-amarelo estava triste, amuado, cabisbaixo, sem nenhuma folha sequer. As pessoas mal saiam às ruas, as crianças e os idosos ficavam dentro de casa pois fazia muito frio. Dona Zica não! Ela continuava a fazer as mesmas coisas que fizera durante as estações anteriores... mesmo com tanto frio, varria sua calçada, atravessa a praça com o balde de água para regar as raízes da árvore amarela e caminhava até a padaria para comprar seu pãozinho quente e voltava para sua casa.

Finalmente aqueles dias gélidos e sombrios foram passando, as chuvas e os pássaros anunciavam a chegada da primavera. Borboletas coloridas e flores espalhadas por todos os canteiros saudavam a tão esperada estação. Mas..., porém..., entretanto... e a árvore amarela? Inexplicavelmente continuava do mesmo jeito. Será que ela não havia percebido que já era primavera? Continuava lá adormecida, sem folhas e sem flores. As pessoas não estavam entendendo nada daquilo e as crianças ficavam envolta da árvore perguntando cadê suas flores?

E o tapete amarelo?

Certa manhã, o menino maluquinho da rua, o Beto, apareceu como raio com a sua bicicleta bem na frente da Dona Zica, atropelando a pobre senhora, que, como de costume no intento de regar as raízes da arvore amarela. No momento da colisão, podia-se ouvir os gritos desesperados e dolorosos daquela mulher! Foi então, que souberam o motivo de tudo! Seus pés avermelhados foram formando bolhas provocadas pelas águas ferventes oriundas daquele balde. Isso mesmo!!! Eis o motivo pelo qual a árvore amarela estava sem folhas, sem flores e mórbida. Dia-a-dia a árvore amarela foi sendo assassinada, aos poucos. Todos estavam perplexos, enlutados... a árvore amarela estava literalmente morta. Dona Zica a matara!

As pessoas não entendiam o motivo de tanta maldade!

Ao ser indagada, dona Zica respondeu que aquela árvore era bonita, porém causava muita sujeira por toda a rua... ela simplesmente estava evitando que as ruas ficassem cobertas pelo lixo provocado por aquela planta.

Lágrimas e lamentos poderiam ser vistos nos olhos e nas feições dos moradores daquela rua. Aos poucos, as pessoas voltavam para suas casas tentando entender aquele devaneio, deixando Dona Zica ali naquele mesmo lugar.

Dizem que no meio daquela noite, ela foi vista entrando dentro de um enorme carro preto e foi embora.

Na manhã seguinte, um caminhão carregado de plantas parou naquela praça e foi distribuído para toda população do bairro, uma muda de ipê-amarelo com um bilhetinho e um pedido de desculpas... não tinha assinatura, mas as pessoas deduziram que fosse aquela mulher de coque preso no alto da cabeça.

Na primavera seguinte, havia não apenas um tapete amarelo, mas centenas dele que enfeitava todo o bairro! Ouvi dizer, que daquele dia em diante, fora trocado o nome do bairro que agora, em uma data alusiva passou a se chamar Bairro Tapete amarelo.